Ansiedade, inquietação e deslumbramento. Esses sentimentos se misturavam na mente da família do piauiense José Adão, 40 anos. Faltavam 50 minutos para a meia noite da quinta-feira 25 quando ele, ao lado da esposa Analete, 35, da sogra Eufrásia, 60, do filho Diego José, 2, e da sobrinha Sabrina, 5, entrava na sala de embarque do aeroporto internacional de São Paulo. Dali partiria o vôo 9452 com destino a Petrolina, em Pernambuco, e escala em Juazeiro do Norte, no Ceará. O primeiro da vida de seu José e de quase todos os outros 114 passageiros embarcados no 737-300 da Varig, fretado pela Rotatur/Brasil Rodo-Aéreo, a BRA. A companhia foi uma das primeiras a tornar acessível um sonho tido como impossível pela grande maioria da população brasileira: voar. Ao lado da BRA viajam, entre outras, as novíssimas Gol e Nacional e as velhas concorrentes Fly e Passaredo. Ao vender passagens mais baratas, essas companhias estão encolhendo o Brasil. Transformam viagens que antes duravam três dias em passeios com menos de quatro horas de duração.

Promessa – Quem está acostumado a viajar de avião verá cada vez mais nos aeroportos famílias como a de seu José. Ela é o estereótipo do novo público procurado pelas companhias “populares”. A viagem a São Paulo teve um significado especial. A esposa de seu José, Analete, veio pagar uma promessa. Foi a Aparecida do Norte agradecer à Nossa Senhora pela cura da trombose que quase a levou desse mundo. O comerciante piauiense gostaria de ter vindo para a capital paulista de avião. Mas, quando informado pela BRA do limite de 20 quilos de bagagem por pessoa, desistiu e veio de ônibus. Também pudera. Ele trouxe queijo de coalho, bolo de mel, manteiga de garrafa, galinha caipira, linguiça de porco, ovo e carne de capote – traduzindo, galinha-d’angola. Todos presentes para o cunhado João Batista e a irmã Salete. Sabedora da generosidade do nordestino, a BRA impôs o limite para coibir excessos. Para cada quilo acima da norma, o passageiro paga R$ 3.

Agrado feito, chegou a hora de realizar o sonho de voar. A ocasião exigia um traje especial. E a família de seu José não fez feio. A começar por dona Eufrásia. Ela fez questão de comprar roupa nova. Afinal, “no avião só pode andar bonita”, afirmava com convicção a simpática senhora a bordo de um vestido verde novinho, novinho. À meia-noite e 45, a moça do balcão faz a chamada para o embarque. Chegara a hora de entrar naquela máquina tão desconhecida quanto um disco voador. A emoção do momento recompensava cada centavo dos R$ 270 pagos pela passagem dos três adultos. As das crianças custaram R$ 205. Seu José viu muitos acidentes aéreos pela tevê. Mas não era hora de pensar nisso. Desejava que o avião decolasse logo. “É para perder o medo de vez.” À 1h15 da manhã, com 76 minutos de atraso, o 737-300 levanta vôo. O ronco forte e o empuxo da decolagem impressionam. A primeira hora de vôo é tranquila. A calmaria é quebrada pelo serviço de bordo. No cardápio, refrigerante, água, suco de laranja, cerveja e um sanduíche de salame com queijo. De sobremesa, melão e mamão. Nada de massas, carnes e bebidas como uísque e vinho, itens comuns nas refeições das companhias grandes. Cobertores e travesseiros também foram abolidos. Esse é um dos segredos do baixo preço das passagens.