Nem mesmo o aposentado e experiente repórter policial Rafael Villanova estava preparado para aquilo. À sua frente, com os seios à mostra, Larissa Daho, a jornalista de televisão que o entrevistava, pedia-lhe que a deixasse marcada com uma mordida. Que mulher louca era aquela, que gostava de ter relações com policiais caçadores e bandidos foragidos, acreditando que a proximidade da morte modificava-lhes a performance na cama? Assim se inicia a história de A fina flor da sedução (Nova Fronteira, 160 págs., R$ 10), de José Louzeiro, título de estréia da coleção Primeira Página, coordenada pelo escritor, que pretende dar um sopro de vida a esse gênero que no Brasil tem representantes como Rubem Fonseca, Luiz Alfredo Garcia-Roza,
entre outros.

Situado a anos-luz do cinismo galante consagrado por autores como Dashiell Hammet, Raymond Chandler, Rex Stout ou Ellery-Queen, o sotaque nativo do estilo foi moldado pela galeria de repórteres policiais que ajudaram a vender milhões e milhões de jornais e revistas, antes e depois do surgimento da televisão. Gente que chafurdou numa realidade violenta na qual a frase “polícia é polícia e bandido é bandido”, atribuída ao delinquente Lúcio Flávio, se mostrou verdadeira pelos motivos errados. Os nomes se multiplicam. Jorge Elias, Pinheiro Jr., Orlando Criscuolo, Otávio Ribeiro – o “Pena Branca” –, Alberiza Garcia e Percival de Sousa integram a lista lembrada ao acaso por Louzeiro, ele mesmo aí incluído e autor de livros célebres como Infância dos mortos, Aracelli, meu amor, e do roteiro do filme Lúcio Flávio, o passageiro da agonia, de Hector Babenco, todos inspirados em casos reais.

A idéia da coleção é resgatar esta escola de grandes repórteres. Louzeiro funciona como o “chefe de reportagem”, denominação dada aos editores de antigamente, que coordena a reunião de pauta com os escritores “candidatos”. Cada título, baseado em casos, detalhes e circunstâncias reais, é discutido como se fosse uma matéria de jornal. Além de A fina flor da sedução, de Louzeiro, já estão nas livrarias No fio da noite, de Ana Teresa Jardim, que se passa no Rio de Janeiro dos anos 20, e Juízo final, uma exceção, texto apresentado já pronto pelo cartunista Nani. Os próximos lançamentos serão Conexão Sardinha, de Carlos Castelo Branco, e Treze no caixão, de Mário Feijó. Como o livro de Louzeiro trata da realidade nua e crua, o que há de verídico na história do personagem Villanova, envolvido no assassinato de sua governanta e dono de um livro denunciando com nomes, datas e fatos a corrupção política nas últimas décadas? “Apenas a entrevista com a repórter, cujo nome troquei, evidentemente”, adianta o autor, que não descarta ser procurado pela moça.