O mundo comemorou quando cientistas anunciaram, no dia 24 de setembro, que pela primeira vez uma vacina tinha diminuído o risco de infecção pelo HIV em humanos. Menos de três semanas depois, um balde de água fria: a informação de que a vacina teria reduzido em 31,2% as chances de contrair o vírus não era conclusiva.

Uma análise das pessoas infectadas revelou que a eficácia poderia não passar de 26% – o que eliminaria a relevância estatística dos testes. Em outras palavras, a aparente proteção pode ter sido mera questão de sorte. O estudo sobre a vacina foi feito na Tailândia com 16 mil voluntários, coordenado pelos governos americano e tailandês.

Os responsáveis pelo trabalho se recusaram a detalhá-lo antes da terça-feira 20, quando os dados serão discutidos em uma conferência em Paris. Na pesquisa, metade dos participantes tomou a vacina e a outra, placebo, ambos aplicados em seis doses. No total, 125 pessoas foram infectadas durante o trabalho. Foi com esse número que os cientistas chegaram à eficácia de 31,2%.

O problema é que nem todas tomaram as doses nas datas corretas e algumas contraíram o vírus antes de completar a série. Excluindo esses casos, o número de contaminados cai para 86, deixando a eficácia em 26% e tornando a margem de erro grande demais para possibilitar conclusões definitivas.

Defesa Fauci diz que não informou dados para evitar confundir as pessoas

Esse dado constava do trabalho, mas não foi divulgado. "Achamos que colocar diversas análises estatísticas confundiria a todos", afirmou Anthony Fauci, coordenador do trabalho. Mas parte da comunidade científica está questionando por que a análise completa não foi noticiada – as dúvidas só foram levantadas quando pesquisadores que não fizeram parte dos experimentos tiveram acesso à pesquisa.

"Seria melhor se tivéssemos tido acesso aos dados de cara", diz Esper Kallás, responsável por pesquisas de vacinas contra o HIV na Universidade de São Paulo. "O fato de terem saído duas informações diferentes colocou em dúvida o resultado da experiência", completa Artur Kalichman, coordenador-adjunto do Programa DST/ Aids de São Paulo.

Os críticos dizem ainda que o ideal seria que o segundo resultado, obtido já com a exclusão de participantes, confirmasse o primeiro, mais geral. O Exército americano, que colaborou com os testes, colocou panos quentes: argumentou que a primeira avaliação é mais compatível com as situações reais de vacinação e que os coordenadores queriam divulgar os bons resultados o quanto antes possível. Mas o resultado foi o inverso. Na ânsia pela notícia boa, Fauci e seu grupo acabaram criando ainda mais ceticismo em torno da pesquisa.