Não existe nada mais pernicioso para a economia de um país do que uma inflação sem controle. A escalada de preços corrói salários, elimina empregos, aniquila o consumo, desequilibra as finanças das empresas, destrói as contas do governo. Com o agravamento da crise em 2015, o brasileiro voltou a enfrentar um monstro que parecia adormecido. Projeta-se para este ano um estouro inflacionário de 10,33%. Se a estimativa se confirmar, será a primeira vez em 13 anos que o índice chegará a dois dígitos. A última foi em 2002, quando a iminente eleição de Lula para a presidência deixava o mercado estressado. Para um País que possui um histórico de inflação alta, romper a barreira dos dois dígitos causa enorme preocupação. “A inflação está chegando a níveis perigosos”, diz o professor de administração da ESPM, Orlando Assunção. Mais assustador ainda: o cenário pode se agravar, diante de um provável aumento dos combustíveis ainda em 2015.

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JUROS ALTOS
Presidente do Banco Central, Alexandre Tombini disse
que o País vai manter a política monetária

Inflação alta não surge do nada. Ela é resultado principalmente de políticas econômicas equivocadas. Em 2014, o governo represou os preços da gasolina, da energia elétrica e dos serviços de transporte. No ano seguinte, com as empresas e agências do setor enfrentando dificuldades de caixa, foi precisou abrir a porteira – e as contas vieram pesadas demais. Só a AES Eletropaulo subiu em 74% a tarifa em São Paulo. “O aumento no preço da energia contaminou toda a cadeia de produção”, diz Roberto Dumas Damas, professor do Insper. Outro agravante é que, no Brasil, ainda há mecanismos de indexação que provocam a multiplicação dos reajustes, inclusive dos salários. “Esses reajustes automáticos fazem a inflação se tornar mais complexa e difícil de ceder depois”, afirma o professor Orlando Assunção. A disparada do dólar – que também se deve à instabilidade política dos últimos meses – pressionou ainda mais os preços. Assim nasceu o cenário perfeito para a retomada inflacionária. A má notícia é que reverter o quadro dá mais trabalho do que evitar que ele apareça.

As projeções para 2016 também pioraram. O objetivo inicial do governo era trazer a inflação para o centro da meta (4,5%) no ano que vem. Mas a equipe econômica sabe que será impossível atingir esse patamar. Projeções indicam que o índice pode superar 6,5% no próximo ano, o que deverá fazer com que a recuperação econômica demore ainda mais. Na quarta-feira 25, o Banco Central manteve pela terceira vez consecutiva a taxa básica de juros em 14,25% ao ano. Ao contrário das outras ocasiões, a decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) não foi unânime. Dois dos seis diretores do Banco Central votaram pela elevação da Selic em 0,50% ponto percentual. O motivo alegado por eles é evitar que a inflação ultrapasse o limite de 6,5% em 2016. Em entrevista recente, Alexandre Tombini, presidente do BC, declarou que o governo manterá sua política monetária, mesmo se o cenário econômico piorar.

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O ano de 2015 ficará marcado pelas enormes dificuldades enfrentadas pelos brasileiros. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad Contínua), o País já em nove milhões de desempregados. No terceiro trimestre, o número de desocupados cresceu 34% ante igual período do ano passado. No setor privado, 1,2 milhão de vagas com carteira assinada desapareceram entre o terceiro trimestre de 2014 e o terceiro trimestre de 2015. Na região Sudeste, uma das mais atingidas pela crise e que responde por 44% da força de trabalho do País, a taxa de desemprego subiu de 8,3% para 9% nos últimos três meses. Nem a proximidade do fim de ano, que costuma abrir inúmeros postos de trabalho temporários, foi capaz de reverter a tendência negativa. Para os economistas, o mercado de trabalho só vai se recuperar em 2017, quando, espera-se, o caos financeiro tenha ficado para trás. As projeções do PIB também só caem. A mais recente aponta para uma queda de 3,1% em 2015 e de 2% em 2016. Nesse cenário difícil, a inflação tem um papel central. Enquanto ela não for debelada, os brasileiros continuarão sofrendo.

Foto: Marcelo Camargo/Ag. Brasil