No final de novembro, nove meses depois de ISTOÉ revelar em primeira mão a ligação do pecuarista José Carlos Bumlai com o esquema do Petrolão, a Polícia Federal deflagrou a Operação Passe Livre, 21ª fase da Lava Jato, destinada a prender o amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dono de trânsito livre no Planalto durante a gestão do petista. Ouvido pelos agentes federais, Bumlai negou, num primeiro momento, o envolvimento com as irregularidades. Bastaram mais duas semanas de confinamento numa cela em Curitiba para que o pecuarista capitulasse e decidisse fazer uma confissão. Bumlai reconheceu aos policiais que contraiu um empréstimo de R$ 12 milhões junto ao Grupo Schahin que serviria para irrigar campanhas do PT. O grupo mantinha negócios com a Petrobras. O dinheiro, ao menos parte dele, também foi usado para calar o empresário Ronan Maria Pinto, que ameaçava envolver Lula, José Dirceu e Gilberto Carvalho no nebuloso episódio do assassinato do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel. Posteriormente, narrou o pecuarista, ele atuou para que a Petrobras contratasse o Schahin por US$ 1,6 bilhão para operar a sonda Vitoria. Foi a solução encontrada para quitar o débito.

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NOVO INDÍCIO
Para a Lava Jato, José Carlos Bumlai pode ter ajudado a Marítima

Ao cumprir os mandatos de busca e apreensão durante a Operação Passe Livre em endereços residenciais e comerciais da família Bumlai, a PF recolheu outros documentos bastante elucidativos. No apartamento do bairro Cerqueira César, em São Paulo, os agentes federais identificaram um novo elo do amigão de Lula com o Petrolão, além do empréstimo já admitido por ele contraído do banco Schahin e destinado ao PT: papéis referentes a negócios com a empresa Marítima Petróleo e Engenharia Ltda., ligada a German Efromovich, conhecido empresário do setor de aviação que já teve ligações com o ex-presidente Lula. Em meio à papelada recolhida na casa de Bumlai constavam, além de um cartão de visitas do empresário, cópias de contratos celebrados entre a Marítima e offshores. A Marítima obteve polpudos contratos de prestação de serviços envolvendo operação de plataformas para a Petrobras, muitos dos quais não concluídos. Para os investigadores da Lava Jato, a documentação ao qual ISTOÉ teve acesso reforça a tese de que Bumlai fora escalado para influenciar em outros negócios da Petrobras. “É possível supor que José Carlos Costa Marques Bumlai tenha usado seus contatos políticos para influenciar a contratação da empresa Marítima Petróleo e Engenharia LTDA para o afretamento e prestação de serviços de operação de plataformas de perfuração junto a Petrobras”, conclui documento redigido pela força-tarefa da Lava Jato.

Os primeiros negócios da Marítima com a Petrobras remontam aos anos 90, quando a empresa abocanhou contratos para o fornecimento de plataformas à estatal. Mas mudanças no comando da companhia, ainda durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e o naufrágio da P-36, plataforma construída pela Marítima, azederam as relações com a empresa. Com a chegada do PT ao Palácio do Planalto era preciso reconstruir as relações com a maior empresa brasileira. O dono da Marítima traçou alguns caminhos. Buscou a ajuda, entre outros, do lobista Fernando Moura, delator da Lava Jato ligado ao ex-ministro José Dirceu. Aproximou-se também de Sérgio Machado, apadrinhado político do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que comandou a Transpetro, o braço de transporte da Petrobras, entre 2003 e 2015. Foi uma estratégia bem-sucedida. À frente do Synergy, o conglomerado que atua na área de petróleo e aviação, prosperou na Transpetro. Chegou ao mandato da presidente Dilma Rousseff com contratos que somavam mais de R$ 1,2 bilhão na subisidária, em parte financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico (BNDES).

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Os achados da Lava Jato, avaliam os investigadores, são indícios de que a Marítima recorreu também aos préstimos daquele que tinha acesso livre ao Palácio do Planalto: José Carlos Bumlai, o amigo do ex-presidente Lula. Bumlai tinha também bom trânsito com pessoas altamente implicadas no Petrolão, caso do ex-diretor internacional da Petrobras Néstor Cerveró e do lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano. A reportagem entrou em contato com o escritório do advogado Arnaldo Malheiros, que defende Bumlai, mas ele não retornou as ligações. ISTOÉ procurou Efromovich, mas a revista foi informada de que o empresário estaria fora do País e de que retornaria apenas nesta semana ao Brasil.

Os mais recentes desdobramentos da investigação que é tocada em Curitiba têm fechado cada vez mais o cerco em torno de Lula. Na semana passada, em nova fase, a apuração se aproximou como nunca do ex-presidente, ao colocar sob suspeita um triplex no Guarujá que a família Silva teria direito de compra, num transação envolvendo a OAS, empreiteira acusada de fazer parte do esquema que desviou bilhões de reais da Petrobras. Mas esse é só um dos problemas para o petista. Bumlai segue preso na capital paranaense. Enquanto isso, policiais federais e procuradores da República tentam desvendar as conexões do pecuarista com o Petrolão, além daquela triangulação já admitida por ele envolvendo o Grupo Schahin e o PT. Trata-se de mais um flanco aberto contra o ex-presidente.