Investigados na Operação Zelotes pelo esquema de lobby e corrupção para favorecer empresas do setor automotivo, Alexandre Paes Santos, conhecido como APS, e Mauro Marcondes Machado estiveram na leva de lobistas com prisão preventiva decretada na última segunda-feira 26. Em comum, os dois têm o fato de serem velhos conhecidos dos subterrâneos do poder em Brasília. Consultor de empresas do setor automobilístico, Marcondes, que repassou R$ 2,4 milhões a Luís Cláudio, um dos filhos de Lula, nutre amizade com o ex-presidente petista desde a década de 80. Na ocasião, atuou para tirar Lula da cadeia, quando ele foi preso por liderar uma greve de 18 dias no ABC paulista. Em 2003, primeiro ano de Lula na Presidência, o empresário comandava a Diretoria de Assuntos Governamentais e Trabalhistas da Scania e pilotou a adesão da montadora ao extinto Fome Zero. A chegada do PT ao poder incluiu Brasília no seu raio de ação. Transitava fácil nos gabinetes da capital do País, incluindo a antessala da Presidéncia da República. Um e-mail interceptado pela Operação Zelotes foi revelador sobre o nível de intimidade com integrantes do governo. Numa mensagem de 2007 endereçada a Gilberto Carvalho, então chefe de gabinete de Lula, Marcondes pediu que o “amigo” entregasse um documento ao ex-presidente petista. No mesmo email, ele indica até a maneira como ele gostaria que o repasse fosse realizado: “daquela forma informal e low profile que só você sabe fazer”.

A relação de proximidade com Lula permanece até hoje. De acordo com documentos apreendidos na Operação Zelotes, Marcondes fez contato com Lula em agosto de 2013, período em que o lobista negociava a medida provisória 627, suspeita de ter sido comprada. A MP foi editada em novembro do mesmo ano pela presidente Dilma Rousseff e favoreceu clientes do consultor. Num dos documentos encontrados no escritório do lobista, cujo título é “Pendências Dr. Mauro Marcondes (16/08/2013)”, constam compromissos a serem cumpridos por ele na negociação de interesses de seus clientes, entre eles montadoras de veículos. Um dos itens registrados é: “Colocar Dr. Mauro em contato com o Presidente Lula – Instituto Lula”. Na avaliação de setores de Inteligência da Receita Federal, as “anotações do lobista revelam a existência de proximidade com o ex-presidente Lula”, devido ao “planejamento de contato telefônico e pessoal” com o petista.

O consultor, que até semana passada era vice-presidente da ANFAVEA (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), também transitava com desenvoltura, segundo a Receita, junto a “outros agentes públicos, especialmente do PT”. A constatação tem como base outra lista de agendamento de reuniões, de 17 de abril de 2013. Entre os políticos mencionados, encontram-se os petistas Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo do Campo, Antonio Palocci, ex-ministro da Casa Civil e Fazenda, e Aloizio Mercadante, ministro da Educação.

Acusado de intermediar a compra da medida provisória, APS também não é um neófito dos escândalos. Na década de 90, dono de um concorrido cartão de visitas, ele foi considerado o lobista mais poderoso de Brasília. Chegou a ostentar uma carteira com mais de 60 clientes, 65 funcionários e R$ 5 milhões de faturamento mensal. Transitava sem ser incomodado pelo plenário da Câmara dos Deputados, onde era flagrado em conversas ao pé de ouvido com dezenas de parlamentares, em especial o deputado Arnaldo Faria de Sá. No início dos anos 2000, no entanto, ele foi abatido em pleno voo e teve de submergir. Em outubro de 2001, vazou a informação de que APS teria uma fita em que funcionários do Ministério da Saúde tentavam extorquir um de seus clientes, o laboratório suíço Novartis. A história respingou no então ministro José Serra, que ordenou rigorosa investigação. A tal fita nunca apareceu.

Os métodos de trabalho de APS vieram à tona quando a Polícia Federal apreendeu a agenda do lobista. No caderninho, figuravam nomes de autoridades e funcionários de alto escalão sucedidos de números e a letra K. Por exemplo: Fulano 26K, Sicrano 50K. Suspeitava-se que o K significava “mil reais”. APS alegou que era apenas o seu método de classificar níveis de relacionamento. A agenda, na verdade, trazia pagamentos de propinas a parlamentares e funcionários do governo, histórias de chantagens e esquemas de superfaturamento em contratos com órgãos públicos. Nada ficou comprovado, mas a sigla APS virou sinônimo de problemas e o lobista viu seu negócio ruir. A partir da ascensão de Lula ao poder, Paes voltou à ribalta ao se aproximar de um dos filhos do ex-presidente: Fábio Luís. Lulinha chegou a despachar em um dos escritórios de APS. Depois, processado na Justiça por uma matéria na imprensa, Paes classificou o filho do ex-presidente como “um primário”, “um idiota”, “uma decepção”. Ele também disse que Lulinha “tem uma disfunção qualquer”, por chamar a presidente Dilma Rousseff de “tia”. Deu no que deu.