Na noite da quarta-feira 22, depois de um atraso que se arrastou por cinco meses, a Petrobras começou a sair do fundo do poço. À luz fria dos números, o balanço divulgado pelo novo presidente da estatal, Aldemir Bendini, é uma tragédia. Pela primeira vez desde 1991, a companhia fechou o ano com prejuízo. As perdas totalizaram R$ 21,6 bilhões, a dívida dobrou de tamanho, para R$ 282,1 bilhões, e a corrupção tomou R$ 6,2 bilhões dos cofres da petrolífera. Este último dado é assombroso. Significa que os malfeitores investigados pela operação Lava Jato surrupiaram uma Natura inteira (uma das maiores empresas de cosméticos do Brasil) da Petrobras. Tudo isso seria motivo para preocupação, mas o que se viu depois da divulgação dos resultados foi exatamente o contrário.

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A FESTA ACABOU
O presidente Bendine: para evitar a sangria do caixa, ele
não pagará dividendos aos acionistas

Muitos analistas argumentaram que a lisura na apresentação de indicadores tão desfavoráveis conta pontos a favor de uma empresa manchada por uma série de denúncias. Não dava mais para esconder a sujeira. Não era mais possível ignorar os estragos causados pelo pagamento indiscriminado de propinas em troca de contratos bilionários. No Exterior, a repercussão foi positiva. Para o americano The Wall Street Journal, a Petrobras “finalmente colocou uma etiqueta de preço no escândalo de corrupção.” Segundo o The New York Times, o balanço foi o primeiro passo para a conquista da confiança dos investidores.

Para uma gigante com ações negociadas em bolsas de valores, que precisa de crédito internacional para realizar investimentos e que enfrenta uma onda de escândalos sem precedente, reconstruir a credibilidade pode ser tão vital quanto encontrar uma nova jazida de petróleo. “Ao apresentarmos os dados estamos dando um passo fundamental em direção ao pleno resgate da Petrobras junto aos seus acionistas, fornecedores e mercados”, disse Bendine, que assumiu a empresa há dois meses, no calor das investigações da Lava Jato. Bendine foi sincero durante o anúncio do balanço. O executivo disse sentir vergonha pelas atividades irregulares praticadas por executivos que hoje estão na cadeia, pediu desculpas aos brasileiros e comparou a situação a um “desastre de avião.” Se o desastre deixou marcas profundas, a boa notícia é que a correção de rumo já começou.

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Para evitar novas sangrias financeiras, a Petrobras anunciou a suspensão do pagamento de dividendos para os acionistas, o que não ocorria desde 1992. A medida é tão dura quanto necessária. “Isso é o que deve ser feito”, diz Sérgio Lazzarini professor de estratégia do Insper. “Seria pior forçar o pagamento de dividendos num momento em que a empresa opera com prejuízo.” O próximo desafio, gigantesco por sinal, é reduzir o endividamento. A empresa planeja vender ativos, o que deve ser feito ao longo de 2015, e pode voltar a emitir títulos da dívida no mercado brasileiro, o que não acontece desde 2000.

Para quitar todos os seus débitos e ter finanças consideradas saudáveis, a Petrobras precisaria hoje de 4,77 anos. No setor petrolífero, o patamar ideal é 2,5 anos. Para efeito de comparação, a americana Exxon Mobil levaria apenas 0,48 ano para não dever mais nada no mercado. Nem só de tragédias vive a maior empresa brasileira. As previsões mostram, para o futuro próximo, o aumento da cotação do barril de petróleo. “As expectativas do mercado são para que o preço do barril volte para a casa dos US$ 90”, diz o economista Arthur Ordones, especialista em gestão de riscos. Hoje, o valor está em torno de US$ 64. “A Petrobras terá de aproveitar isso.”

Foto: PEDRO DIAS