Considerado uma das sensações das mostras de cinema que recentemente sacudiram São Paulo e Rio de Janeiro, Hedwig – rock, amor e traição (Hedwig and the Angry Inch, Estados Unidos, 2000), cartaz nacional a partir da quinta-feira 15, surgiu de uma peça teatral escrita a quatro mãos pelo ator John Cameron Mitchell e pelo músico Stephen Trask. O ponto de partida foi a música A origem do amor, que fala de um mito grego segundo o qual as pessoas nasciam com duas cabeças, dois pares de braços e pernas, eram separadas por um raio e passavam a vida em busca de sua metade perdida. Em linhas gerais, Hedwig – interpretado pelo próprio Mitchell, que também dirige – é um transexual alemão, vocalista da banda Angry Inch, que se autodefine como rock pós-punk-neo-glam. Acompanhado(a) pelo marido Yitzak (Miriam Shor, uma atriz), Hedwig excursiona com o grupo cumprindo um roteiro paralelo ao seguido pelo astro pop Tommy Gnosis (Michael Pitt), de quem foi amante. O problema é que Gnosis se apresenta em estádios, enquanto Angry Inch toca numa cadeia de restaurantes especializados em frutos do mar.

A triste história de Hedwig é contada através de canções e monólogos. Falam de amores frustrados, da malsucedida operação para mudança de sexo – que resultou na polegada furiosa a que o título original se refere – e da traição cometida por Gnosis, que lhe roubou o coração, as músicas e levou consigo o nome artístico de sua sugestão. O filme é um delírio visual e sonoro. Hedwig usa 41 vestidos, a banda 16 perucas. Monólogos hilariantes do(a) protagonista são entremeados por flashbacks e animações inspiradas pelo som de muito rock’n’roll. Como ocorreu nos Estados Unidos e na Europa com o filme The Rocky horror picture show e aqui com o espetáculo Nos tempos da jovem guarda – em que o ator Renato Kramer imita Wanderléa há 21 anos –, Hedwig também virou cult em Nova York e Londres. Seus fãs se auto-intitulam hedheads e copiam as roupas da glamourosa personagem. Não se importam nem mesmo com o viés piegas que a história assume perto do fim. Afinal, a vida nada mais é do que a busca da metade perdida.