No início da crise, diante da queda da demanda externa por seus produtos, a Embraer e a Vale demitiram um número relativamente grande de trabalhadores e reduziram suas expectativas de investimentos. Da mesma forma, os bancos privados, com o aumento do desemprego e o colapso do mercado internacional, reduziram a oferta de crédito em uma atitude que tinha por objetivo evitar que um aumento da inadimplência os tornasse insolventes, como ocorreu com muitos bancos americanos.

Ao mesmo tempo que as empresas privadas adotavam uma postura cautelosa diante da profundidade da crise, o governo induziu os bancos públicos de varejo (BB e CEF) a aumentar a oferta de crédito para pessoas físicas e a adquirir carteiras de bancos privados em dificuldades e o BNDES a conceder crédito e a financiar a fusão e aquisição de empresas em dificuldades.

As decisões das empresas exportadoras quanto à redução de investimentos e de emprego e as decisões dos bancos privados de reduzir a oferta de crédito foram duramente criticadas por diferentes autoridades governamentais. Segundo elas, a retomada do crescimento a partir do segundo trimestre de 2009 mostrou que as empresas e os bancos privados erraram em suas decisões e, com o excesso de cautela, acabaram contribuindo para a crise.

Ainda que as decisões das empresas e bancos privados e dos bancos estatais tenham sido totalmente diferentes no auge da crise, a posteriori pode-se dizer que ambas estavam corretas. A diferença fundamental entre elas é que, caso as expectativas se materializassem e uma empresa ou banco privado se tornasse não lucrativo, as perdas teriam que ser pagas pelos seus donos ou acionistas, o que poderia, inclusive, levá-los à falência. Por outro lado, no caso dos bancos e empresas estatais, se o pior cenário se materializasse e os bancos oficiais se tornassem insolventes, o dono é o governo e, como o governo se financia via impostos, as perdas acabariam sendo pagas pela sociedade como um todo (o que aliás já ocorreu por diversas vezes no Brasil, quando o governo teve que utilizar a arrecadação de impostos para capitalizar bancos oficiais).

Esta diferença é relevante e mostra a importância do Estado e, ao mesmo tempo, os riscos envolvidos em um Estado excessivamente ativo do ponto de vista econômico. Em situações especiais, como a vivida no final de 2008 e início de 2009, quando as expectativas se tornaram muito pessimistas, o Estado tem um papel fundamental. Em situações como essas, o setor privado se torna muito cauteloso diante da possibilidade de perdas significativas. Nesses momentos, a atuação do Estado pode contrabalançar a retração do setor privado e evitar uma recessão ainda mais forte, como, aliás, está ocorrendo tanto no Brasil quanto em outros países do mundo desde o final de 2008.

Por outro lado, o fato de que os riscos são assumidos pela sociedade e não pelos gestores das empresas e bancos estatais diretamente e, muitas vezes, as motivações de política econômica têm importância decisiva sobre as decisões, como ocorreu no episódio atual, pode gerar incentivos para que os governos utilizem estas empresas para atingir objetivos políticos de curto prazo, aumentando a probabilidade de erros em sua gestão, comprometendo seu desempenho econômico no longo prazo.

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A lição é simples. Um Estado capaz de ter uma atuação forte em momentos excepcionais é um importante instrumento de estabilidade econômica. Porém, uma vez retomada a normalidade, é fundamental que o Estado volte ao seu papel de regulador da atividade econômica, deixando para a iniciativa privada a tarefa de gerar riqueza.


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