Com pouco mais de 3 milhões de habitantes – um quarto da população da cidade de São Paulo –, Iowa é um Estado americano que, à primeira vista, diz pouco sobre o que o país é hoje. Ali, mais de 90% dos moradores são brancos, enquanto a média nacional é de 77%. A proporção de latinos é três vezes menor do que no restante da nação. Ainda assim, como de costume, Iowa deu início oficialmente, na noite da segunda-feira 1º, à escolha dos candidatos às eleições presidenciais nos Estados Unidos indiferente às transformações recentes no perfil dos eleitores. Quatro anos depois de um pleito que expôs uma polarização demográfica entre o Partido Republicano e o Partido Democrata, as primárias da semana passada tiveram várias surpresas. Do lado republicano, o magnata Donald Trump, que liderava quase todas as pesquisas de intenção de votos, perdeu para o senador Ted Cruz, um símbolo do extremo conservadorismo. Outro senador, o cubano-americano Marco Rubio apareceu num terceiro lugar bem próximo de Trump. Do lado democrata, a favorita Hillary Clinton venceu o azarão Bernie Sanders por uma margem de apenas 0,29%.

INTER-1-IE.jpg
TED CRUZ
O candidato republicano é o símbolo máximo do conservadorismo

Apesar de Iowa ser um Estado tão pequeno, em que as comunidades se reúnem para debater em espaços públicos durante as primárias, seus resultados têm forte influência sobre o financiamento das campanhas e a estratégia dos pré-candidatos à presidência. O democrata Martin O’Malley e os republicanos Rand Paul e Mike Huckabee desistiram após um desempenho ruim. Já Rubio e Sanders ganharam fôlego novo para a disputa em New Hampshire, na terça-feira 9. “A vantagem do caucus (convenções partidárias) de Iowa é que permite que um grupo de eleitores avalie os candidatos de perto e faça escolhas mais bem informadas do que numa primária nacional”, disse à ISTOÉ Robert Erikson, professor de Ciência Política da Universidade de Columbia, de Nova York. A primária nacional, conhecida como “Super Terça”, deve acontecer na primeira semana de março, quando eleitores mais de 10 Estados votarão ao mesmo tempo. Para Matthew Dallek, professor de Administração Política da Universidade de George Washington, de Washington, dar tanta importância a Iowa é uma distorção do sistema político americano. “Há algo profundamente arcaico em nosso processo de nomeação”, afirma. “Ao mesmo tempo, muitos defensores desse processo dizem que ele permite que se faça uma campanha de base e que se confie menos em anúncios de tevê e mais no boca-a-boca.”

INTER-2-IE.jpg
HILLARY CLINTON
A democrata precisa conquistar os liberais para ser a escolhida do partido

Até entre os democratas, que tinham Hillary Clinton como grande favorita, o jogo pode estar mais embaralhado do que se projetava anteriormente. Hillary está há sete meses pedindo votos na estrada, mas o discurso de Sanders, centrado na desigualdade de renda, na regulação de Wall Street e na relação promíscua de grandes empresas com o poder mostrou ter ressonância entre os eleitores jovens. Para ter a adesão definitiva do partido, Hillary precisa conquistar os mais liberais. Entre os republicanos, a indefinição é ainda maior. Com o apoio dos principais líderes do partido, Rubio passa a ser um favorito, embora seu apelo entre os latinos seja limitado. Isso porque, isolado dentro do Senado, Ted Cruz é considerado um radical pelos próprios colegas e dificilmente se sairia bem ao falar para plateias tão heterogêneas quanto as de uma disputa majoritária. Ao lado do governador de Ohio, John Kasich, e do governador de Nova Jersey, Chris Christie, o ex-governador da Flórida, Jeb Bush, irmão e filho de ex-presidentes e dono de uma poderosa máquina de financiamento, deve aparecer com mais força em New Hampshire, onde concentrou seus esforços de campanha. Se for bem, continua como um nome competitivo.

Ie2409pag56e57_Inter-2.jpg

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Donald Trump, então favorito das pesquisas, é quem sofreu o baque maior. Agressivo, egocêntrico e, não raras vezes, ofensivo a minorias, o empresário pode cair em descrédito se também perder em New Hampshire. Trump estava tão seguro de seu desempenho em Iowa que não só faltou ao último debate entre os republicanos, como criou um evento paralelo. Foi um sucesso de mídia espontânea, mas que não se converteu em votos. Não satisfeito, Trump usou as redes sociais para criticar o resultado. “Ted Cruz não venceu em Iowa, ele roubou”, escreveu no Twitter na quarta-feira 3. “É por isso que as pesquisas erraram tanto e ele ganhou muito mais votos do que o esperado.” O pré-candidato disse que o adversário “fraudou” ao espalhar o boato de que o neurocirurgião Ben Carson, que ficou em quarto lugar, havia desistido da disputa. Trump garante: está cada vez mais dentro dela.

Fotos: Brendan Hoffman, Joe Raedle – Getty Images/AFP 


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias