Uma reserva ecológica de 90 mil hectares, localizada na margem direita do rio Araguaia, no canto sudeste da Amazônia, canto oeste do Tocantins e canto norte da ilha do Bananal, só poderia mesmo se chamar Cantão. Ali se misturam pinceladas de floresta tropical, cerrado e pantanal. Transformado em Parque Estadual no ano passado, esse trecho de mata nativa é um prato cheio para quem busca tranquilidade e paisagens estonteantes longe do caos urbano. Entre dezembro e março, chuvas castigam a região e fazem o rio Araguaia avançar sobre o parque, que fica totalmente inundado. No período do estio, entre junho e setembro, as águas retornam ao leito e até oitocentos lagos aparecem. Bancos de areia surgem em toda a extensão do rio, formando praias fluviais paradisíacas, e com elas o vai e vem das tartarugas, que correm para enterrar seus ovos. Um espetáculo para qualquer turista. Ali mesmo na área de proteção ambiental acaba de ser inaugurado o primeiro hotel de selva do Cantão, a Pousada do Araguaia. É apenas o início de uma campanha do governo do Estado para atrair visitantes e transformar o local em um dos maiores destinos de ecoturismo no Brasil.

Projetos não faltam. Até o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) voltou seus olhos para o parque. Ele é o financiador de um trabalho de avaliação ambiental, desenvolvido em parceria com a Empresa Brasileira de Turismo (Embratur) e o Ministério do Meio Ambiente, que busca garantir a abertura da área de forma segura. “Antes de escancarar o Cantão para o turismo, é preciso conhecer o local e trazer infra-estrutura sem colocá-lo em risco. De preferência, criando empregos para os habitantes da região”, diz Jens Cristiano Ruschmann, diretor da Ruschmann Consultoria, responsável pela avaliação do parque. A Pousada do Araguaia parece estar no caminho certo. Além de utilizar os serviços de barqueiros de Caseara – cidade mais próxima, a 60 quilômetros de barco –, o hotel instalou um biodigestor importado de Israel para recolher todo o esgoto e devolver água limpa ao rio. A engenhoca consumiu parte do investimento de 600 mil reais, feito pela empresária e economista Nara Rela para garantir aos 13 apartamentos a classificação três estrelas. Pacotes de quatro dias na pousada são oferecidos por operadoras como a Ambiental Expedições, de São Paulo. É só estar disposto a tomar um avião até Palmas, encarar quatro horas de estrada até Caseara e enfrentar duas horas de barco para atracar no cais do hotel. Daí em diante, os mais animados podem percorrer as trilhas que levam a lagos no meio da floresta – tarefa fácil em uma região plana – ou optar por uma boa pescaria esportiva. No Araguaia, considerado um dos rios mais piscosos do mundo, a captura de peixes como o tucunaré e o pacu é restrita a 20 quilos por pessoa e proibida para o comércio. O uso de rede é considerado crime, assim como todo tipo de pesca entre outubro e dezembro, época da piracema (reprodução). Para os adeptos da lei do menor esforço, descansar em uma rede pode ser a grande tacada.

Até o começo deste ano, os chalés – construídos em 1996 pelo governo do Estado – destinavam-se à fiscalização do parque e recebiam visitas oficiais de investidores estrangeiros e políticos. Em janeiro, o governador Siqueira Campos escolheu Nara Rela, dona da mais tradicional agência de viagens de Palmas, para assinar um contrato de cessão de uso por dez anos. E fez mais: nomeou a felizarda secretária estadual de Turismo. “Quero que venham hotéis para cá. Mas que sejam empreendimentos de qualidade”, diz Nara.

Empreendedores e interessados em conhecer o Cantão não devem demorar. O parque acabou de ser inaugurado e já se vislumbram períodos de vacas magras. Uma hidrovia está sendo instalada nos rios Araguaia e Tocantins e deve provocar alterações no cenário. Parte das praias do Cantão desaparecerão quando começarem as obras de drenagem e aprofundamento do leito, indispensáveis para o fluxo de embarcações de grande porte. Por enquanto, apenas canoas e voadeiras percorrem a região.