O Palácio do Planalto apostava que o pacote de concessões, preparado há mais de um mês e divulgado na terça-feira 9, seria capaz de reverter a onda negativa enfrentada pelo governo desde o início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Mas o aparente respiro que o governo imaginava ter conseguido com o anúncio da privatização de aeroportos, rodovias, ferrovias e portos não deve durar nem uma semana. No horizonte de Dilma, a previsão é de nuvens carregadas. A grande intempérie terá como palco o TCU. Na quarta-feira 17, o plenário do tribunal irá julgar o relatório do ministro Augusto Nardes que pode pedir a rejeição das contas de 2014 da presidente.

HORIZONTE-01-IE.jpg
PRESSÃO
Na conversa com o relator Augusto Nardes, o ministro da Fazenda,
Joaquim Levy, argumentou que uma decisão desfavorável a presidente
pode comprometer o processo de recuperação das contas públicas

01.jpg

Na última semana, Nardes adiantou parte de seu parecer. Para ele, as chamadas pedaladas fiscais de Dilma – expressão usada para definir o uso de recursos dos bancos públicos para pagar benefícios sociais como forma de maquiar o mau resultado das contas do governo – infringiram a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Em abril deste ano, os ministros do tribunal já haviam concluído nesse sentido. Nos cálculos do TCU, mais de R$ 40 bilhões foram sacados pelo governo das contas do Banco do Brasil, Caixa e BNDES, para engordar a contabilidade fiscal e se aproximar da meta de superávit primário, a economia feita para o pagamento dos juros da dívida pública. “Há um descumprimento de lei. Um banco público não pode emprestar dinheiro para o governo. É como se você estivesse devendo no seu cheque especial, e o governo não pode ter esse cheque especial”, disse o ministro do TCU, José Múcio.

Como o que estava em análise, na ocasião, não eram as contas do governo e sim a manobra fiscal em si, Dilma não foi citada na votação de abril do TCU, mas o relatório sobre sua contabilidade de 2014 irá incluir as famigeradas pedaladas. A dúvida é se Nardes produzirá um parecer contundente, pedindo a rejeição das contas da presidente, ou aliviará para o governo, propondo apenas uma ressalva. A tendência até o fim da última semana era de que o ministro decidisse pela rejeição e esta fosse confirmada pelo tribunal. A colegas, Nardes tem rebatido o principal argumento de defesa do governo no processo: o de que a prática seria usual em diversos órgãos em contratos de prestação de serviços. O entendimento de Nardes é compartilhado por boa parte dos ministros do TCU. Para tentar reverter esse cenário, o governo mobilizou ministros e até o vice-presidente Michel Temer. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, chegou a ir pessoalmente ao gabinete do relator Augusto Nardes a fim de demovê-lo da ideia de pedir a desaprovação das contas de Dilma. Na conversa, Levy argumentou que a decisão desfavorável à presidente poderia comprometer o processo de reequilíbrio das contas públicas.

Mais de R$ 40 bilhões foram usados no ano passado
para maquiar a contabilidade fiscal do governo

Uma parecer pela reprovação das contas de Dilma, se confirmado pelo pleno da corte, será um feito inédito na história do tribunal e terá de ser submetido ao Congresso Nacional. O descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal prevê punição ao gestor público por crime de responsabilidade. A abertura de processo criminal contra Dilma, porém, depende do Ministério Público Federal. No fim de maio, partidos de oposição entraram na Procuradoria-Geral da República com uma ação de crime comum contra a presidente. A decisão do TCU pode pressionar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a oferecer denúncia ao STF. Caso isso ocorra e a Câmara autorize a abertura da ação penal contra a presidente, Dilma seria afastada do cargo por até 180 dias.

Fotos: André Coelho/Ag. o Globo; ROBERTO CASTRO