Nesses tempos de retração do mercado de trabalho são raras as famílias imunes ao desemprego. Em Goiás, algumas delas arranjaram uma forma de assegurar um bom salário à custa do erário público. Basta ter os sobrenomes Sebba, Campos, Alves, Ferreira, Jayme, Barbosa ou Pascoal para obter um passaporte para as cobiçadas vagas no Tribunal de Contas do Estado de Goiás. Cinco dos sete conselheiros transformaram a folha de pagamento numa árvore genealógica. A generosidade é tanta que ainda dá para arrumar a vida de amigos e empregados particulares como motoristas e caseiros. Há casos de conselheiros que conseguiram empregar até 27 parentes e agregados. A renda familiar de alguns integrantes do órgão pode chegar a mais de R$ 100 mil. A farra no TCE é tão escandalosa que já foi objeto de uma CPI na Assembléia Legislativa. Dezenas foram denunciados, mas os clãs se mantêm. Três anos depois da CPI, o nepotismo cresceu.“O conselheiro acaba ficando refém da família porque não há nada que impeça as nomeações de parentes. Eu mesmo já solicitei ao Executivo que proíba essa prática”, justificou o conselheiro Frederico Jayme, com pelo menos seis familiares no TCE.

Muito preocupado com o conforto da parentada, o presidente do tribunal, Milton Alves Ferreira, é campeão no quesito emprego para a família e afilhados. ISTOÉ teve acesso a várias folhas de pagamentos do tribunal. O clã de Milton Alves Ferreira tem mais de 20 parentes e agregados nessas listas, incluindo esposa, quatro filhos, uma nora, dois genros, o sogro, sobrinhos e cunhadas. A CPI descobriu ainda que o salário de Juscelino Miranda, caseiro de Milton Ferreira Alves, também era pago pelo TCE. Os abusos não param por aí. Um dos filhos de Milton, Rodrigo Campos Ferreira, funcionário do TCE, utiliza as instalações do tribunal para tratar de negócios da empresa Campos Engenharia. Nos registros do Sistema Nacional de Emprego (Sine), o endereço que consta para a contratação de mão-de-obra para a empreiteira é exatamente o gabinete 10, de Milton Alves. Lá, segundo o Sine, os interessados devem encontrar Rodrigo. Contatado por ISTOÉ, Milton não retornou a ligação. A assessoria do TCE infomou que estava em férias.

Outra família que se farta no tribunal é a do ex-conselheiro José Sebba, aposentado em 1999. A CPI contabilizou 24 dos seus parentes contratados pelo TCE. Os Sebba aparecem como especialistas em inspeção de contas da administração estadual. Foram nomeadas inspetoras as noras de José, Ana Paula e Ana Luiza, e os filhos Frederico, José Júnior e Candice. A lista de familiares do ex-conselheiro empregados no TCE inclui ainda a mulher Rute Malvina Silva Sebba, sobrinhos, cunhados e um genro. Os conselheiros Ênio Pascoal, Eurico Barbosa, Naphtali Alves também têm sua cota familiar. O descaso no tribunal é tão exagerado que a Assembléia Legislativa resolveu disciplinar o nepotismo no Estado. De acordo com a Lei nº 13.145, governador, desembargadores, conselheiros, deputados e secretários podem nomear no máximo dois parentes. Mas a lei parece ser letra morta em parte de Goiás.

Em seus 48 anos de existência, o TCE realizou apenas um concurso. Foi no início do ano passado. Três procuradores, Fernando dos Santos Carneiro, David Ribeiro de Oliveira e Eduardo de Souza Lemos, e dois auditores foram empossados. Mas duraram pouco por exigirem rigor nas contas do TCE e de outros poderes. Foram exonerados em novembro. Hoje, a única concursada em todo o tribunal é a ex-miss Goiás Sylvia Pires Deja, lotada no gabinete de Milton Alves. No curto período em que trabalharam no TCE, descobriram dezenas de irregularidades: gratificações ilegais, aposentadorias fraudadas, compras de carros sem licitação, aumentos de salários e criação de cargos. E ainda mordomias como auxílio-combustível de R$ 800 por mês para os conselheiros e diárias de viagem com valores acima do que recebem os ministros do Tribunal de Contas da União. Quem selou a sorte dos concursados foi o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Joaquim Henrique de Sá. Ele aceitou a alegação de que o concurso, realizado pela Universidade de Brasília, foi irregular. Mas nada se provou a respeito.


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