Governador do Rio descreve uma crise sem precedentes, busca fórmulas para conter o desemprego depois da Olimpíada e diz que seu maior legado será deixar um Estado que sobreviva sem os recursos do petróleo

Dois grandes desafios pairam sobre o Rio de Janeiro: viver sem petróleo, já que o preço do barril despencou de US$ 100 para cerca de US$ 30, e sobreviver após a Olimpíada, em agosto, quando muitas obras terão acabado e poderá haver desemprego em massa. Já amargando as consequências das perdas com o petróleo, que respondia por 70% da geração de riqueza do Estado, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) tenta alternativas à chamada “óleo dependência” do Rio.

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PLANO
”Vou lançar um programa, em março, de tratamento de esgoto
de favelas contratando mão-de-obra das comunidades”

Uma delas é a Lei de Responsabilidade Fiscal, enviada este mês à Assembleia Legislativa. Para isso, terá que vencer a resistência de um companheiro de partido, que bateu pesado contra o governo na semana passada. Jorge Picciani, presidente da Alerj, qualificou a administração estadual como “muito fraca e sem direção.” Para responder, Pezão seguiu um ensinamento estampado na página de um livro que mantém sobre sua mesa de trabalho: “Torne-se uma pessoa capaz de aceitar os reveses com um sorriso”, assinada por Mokiti Okada, líder espiritual japonês e criador da Igreja Messiânica, que ele frequenta.

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”Eduardo Paes será um nome natural para a sucessão presidencial.
Como candidato majoritário ou compondo chapa. É uma liderança
nova. E está na hora de o Rio ocupar este espaço”

“Recebo as críticas como um aconselhamento”, disse. Para combater o desemprego pós-Olimpíada, ele acelera dois projetos de fôlego – saneamento em todas as 28 favelas da capital e água para toda a baixada fluminense. Nesta entrevista à ISTOÉ, Pezão revelou que a presidente Dilma Rousseff (PT) se comprometeu a convocar, este mês ainda, uma reunião com todos os governadores para decidir medidas de apoio aos Estados e se mostra o maior cabo eleitoral do prefeito carioca e colega de partido Eduardo Paes. “A sucessão presidencial em 2018 terá que passar por ele”, afirma.

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”Quero gerar emprego para depois da Olimpíada, quando terminar o
metrô imagina como vai ficar o desemprego no Rio de Janeiro”

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ISTOÉ – Como fica o Rio sem petróleo?
Luiz Fernando Pezão – Estou atrás de dinheiro. Claro que não dá para tirar uma riqueza dessa de uma hora para outra sem alterar muito o orçamento. Se as perdas impactam o Brasil, imagina o Estado onde fica a Petrobras. Tudo o que está no entorno deste segmento sofre em cascata. As outras petroleiras, os fornecedores, as fábricas de sondas, os rebocadores, os estaleiros, os centros de pesquisas … Não se acaba com uma dependência dessa de uma hora para outra. E este não é um problema do Rio. A Rússia e a Arábia Saudita, quem diria, estão com problemas e fecharam acordo para congelar a produção de petróleo. A Venezuela está praticamente quebrada. 86% do petróleo do Brasil chegou a ser retirado do Rio, isso dá a dimensão do tamanho do nosso desafio. Mas estamos trabalhando as saídas: nos tornamos o segundo pólo automotivo, o  segundo pólo siderúrgico. Temos alguns anos para nos prepararmos. Esse é o maior legado que o governo pode deixar: viver sem o petróleo. Se ele melhorar um dia, melhora para todo mundo. Mas agora é a hora da difícil travessia.

ISTOÉ – O Senado vai votar brevemente as novas regras de exploração do pré-sal. O que significam as mudanças para o Rio?

Luiz Fernando Pezão – Significam mais atividade econômica. A Petrobras, hoje, está sem poder fazer investimento. Se puder ter parceria para investir, para nós é a garantia de que haverá mais emprego, mais empresas e dinheiro circulando.

ISTOÉ – O sr. encaminhou  um projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal para a Alerj com medidas difíceis de serem aprovadas. Não é muito arriscado contar com isso para recuperar o Estado?

Luiz Fernando Pezão – Apresentamos essa lei para tentar compartilhar com os poderes os déficits que existem em nosso orçamento. Não é fácil retirar dinheiro, sempre dá chiadeira, mas é necessário para não precisarmos cortar mais na saúde, educação, segurança, áreas vitais. Com esta lei, não precisaremos cortar tanto, vai no déficit estrutural do Estado. Não tenho a utopia de que todas as medidas serão implementadas este ano, acho que serão ao longo do tempo. Só com a previdência, temos um déficit programado de R$ 12 bilhões este ano. Nossa proposta é cobrir o déficit do Rioprevidência com cotas proporcional de todos os poderes.

ISTOÉ – Qual é a expectativa de aprovação, ainda mais depois das criticas feitas pelo presidente da assembleia, Jorge Picciani, à sua gestão?

Luiz Fernando Pezão – Sempre pautei minha vida pelo diálogo. Recebo as críticas com muita tranquilidade, como um aconselhamento. O presidente Picciani e o Parlamento têm sido parceiros importantes no enfrentamento da crise financeira. Se chegamos até aqui, foi devido à parceria com eles, além do Tribunal de Justiça e do Ministério Público. Respeito e admiro o presidente do meu partido e me tornei governador graças à união e trabalho de todos.

