Ao longo desta semana, o presidente Lula estará, pela quinta vez, em viagem à África, conversando com ditadores vitalícios, assistindo a cerimônias exóticas e pregando sua nova causa econômica, o etanol. Começa o périplo nesta segunda-feira 15 em Uagadugu, capital de Burkina Fasso, um pequeno país espremido entre o Saara e as guerras pelas minas de diamantes da África Ocidental. Está previsto que Lula elogie os avanços democráticos do país (o presidente Blaise Compaorê está no poder desde 1987) e que fale do etanol. Depois, ele segue para Brazzaville, Congo – mais imagens exóticas e etanol. Vai a Pretória, África do Sul, onde discute uma aliança global estratégica com o presidente Thabo Mbeki e o primeiro-ministro da Índia Manmohan Singh. E falará de etanol. Por fim, Luanda, Angola, onde se encontra com o presidente vitalício José Eduardo dos Santos. E pregará o etanol. Até o final de seu mandato, ele planeja voltar mais três vezes à África para visitar entre 15 e 20 países.

O etanol é importante, mas não é o único motivo da viagem do presidente. Lula está movendo as peças de um jogo estratégico da geopolítica global. O Brasil quer a África em sua área de influência econômica, política e cultural. A China também quer – e está jogando muito mais pesado na disputa pelos negócios. Desde que a guerra- fria acabou, há 20 anos, o continente foi abandonado à própria sorte. O discurso no Ocidente é que a África seria um problema insolúvel, um inferno de doença, fome e corrupção. Mas de quatro anos para cá, os chineses apareceram com um discurso diferente. A China reservou parte de seu US$ 1,3 trilhão em reservas para investimentos na África. Eles estão pagando a construção de escolas, hospitais, estradas e redes de saneamento. Já gastaram US$ 25 bilhões e têm mais US$ 10 bilhões em negociação. Só em Angola, já investiram US$ 4 bilhões. Em troca, querem o direito de explorar as reservas de minérios e petróleo.

O avanço chinês está batendo de frente com os interesses brasileiros. A empreiteira Odebrecht, por exemplo, está em Angola desde 1981. Já construiu grandes obras e abriu caminho para duas mil empresas brasileiras, como a concorrente Queiroz Galvão. A fabricante de perfumes e cosméticos O Boticário está chegando. Angola, por exemplo, cresceu em 2006 16% e este ano deve passar dos 20%. Brasileiros e chineses disputam cada negócio. Nas obras públicas, os chineses estão ganhando. Mas nossas empreiteiras passaram a construir imóveis. Estão se dando bem. Há três anos, a Odebrecht tinha 3,2 mil funcionários em Angola; hoje tem 10,8 mil. Na mineração, a Vale do Rio Doce perdeu para os chineses as reservas de ferro, cobre, níquel, ouro e diamantes. A Vale também perdeu disputas por minas no Quênia, Nigéria e Gabão. Só ganhou uma mina de carvão em Moçambique.

Lula já conversou duas vezes com o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, que o batizou de “mascate do biocombustível”, sobre a questão africana. Tentou convencê-lo a ajudar a África através do Brasil, financiando projetos de biocombustíveis nas savanas. Bush não se interessou. Enquanto isso, o Brasil vai tocando o projeto africano sozinho.