Incensado por artistas controvertidos como Antonin Artaud e Pier Paolo Pasolini e até mesmo pela pensadora pós-feminista Camille Paglia, o Marquês de Sade, cuja obra originou o termo sadismo, sempre foi um prato cheio para diretores afeitos à polêmica, como é o caso do americano Philip Kaufman. Contos proibidos do Marquês de Sade (Quills, Estados Unidos, 2000), em cartaz nacional, baseia-se na peça homônima de Doug Wright, responsável pelo roteiro. De acordo com o autor, o nobre interpretado pelo excelente Geoffrey Rush vive seus últimos dias na prisão de Charenton, sob os cuidados do padre Coulmier (Joaquin Phoenix). Em meio a delírios obscenos, o escritor maldito cria seus livros, contrabandeados para as ruas pela criada Madeleine (Kate Winslet), até o presídio sofrer a intervenção do doutor Royer-Collard (Michael Caine), por ordem de um Napoleão irritado com a popularidade de textos imorais como Justine ou as vicissitudes da virtude.

O que hoje se tornou uma obra-prima, a moral vigente na época queria condenar ao esquecimento inexorável. Kaufman mostra, então, um Sade escatológico, que suga, perverte todos que dele se aproximam, subverte a ordem e aponta a hipocrisia de seu acusador, sempre em nome da possibilidade de se comunicar. Quills, do título original, traduzido para o português são aquelas antigas penas com as quais se escrevia. É a associação que o diretor encontrou para se referir aos meios usados por Sade para continuar criando – da tinta ao sangue, passando pelas fezes. Kaufman, no entanto, conseguiu atenuar a morbidez do tema. Criou episódios engraçados, valorizou a sensualidade de Kate Winslet, mas, como sempre, ficou a meio caminho entre o teatro, o cinema e a literatura de ação. 


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