ISTOÉ – Por que o Rio é o único estado brasileiro que colabora  para aposentadoria dos servidores do MP, do Legislativo e do Judiciário?

Luiz Fernando Pezão – Foram leis aprovadas quando os poderes estavam perto de seus limites, eles estourariam sem a ajuda. Mas agora é inevitável, a receita está caindo, todos terão que tomar medidas, vamos ver o que impacta menos cada um. Vai ser uma discussão dentro do parlamento.

ISTOÉ – A sociedade participa como?

Luiz Fernando Pezão – Discutindo, sabendo o que está acontecendo. Por exemplo, 95% dos royalties do petróleo eram para financiar a previdência pública, que é um peso hoje não só para o Rio mas para o Brasil todo. Todos os estados estão com muito problema de previdência. Mostrar que hoje as pessoas têm expectativa de vida maior, muitas têm aposentadorias especiais. Não sou contra o policial se aposentar com 48 anos, mas como financiar isso? A sociedade precisa se envolver na discussão.


ISTOÉ – O que será afetado nas áreas de saúde, educação e segurança com a falta da arrecadação do petróleo? Como vai ser este ano?

Luiz Fernando Pezão – Estamos nos programando para não fazer tanto corte, indo com cautela. Uma coisa é você ter uma receita de 100 com 25% para educação e 13% para a saúde, por exemplo. Outra é ter uma receita de 50 e manter os mesmos percentuais, ainda mais com custos fixos, principalmente de pessoal. Tenho que me adequar à receita que tenho. Em 2015, voltamos ao  custeio de 2009. Estou cortando mais esse ano, me adequando mais ainda à falta de receita. Queria muito continuar com o mesmo tamanho, mas não tenho mais o mesmo preço do barril do petróleo, de US$ 115. Educação, Saúde e Segurança são políticas básicas, mas não está fácil. O Eduardo (Paes, prefeito do Rio) pegou dois hospitais públicos para manter e me deu um alívio grande, de quase R$ 500 milhões.

ISTOÉ – O sr. está muito próximo do prefeito Eduardo Paes.

Luiz Fernando Pezão – Nos damos muito bem. Ele será um nome natural para a sucessão presidencial. Como candidato majoritário ou compondo chapa, mas a sucessão vai passar por ele, que estará mais fortemente credenciado depois da Olimpíada, é uma liderança nova. E está na hora de o Rio ocupar este espaço.

ISTOÉ – A presidente Dilma vai dar alguma ajuda ao Rio nesse momento?

Luiz Fernando Pezão – Estou na expectativa, tenho conversado permanentemente com ela e o ministro Nelson Barbosa (Fazenda), demonstrando a dificuldade que temos de pagar os serviços com a receita em queda, vendo possibilidades com o Tesouro Nacional, o que podemos renegociar. Ela está para fazer uma reunião com os governadores neste mês ainda. O ministro está levando uma série de medidas para ela analisar, e também compromissos a serem assumidos pelos governadores. Ele já disse que os estados têm que fazer o dever de casa com uma lei de responsabilidade fiscal estadual para cada um com compromissos, enxugar a máquina, melhorar a gestão. O que pedimos é renegociação da dívida, novos empréstimos para fazer essa travessia e gerar empregos. Todos estamos angustiados com a paralisação da economia.

ISTOÉ – Quais as iniciativas no Rio para evitar o desemprego após a Olimpíada?

Luiz Fernando Pezão – Não paro de pensar nisso, quero gerar emprego para depois da Olimpíada, quando terminar o metrô imagina como vai ficar o desemprego. Vou lançar um programa nos primeiros dias de março de tratamento de todo o esgoto das 28 favelas do Rio, contratando mão de obra das próprias comunidades. Vamos atender 500 mil pessoas. Tem empresas do exterior interessadas em participar desse projeto, de Israel e da Rússia. A outra saída para evitar o desemprego é a obra de água na Baixada Fluminense e São Gonçalo, que já estamos fazendo. Vai gerar mais de 20 mil empregos. Os recursos, da ordem de R$ 3,6 bilhões já estão garantidos através da Cedae e de financiamento da Caixa Econômica. A obra de esgoto vai ser muito mais, e contaremos com o Tesouro Nacional, linhas de crédito da Caixa, muitos querem ajudar. E acabamos de inaugurar, semana passada, o novo porto na cidade de São João da Barra, cidade que está bombando! Todo financiado pela iniciativa privada, custou R$ 610 milhões e vai gerar 25 mil empregos a partir de 2017. Já tem mais de 8 mil pessoas trabalhando lá.

ISTOÉ – Como ficam as UPPs sem dinheiro?

Luiz Fernando Pezão – Claro que poderiam estar melhor, mas apesar dos problemas, o ano passado foi a melhor série histórica da segurança no Rio, e isso se deve às UPPs. A Maré, um complexo de 140 mil habitantes, três facções, milícia, será ocupada pela UPP em março. Não representa risco algum para a Olimpíada (por ficar entre o aeroporto e a cidade). As Forças Armadas já estão lá.

ISTOÉ – Como está a relação do PMDB com a presidente Dilma após tantos conflitos?
Pezão – Eu não tenho conflito com a presidente, ajudei a elegê-la. Entre ela e o Michel (Temer, vice presidente) está tudo tranquilo. Apoio a reeleição dele para a presidência do partido. Claro que tem que ouvir a bancada do Rio, que é a maior do PMDB na Câmara. O Michel virá ao Rio mês que vem para conversarmos.


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