A semente de “O Quarto de Jack” foi o caso de rapto e incesto que chocou o mundo em 2008, quando se descobriu o porão onde o austríaco Josef Fritzl trancou e violentou a filha por 24 anos. Ao ser libertada, Elisabeth Fritzl tinha sete filhos da relação forçada com o pai. O caçula, Felix, com cinco anos, nunca tinha visto a luz solar. “Fui atraída pela ideia de uma criança emergindo no mundo moderno, tendo crescido sem qualquer contato com o exterior”, conta a irlandesa Emma Donoghue, autora do livro que deu origem ao filme e responsável pela adaptação do roteiro do drama indicado a quatro Oscar, inclusive o de melhor filme.

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ILUMINAÇÃO
Jack, vivido pelo ator-mirim Jacob Tremblay, e seu único contato com o exterior
no quarto-cativeiro em que passou os sete primeiros anos de vida 

A história da mãe e do filho mantidos prisioneiros em quarto minúsculo, contada do ponto de vista da criança, vai competir na cerimônia que será realizada no domingo 28 com superproduções como “Ponte de Espiões”, de Steven Spielberg, “Perdido em Marte”, de Ridley Scott, e “O Regresso”, estrelada por Leonardo DiCaprio. Não é, como se vê, um páreo fácil.

Trata-se de uma jornada longa e incomum para uma co-produção canadense e irlandesa modesta, rodada com menos de US$ 6 milhões e protagonizada por rostos desconhecidos. Até receber o Globo de Ouro de melhor atriz dramática e uma indicação ao Oscar, Brie Larson, que vive a mãe, colecionava apenas papeis coadjuvantes. A atriz participou de filmes sem grande impacto como “Anjos da Lei”, de 2012, e “Descompensada”, de 2015. Jacob Tremblay, que vive o pequeno Jack, tinha feito apenas uma ponta em “Os Smurfs 2” (2013).

O que mais surpreende em “O Quarto de Jack”, porém, em cartaz no Brasil a partir de quinta-feira 18, é a abordagem. O filme tenderia a resultar em uma obra taciturna e deprimente, como a história real que o inspirou. Mas graças à Emma Donoghue, que concorre ao Oscar de roteiro adaptado, a trama focaliza mais a lição de resiliência e transformação do que a evidente e conhecida brutalidade do caso.

Ainda assim a condição dos protagonistas é perturbadora. A mãe precisa esconder o filho no guarda-roupa quando seu raptor a visita para estuprá-la. “Quando li o livro, fui tocado pelo otimismo de Jack. As crianças vêem luz até nos momentos mais obscuros”, contou o irlandês Lenny Abrahamson, indicado ao Oscar de melhor diretor pelo filme.

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Abrahamson acertou ao traduzir nas telas a relação mágica do garoto com o quarto, algo que o livro valoriza em detalhes. O cativeiro é, afinal, o único mundo que ele conhece. “É lindo ver como a mãe se esforça para dar uma vida decente ao filho, que é cercado de amor. Ele se sente protegido no quarto’’, conta Abrahamson. Nas mãos de um cineasta com visão mais comercial, o material provavelmente seria traduzido como um policial tradicional. “Algo que não falta por aí”, completou ele.

Conheça o caso que originou o filme

Josef Fritzl foi descoberto em abril de 2008. Ele confessou a prisão e o estupro sistemático de Elisabeth por 24 anos. Da relação nasceram sete crianças, três mantidas no porão e três adotadas por ele, que forjou o abandono dos netos pela filha desaparecida na porta de sua casa. Uma delas morreu depois do parto e foi incinerada pelo criminoso. Fritzl foi condenado à prisão perpétua por estupro, cárcere privado e homicídio no mesmo ano. Hoje, Elisabeth e os filhos sobreviventes vivem em lugar secreto com nova identidade.

FOTOS: George Kraychyk 


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