Reforma milionária do sítio, decoração no tríplex, elevador privativo, adega climatizada, mimos dignos de clientes exclusivos. Empresários se esmeraram no cortejo a Lula. O ex-presidente hoje dá de ombros. Alega não ter nada a ver com isso. Lança nota indignado. Seu instituto fala em campanha difamatória. Mas, ao mesmo tempo, diz e contradiz os próprios argumentos. A cota na cooperativa Bancoop – que arrasou a poupança de vários mutuários, desviando dinheiro para o PT – era de fato um apartamento padrão. A empreiteira OAS gastou nele mais de R$ 380 mil em mobília. Inclusive eletrodomésticos. Foi caprichosa no atendimento ao potencial comprador, como poucas vezes se viu. Mas o casal Lula da Silva resolveu desistir. Apenas no ano passado, com um atraso de seis anos após o fim do prazo determinado pela construtora para tal opção. Os demais compradores cooperados não tiveram a mesma alternativa. Alguns perderam o que investiram. A investigação vai apurar evidências de privilégio irregular. Na propriedade rural, outra pendenga imobiliária mal explicada. Ali Lula esteve mais de cem vezes em quatro anos. Na média, se aboletava no sítio a cada duas semanas, muitas vezes acompanhado de familiares, filhos e agregados. Hoje garante que não era dono. Agora imagine a benevolência do amigo proprietário que, durante todo esse tempo, cedeu o usufruto da propriedade sem pedir nada em troca. O velho rito da busca de favores por quem tem negócios com o poder ganhou traços descarados nos últimos tempos. O ex-ministro José Dirceu, chapa de Lula e presidiário reincidente, foi preciso ao explicar em depoimento na semana passada o que alguns clientes empreiteiros buscavam pagando a ele gordos dividendos: “eu emprestava prestígio”, disse. Já as explicações do ex-presidente para as benesses e gentilezas recebidas dançam prá lá e prá cá, ao ritmo das novas descobertas. No passado, logo ao deixar a presidência, não se preocupava em desmentir quando falavam que o sítio era seu. No momento não é mais conveniente tal versão. Lula e sua mulher, Dona Marisa, foram intimados a depor, em seguida ao carnaval, na terça-feira 16, na condição de investigados. Não como meras testemunhas. O Ministério Público apura a participação do ex-casal presidencial em supostos esquemas de lavagem de dinheiro pela transação com o tríplex. É a apoteose melancólica do imbróglio político que enlameia o Partido dos Trabalhadores e seu maior líder. Além de tesoureiros e quadros importantes do PT, Lula viu vários dos seus amigos flagrados em tramoias ir parar atrás das grades. O pecuarista José Carlos Bumlai, que admitiu atuar como laranja na campanha do ex-presidente, é um deles. Lula não vê nada demais nesses laços e nos “regalos” que ganhou. Mas lá atrás, quando seu opositor político, também ex-presidente, Fernando Collor, foi flagrado recebendo ajuda do amigo PC Farias para reformar a “Casa da Dinda” e comprar uma Fiat Elba, não se absteve de bradar contra a imoralidade de tal comportamento. Collor, como todos sabem, foi destituído do cargo por esses delitos. Sofreu o impeachment. Lula teve, até aqui, melhor sorte. De uma maneira geral a trajetória dos dois ex-presidentes daria um roteiro digno de enredos carnavalescos. Suprema ironia, os antigos adversários – um oriundo da oligarquia nordestina e o outro retirante do sertão miserável – se converteram em aliados, parceiros de palanque e hoje padecem dos mesmos maus hábitos. Seja no gosto por mimos ou na procura de (digamos) más amizades.  


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