Nem tudo o que há de bom na Rede Globo passa por Guel Arraes, mas tudo o que passa por ele é bom. Entre atrações atuais, como Brava gente e Os normais e as que já saíram do ar, como Armação ilimitada e Programa legal, Guel Arraes é chancela de qualidade e criatividade. Não causa surpresa, portanto, que tenha sido ele a transformar a ótima minissérie global O auto da Compadecida num filme de bilheteria farta, com mais de dois milhões de espectadores. Agora, o fenômeno ameaça se repetir com Caramuru, a invenção do Brasil – cartaz nacional –, minissérie escrita por ele e Jorge Furtado, também produzida com a intenção de migrar para a tela grande. Caramuru – muito bem interpretado por Selton Mello – é pioneiro brasileiro no uso de alta definição de imagem, o HDTV (High definition), cinco vezes melhor que o sistema habitual. “O mais interessante dessa experiência de fazer cinema na tevê é que, quando fui ver, já tinha feito meu filme sem sentir”, diz o Guel diretor, roteirista, produtor e adaptador.

Nascido no Recife e obrigado a se mudar do Brasil devido às atividades políticas do pai, o ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes, Guel relembra os compromissos que assumiu com ele mesmo nos tempos de exílio, quando estudava cinema na França. “Eu achava que só iria fazer coisas sérias. Drama, documentário, história, cinema? Só alternativo”, conta. Dá para perceber, então, o que foi para o rapaz de 20 anos voltar ao Brasil, em 1981, e cair nos braços da Rede Globo. “Imagine o que é planejar fazer cinema engajado e estar fazendo novela”, diz. Hoje, o script é diferente: “Não penso mais assim. Minha geração é praticamente perdida para o cinema, pegamos o osso do cinema. Ainda bem que fui para a televisão porque não parei de filmar. Sou bastardo, não tenho uma carreira convencional, mas foi a tevê que me levou para o cinema. Para mim, o melhor dos mundos é poder trabalhar nos dois universos.”

Reinventar o Brasil em Caramuru é tão prazeroso quanto admirar a índia Paraguaçu, personagem interpretada por Camila Pitanga, a representação fiel do povo brasileiro, segundo o diretor. Maliciosa sem perder a ingenuidade, ingênua sem ser boba, Paraguaçu está contida em qualquer pedaço do Brasil que Guel Arraes, um morador da zona sul carioca, conhece bem. Até hoje ele literalmente mantém um pé no Recife calçando uma coleção de sandálias coloridas de couro by Sr. Expedito, sapateiro que conheceu na infância. Entre os amigos, elas já viraram sua marca registrada. Para o público, no entanto, Guel Arraes continua sendo sinônimo de uma capacidade invejável de realizar entretenimento de qualidade.