Até que a morte nos separe? No que depender dos brasileiros, para separar, basta estar casado. A pesquisa "Percepção Social do Divórcio na Espanha", da Universidade de Granada, divulgada neste mês, verificou que o Brasil é o país onde o divórcio é mais bem aceito socialmente. O levantamento feito em 35 países mostrou que 85% dos entrevistados nacionais consideram a separação a melhor solução para um casamento que não vai bem.

Apesar da postura de vanguarda, a ruptura de uma união oficial está longe de ocorrer sem dor numa nação de tradição católica e familiar. Para ajudar homens e mulheres a sobreviver ao dilúvio do fim de uma união, livros, manuais e blogs oferecem dicas de como enfrentar o antes, o durante e o depois da tempestade. Na série "Divórcio para Eles" e "Divórcio para Elas" (Editora Tao), a escritora Eliane Santoro reuniu 30 entrevistas com pessoas que atravessaram todas as etapas do divórcio e, com o auxílio de psicólogos e advogados, listou os dramas mais comuns de cada um deles. Os homens têm dificuldades em lidar com a perda do convívio com filhos – em 90% dos casos, as mães detêm a guarda – e administrar o baque financeiro que acompanha o pacote da separação.

Além da pensão alimentícia, o equivalente a cerca de 30% da renda mensal, eles precisam começar do zero e providenciar um novo local para morar. Para as mulheres, as mazelas são emocionais. A sensação do fracasso de um (acalentado) projeto romântico e a preocupação em não repassar aos filhos a dor da separação atormentam as recémdivorciadas.

"Vou sentir um vazio quando os papéis forem assinados"

Rogéria Capetine, 29 anos

O caráter de guia dos livros pode servir como uma boia de salvação na tormenta emocional que marca o fim de um casamento. Eliane mostra que a preparação deve ser feita, se possível, bem antes de separar as escovas de dentes. E ensina desde como reconhecer que acabou até a maneira de se fortalecer para o dia D – a temível conversa definitiva que põe fim a um projeto em comum, normalmente iniciado com grande paixão e embalado por sonhos de uma vida inteira juntos. Terapia e consultas a contadores e advogados estão no roteiro.

O manual também antecipa o que vem logo depois do término – a hora de contar para os filhos, quem vai ficar com quem e com o quê, a divisão de tarefas, bens e dinheiro, a frieza de juiz e advogados no angustiante momento da assinatura dos papéis. E há o bem depois, a luz no fim do túnel após o – saudável e necessário – período de luto. Um tempo de reconstruir relações. Com os filhos, com o/a ex, com os novos amores. Além disso, a obra se preocupa em responder a questões jurídicas essenciais e oferece blogs e fóruns de discussão na rede para os momentos de troca de experiência e desabafo.

Um aspecto peculiar que diferencia homens e mulheres na relação com o divórcio é a hora em que cada um se rende ao fim da união. Em geral, mesmo após todos os indícios de ruína, a mulher tende a negar a realidade e se sente surpreendida com a separação (quando a decisão é tomada pelo homem, obviamente). Já eles, postergam o divórcio até o limite. "O que os prende em casa são os filhos e a questão financeira", diz Eliane. Foi o que ocorreu com o guarda civil Mateus Marcelo Jesus, 40 anos, que manteve durante três anos um casamento arruinado. "Esperei até ter condições de deixá-las amparadas financeiramente", afirma Mateus, em referência à ex-mulher e às duas filhas.

A atriz Rogéria Capetine, 29 anos, tinha todos os elementos para prever seu futuro, mas preferiu abstrair os fatos e apostar na sorte. "Ele me traiu uma vez quando namorávamos", afirma. Após a descoberta, apesar de desconfiada, não resistiu às investidas do amado e cedeu ao pedido de casamento. "Eu tinha esperanças de que tudo se acertasse", diz. Para testar a fidelidade do marido, se passou por outra mulher e o abordou pela internet. "Ele deixou claro que me trairia de novo", conta a atriz, que se separou há três anos, mas ainda não está certa do divórcio. "Vou sentir um vazio quando os papéis forem assinados." "O maior desafio é entender que o casamento acaba, mas a vida continua", afirma a psicóloga Maria Tereza Maldonado, que publicou recentemente o livro "Casamento, Término e Reconstrução" (Integrare Editora).

Dados da última pesquisa estatística do registro civil do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que um em cada quatro casamentos se desfaz no Brasil. Em 2007, foram registrados cerca de 180 mil divórcios e 51 mil separações no País – 200% a mais do que no ano de 1984. "O brasileiro não se mantém numa relação sem felicidade", afirma a antropóloga Mirian Goldenberg. Ao contrário do que possa parecer, isso não prenuncia uma crise na instituição. "É um sinal da valorização do casamento satisfatório", afirma Mirian. Em 2007, foram realizados 916 mil casamentos – 3% a mais que no ano anterior. A taxa inclui os divorciados. Se há manuais para ajudá-los, melhor.