Há algo de podre no reino do Brasil. Quem diz isso, com outras palavras, é o brasileiro Sergio Moro, juiz federal do Paraná, autor das decisões mais corajosas de todos os tempos no âmbito da operação Lava Jato, com a prisão e a condenação de empresários, ex-funcionários e até políticos envolvidos em esquemas de corrupção na Petrobras.

Na segunda-feira 23, em palestra na Associação Nacional de Editores de Revistas, Moro foi enfático ao afirmar que os fatos elucidados por policiais federais, procuradores do Ministério Público e pela imprensa mostram um quadro de corrupção “sistêmica, profunda e penetrante” no País. Além de assinar as ordens que fazem tremer os mais poderosos nomes da República, coloca o dedo na ferida aberta com as mobilizações populares contra a corrupção e outras mazelas, em 2013: “Apesar dessas revelações e de todo o impacto desse processo, não tivemos respostas institucionais relevantes por parte do nosso Congresso e por parte do nosso governo”. A Lava Jato é uma voz pregando no deserto, alerta. Não será ela, nem ele, que acabarão com a corrupção no País, insiste o juiz. E o que pode mudar esse sistema político podre, em que interesses privados falam mais alto que os públicos e se apropriam de boa parte dos recursos que deveriam estar sendo investidos em saúde, educação, inovação, transporte e bem estar da população? Tudo depende de “o que nós, como cidadãos, vamos fazer a partir de agora”, responde Moro.

O combate mais efetivo à corrupção exige mudanças legislativas – daí a importância do voto de cada um nas próximas eleições – que levem à punição mais rápida e impiedosa dos criminosos. É urgente limpar o mar de lama que tomou conta não só de Mariana (literalmente), mas do Brasil todo. Para fazer o resgate da honestidade e da cidadania, é preciso investir na mudança de comportamento dos que ainda pregam a Lei de Gerson e acham que o importante é levar vantagem em tudo.

Para muitos, é tarde demais, por isso devemos ensinar as crianças e os jovens sobre os valores da ética, estimular nossos herdeiros nas escolas e universidades a fazer a coisa certa. E sempre. Ou a herança será maligna, como tem sido. Nas empresas, devemos dar o exemplo para nossos colegas, comandados, chefes, clientes, fornecedores e fiscais de órgãos reguladores, rejeitando atalhos, jeitinhos e soluções que impliquem dar vantagens indevidas a quem não merece. Não pode cuspir no chão, nem molhar a mão.

Dá para crescer na vida e nos negócios sem pagar propina, sem corromper funcionários públicos e privados, sem entrar em conluio com criminosos de colarinho branco ou de camiseta, sem enganar os consumidores? Claro que sim, essa já é a realidade da maioria dos brasileiros que vivem honestamente no País. Escolha seu lado, não vote em políticos desonestos e faça a diferença. Simples assim.

Moro continua fazendo a parte dele. Na terça-feira passada, mandou prender o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, que teria financiado o PT com recursos desviados do BNDES. Na quarta, surpreendeu novamente o mundo político e encarcerou o senador petista Delcídio Amaral e o banqueiro André Esteves, sócio do BTG Pactual, acusados de planejar a fuga do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró. Ambos negam o complô e resta provar essas graves denúncias. Por ora, o Senado e o Supremo Tribunal Federal respaldaram a decisão de Moro. Só o tempo vai dizer se fez-se justiça na Lava Jato. Tudo indica que há algo de novo no reino do Brasil. A impunidade pode estar com os dias contados.

Milton Gamez, jornalista, é diretor de Núcleo da Editora Três e coordena as revistas IstoÉ Dinheiro, Dinheiro Rural e MotorShow