Combater a ameaça das mudanças climáticas é o desafio coletivo mais complexo que a humanidade já enfrentou. O êxito requer ações custosas e coordenadas entre vários países, para lidar com uma ameaça distante, em nome de pessoas que ainda não nasceram, sob uma névoa de inevitáveis incertezas sobre o custo de não agir. Não é à toa que tantos ignoram o esforço.

O ex-deputado Aldo Rebelo (PCdoB), novo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, não ignora. Ele é contra mesmo. Rebelo acredita que as evidências de aquecimento global supostamente derivadas da queima de combustíveis fósseis pela civilização industrial são “fraudes ou manipulações tecidas a serviço de interesses dos países que financiam determinadas pesquisas”, como escreveu numa carta recente ao ex-deputado Márcio Santilli. Segundo o ministro, as causas antropogênicas (geradas pelo homem) do aquecimento global são uma “doutrina de fé” baseada num “cientificismo positivista”, cujo real propósito é “controlar os padrões de consumo dos países pobres” para “melhor remunerar a agricultura dos países ricos”. Já o “movimento ambientalista internacional” não passa de “uma cabeça de ponte do imperialismo”. O que o ministro comunista pensa sobre ecologia e mudança climática é muito similar ao que a extrema-direita do Tea Party prega nos Estados Unidos, ou ao que imaginava, em 1989, o general Rubens Bayma Denys, chefe da Casa Militar no governo Sarney, sobre as pressões contra as queimadas na Amazônia. A propósito, o ministro Rebelo afirma que “nenhum país do mundo preservou suas matas como o Brasil”, ressalta que “mantivemos em pé 69,4% de nossas florestas primitivas” e atribui esse êxito à continuidade histórica da antevisão patriótica de José Bonifácio de Andrada e Silva, “o idealizador da reserva legal”.

Coitado do Patriarca da Independência. José Bonifácio tentou impedir a destruição da Mata Atlântica, mas não conseguiu. Restam 7% dela. A única razão de o Brasil chegar ao século XXI como uma grande nação florestal, com “apenas” 30% de perdas (na conta do ministro), é que temos muitas florestas e a expansão da fronteira econômica interna ainda não chegou a todas elas. Mas estamos a caminho! De 1971 em diante detonamos 20% da Floresta Amazônica num frenesi de queimadas. Felizmente, nos últimos anos as taxas de desmatamento caíram, a ponto de a Indonésia ter passado à nossa frente no inglório campeonato do desenvolvimento desastrado. Mas não paramos de queimar, como se sabe. Longe disso. O ministro responsável pela ciência rejeita a busca de alternativas e o esforço científico para mitigar as mudanças climáticas, apesar da aflição crescente com verões escaldantes e de uma falta de água “jamais vista neste país”. Relator da nova lei do Código Florestal e defensor do nacionalismo (apesar de comunista), Rebelo já propôs banir inovações tecnológicas em órgãos públicos que economizassem mão de obra, proibir estrangeirismos no português brasileiro, adicionar mandioca ao pãozinho francês, dublar todos os filmes de tevê estrangeiros e converter o Halloween em Dia Nacional do Saci-Pererê. Esse é o líder para atualizar a indústria com a tecnologia? Para corrigir os graves problemas de baixa competitividade da economia?

Curiosamente, com a mesma retórica que critica o ambientalismo como “trapaça do neoliberalismo”, o ministro declara-se “devoto do materialismo dialético” e cita o livro mais inconsistente e dogmático de Friedrich Engels, “Dialética da Natureza”, para expressar seu entusiasmo pelo engenho humano transformador do ambiente. Ocorre que a dialética é apenas uma moldura conceitual criada por um filósofo. Só um devoto beato da fé marxista poderia atribuir-lhe a capacidade de decifrar as leis do universo. Como inovação, essa é, precisamente, a trapaça do comunismo.

Ricardo Arnt é diretor da revista Planeta