O nome de Jorge Paulo Lemann é lembrado pelas agressivas tacadas no mundo dos negócios. Nos últimos anos, o 3G Capital, seu fundo de investimento em sociedade com Marcel Telles e Beto Sicupira, criou a Ab-InBev, empresa que controla 15% do mercado global de cervejas, com as marcas Budweiser, Stella Artois, Brahma, entre outras, adquiriu a rede de fast food Burger King e se associou ao megainvestidor americano Warren Buffett para comprar a Kraft Foods e a Heinz e formar o terceiro maior conglomerado do setor de alimentos dos Estados Unidos e o quinto em escala mundial. Com uma fortuna estimada em US$ 22,1 bilhões, o homem mais rico do Brasil e um dos 30 maiores do mundo ainda tem um sonho: ser lembrado pelo seu papel de educador.

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GAROTA, EU VOU PRA CALIFÓRNIA:
Jorge Paulo Lemann (acima) em sala de aula e seu núcleo de estudos
direcionado aos problemas do Brasil, na Universidade Stanford (abaixo)

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Aos 76 anos, Lemann é um exemplo de empresário que tem participação ativa na transformação social. A educação não está na sua lista de negócios lucrativos, mas ele não se importa. É com o ensino que Lemann espera colher seu melhor fruto. Seus quatro projetos movimentam o ensino básico, fundamental, vestibular, graduação, pós-graduação e novas metodologias de ensino. A Fundação Estudar, criada em 1991 com seus sócios Telles e Sicupira, custeia bolsas de graduação e pós-graduação; a Fundação Lemann testa novas tecnologias para melhorar em massa a qualidade da educação; a Gera Venture foi criada para investir em startups voltadas à educação; e o Lemann Center é um núcleo de estudos em Stanford, na Califórnia, voltado às pesquisas sobre alguns dos principais problemas do Brasil. “As pessoas apareciam no escritório e eu dava bolsas. Devo ter dado umas 500 bolsas e não tinha mais noção de quem estava ajudando”, disse Lemann, em evento promovido pela consultoria Falconi, há dois anos. “A Fundação Estudar surgiu para organizar esse trabalho e hoje é um centro que ajuda as pessoas a voarem mais alto e a contribuir com o País.”

A Estudar marca o início de sua atuação no universo da educação, mas é a fundação que leva seu nome a responsável pela grande transformação. Criada em 2002 com recursos da família, a Fundação Lemann atua na melhoria da qualidade da educação brasileira com projetos inovadores. Só no ano passado, as atividades da instituição atingiram quatro milhões de pessoas (em 25 anos a Estudar financiou menos de mil bolsistas). Para Lemann, é pouco. Nos próximos três anos, ele quer que esse número chegue a 30 milhões. Como presidente do Conselho da Fundação, Lemann acompanha o trabalho de perto. Participa de reuniões e eventos, e de todo o planejamento estratégico. “Temos um acompanhamento de projetos muito profissional, com metas, gerenciamento de resultados, além de uma equipe bem escolhida e muito motivada”, diz a diretora de projetos Camila Pereira.

A organização se empenha, entre várias ações, em desenvolver plataformas de ensino à distância e aplicativos para conectar pais e professores, em capacitar docentes para publicarem suas aulas no YouTube e ganharem visibilidade, em apoiar empreendedores e em fazer parcerias com sites que oferecem cursos. A exigência é que sejam sempre gratuitos, online e disponíveis para todo o mundo. Com a plataforma Khan Academy, a Fundação Lemann traduziu para o português as lições de matemática do professor americano Salman Khan e colocou ao alcance de mais de 50 mil alunos de escolas públicas em 44 redes municipais. O uso da tecnologia nas salas de aula é visto como um apoio fundamental para a personalização do aprendizado – o conceito é que cada aluno aprende num ritmo e de um jeito diferente. A plataforma ajuda os professores a lidarem com a heterogeneidade das turmas. Assim como ferramentas como Facebook, Netflix e Google, que guardam um perfil do usuário, a Khan Academy aprende com o comportamento do aluno. “A plataforma sugere novos desafios a partir de erros, acertos e da maneira como ele resolve os exercícios”, afirma Camila. O professor acompanha a turma em tempo real, identifica as dificuldades e adapta seus métodos.

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Mas o uso da tecnologia na sala de aula tem uma barreira. As escolas precisam ter internet banda larga com acesso sem fio. Esse ainda é o gargalo que impede a adoção desses recursos em larga escala. Por isso, a Fundação Lemann precisa colocar em prática uma outra estratégia, a de influenciar as políticas públicas. Os encontros com secretários estaduais de educação, parlamentares, ministros e diretores de agências regulatórias são frequentes.

Se a massificação com a qualidade de ensino der resultado, os alunos podem sonhar em ser futuros líderes, com apoio da própria Fundação. O Lemann Fellowship distribui bolsas de pós-graduação em universidades americanas como Harvard, Stanford e Yale para quem quiser dedicar a carreira a resolver problemas sociais no Brasil seja no setor público, privado ou no terceiro setor. Ricardo Terra é um deles. Formado em Medicina pela Universidade de São Paulo, ele foi para Harvard, em 2012, graças ao programa. Hoje é um dos coordenadores do Instituto do Câncer de São Paulo e impacta diariamente a vida de centenas de pessoas. Lemann costuma repetir que sonhar grande ou pequeno tem o mesmo preço. Na educação, ele segue firme a sua lição.