Foi preciso o governo do Amazonas conseguir que o Supremo Tribunal Federal declarasse abusivas as sucessivas reedições da medida provisória que vinha estendendo artificialmente a vigência da velha lei de informática, expirada em outubro de 1999. Sob a ameaça de ver implodir sua política industrial para os setores de informática e telecomunicações, o governo federal conseguiu que o Congresso Nacional aprovasse na última semana de dezembro o projeto empacado há mais de um ano da nova lei de informática. Aparentemente, só falta a sanção presidencial, a sair até 11 de janeiro.

Entretanto, o caso pode não estar encerrado: uma emenda do senador Paulo Souto (PFL-BA) exclui dos benefícios fiscais propiciados pela lei a fabricação de novos produtos em “Estados que receberam mais de 50% do incentivo total nos últimos dois anos” – leia-se São Paulo. Mesmo se Fernando Henrique Cardoso vetar essa emenda, o Amazonas anunciou que voltará ao STF. Argumenta que a Zona Franca, por ser prevista na Constituição, prevalece sobre a lei de informática. Parlamentares dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul e Bahia, contando com o apoio de indústrias que já investiram nessas regiões, como Compaq, Motorola, Ericsson, Alcatel, Nortel, Lucent, Dell, HP, IBM e LG, ameaçam colocar em pauta a eliminação da Constituição dos incentivos à Zona Franca de Manaus, onde estão Nokia, Samsung e Gradiente.

Prós e contras – Na prática, uns e outros incentivos têm estimulado apenas a montagem final dos equipamentos. Deixa-se de importar a parcela do valor embutido nessa montagem e é gerado certo número de empregos, mas continua crescendo explosivamente a importação de componentes: 42,6% no primeiro semestre de 2000. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, o déficit na balança comercial eletrônica pode passar dos US$ 10 bilhões em 2005.

Há poucas perspectivas de nacionalizar os componentes mais estratégicos, devido à pequena escala do mercado brasileiro ou mesmo sul-americano – apenas 3% do mercado mundial de informática. O governo federal acredita, entretanto, que os incentivos à lei de informática, se aplicados à produção de monitores de tevê e celulares, em substituição aos da Zona Franca, reduziriam a importação de seus componentes em cerca de 50% e custariam um pouco menos aos cofres públicos. Segundo o secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, a renúncia fiscal seria 20% menor. Em 2000, o governo já abriu mão de R$ 1 bilhão com incentivos de informática e R$ 2,3 bilhões com a Zona Franca. Em 2001, segundo o orçamento, os valores serão de R$ 1,2 bilhão e R$ 3,3 bilhões, respectivamente. Além disso, a indústria de hardware beneficiada pela lei de informática fatura anualmente R$ 22 bilhões e emprega 40 mil pessoas.

A Zona Franca oferece menos incentivo à verticalização e gera menos emprego qualificado por unidade de produto. No entanto, as áreas rurais do Amazonas se esvaziaram em busca dos salários da indústria eletroeletrônica. Se a Zona Franca, que fatura cerca de R$ 20 bilhões e gera 46 mil empregos diretos, fosse abolida de repente, os trabalhadores de Manaus não teriam como voltar a extrair borracha ou pescar tambaqui: seriam obrigados a emigrar, provavelmente para as metrópoles já sobrecarregadas do Centro-Sul – o que pode acontecer de qualquer forma em 2013, se não se encontrar uma forma de viabilizá-la a longo prazo.

Terceira via – Sem ambos os incentivos, o da lei de informática e o da Zona Franca, boa parte da indústria eletroeletrônica não existiria e a balança comercial poderia estar mais desequilibrada. Mas alguns equipamentos seriam mais baratos, pois a escala dos países centrais e asiáticos permite oferecer preços menores que os da indústria brasileira. E seria possível reduzir o montante dos impostos federais em R$ 4,5 bilhões – R$ 94 para cada uma das cerca de 48 milhões de famílias brasileiras ou 2,5% sobre a arrecadação prevista de R$ 177 bilhões. Ou ampliar outros gastos públicos: os R$ 4,5 bilhões superam o valor das despesas federais com ensino fundamental ou com programas de apoio à agricultura. Ainda está para se ver uma comparação racional entre os custos e benefícios das três alternativas que permita ao cidadão comum tomar posição no que está sendo tratado como mera guerra fiscal entre Estados.

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