Eram quase oito horas da noite da quarta-feira 16 quando mais de um milhão de pessoas da região central do Chile tiveram que deixar as suas casas. Um velho conhecido obrigou os chilenos a correr para a rua: terremoto de grandes proporções. Há muitos séculos, com uma regularidade impressionante, o país é acometido por abalos sísmicos acima de 8 graus na escala Richter. Dos dez maiores terremotos de todos os tempos, dois ocorreram no Chile. O mais intenso deles, em 1960, matou 2 mil pessoas. Desta vez, o tremou atingiu a magnitude de 8,3 graus, tornando-se o sexto maior na história do país. Até a sexta-feira 18, as autoridades contavam pelo menos 12 mortos e cinco desaparecidos. Casas e edifícios comerciais foram destruídos, navios tombaram, rachaduras tomaram diversas avenidas e 245 mil famílias ficaram sem energia para que os danos pudessem ser avaliados.

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Por mais que tragédias desse tipo sejam incontroláveis, o Chile minimiza o número de vítimas porque aprendeu, com o passar dos anos, a evitar que os estragos sejam ainda maiores. Como no Japão e nos Estados Unidos, países também sujeitos à ação mortal dos terremotos, as crianças aprendem na escola normas de conduta para se proteger dos tremores. Quando um abalo de potencial destruidor é registrado, sirenes disparam e os moradores, principalmente da região costeira, sabem que devem deixar suas casas e procurar lugares mais altos, distantes das ondas de um eventual tsunami. Os chilenos também desenvolveram o hábito de dormir com documentos e dinheiro por perto, para não perder tempo quanto tiverem que sair às pressas da cama, e sempre prestam atenção na saída de emergência de hotéis, restaurantes e prédios comerciais.

Como no grande terremoto de 2010, reflexos dos tremores no Chile foram sentidos na Argentina, no Uruguai e até no Brasil. Em São Paulo, alunos de uma universidade na Avenida Paulista, um dos lugares mais altos da cidade – e a mais de 3,5 mil quilômetros de distância do epicentro do fenômeno – perceberam que as venezianas das salas de aula balançavam sem motivo aparente. Um lustre também se movimentou. Para alguns estudantes, o chão tremeu e houve relatos de pessoas com tontura e enjôo. O Corpo de Bombeiros chegou a receber 50 ligações. Além da Paulista os bairros do Tatuapé e Vila Mariana e as cidades de Osasco e Guarulhos, ambas na Grande São Paulo, também foram afetados. Segundo o professor de geofísica da Universidade de São Paulo (USP), Marcelo Assumpção, o fenômeno não traz qualquer risco para o Brasil. “A cidade de São Paulo está numa bacia sedimentada e o máximo que os paulistanos vão sentir são pequenas vibrações”, diz.

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TERRA ARRASADA
Um navio tombado (acima), destroços e desespero em uma rua de Coquimbo,
perto do epicentro do terremoto: o sexto maior tremor da história do país

O Chile está longe de se livrar do pesadelo de terremotos. Cientistas calculam que, a cada 20 anos, o país sofrerá um abalo gigantesco. Ou menos. O da semana passada veio apenas 5 anos depois do sismo de 2010. “O Chile fica no encontro de duas placas tectônicas, a de Nazca, no Oceano Pacífico, e a da América do Sul”, afirma Assumpção. “Quando elas se chocam, acontece um terremoto.” Além dos grandes terremotos, a reacomodação das placas libera energia suficiente para formar monumentais cadeias de montanha, que podem ser vistas em todo o país. Na quinta-feira 17, a presidente chilena Michelle Bachelet sintetizou o fenômeno. “Esse é um fardo que o Chile vai carregar para sempre.”

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Fotos: Alejandro Pizarro/AP; MARTIN BERNETTI/AFP PHOTO