Se você ainda não ouviu as letras nem dançou a música… está por fora da moda. O funk carioca assaltou a folia e comanda a festa neste Carnaval. O “batidão” hipnótico das comunidades carentes do Rio, acompanhado de canções rudimentares e coreografias ginecológicas, espalhou-se pelo Brasil. Seus MCs (mestres-de-cerimônias) estão por toda parte, com bonés e bermudões (os homens) ou calça justa de cintura baixa e microtop (as mulheres) – programas de rádio e de tevê, boates, shows, CDs lançados por grandes gravadoras e CDs piratas vendidos a R$1 nos camelôs. A Bahia também se rendeu. Lançou o funk com dendê, na versão axé e cheia de percussão. Várias bandas, como Cheiro de Amor e Pimenta Nativa, acrescentaram um pot-pourri funk no repertório. Ivete Sangalo e até Daniela Mercury vão cantar e tocar o balanço que veio dos morros do Rio. Com uma média de três shows por noite e autor de alguns dos hits da temporada, como Cerol na mão, o grupo Bonde do Tigrão, da favela Cidade de Deus, na zona oeste do Rio, sobe nos trios elétricos de Salvador nos quatro dias de festa. Para desgosto de puristas e conservadores, “tá tudo dominado”.

Alex Soletto

Desde o início do ano, Fortaleza e Salvador têm lambaeróbicas ao ar livre ao som dos hits eletrônicos. Há duas semanas, o ritmo estourou em São Paulo. No domingo 18, o Bonde do Tigrão reuniu na matinê da casa de espetáculos Fábrica 5, na Mooca, cerca de cinco mil adolescentes. Os hits eram repetidos à exaustão por falta de opção mesmo. A coreografia também não variava – flexões de braço que simulam penetrações, bumbuns e ancas tremelicando, braços agitando-se para frente e para trás na altura das quadris. Mas a garotada gritava, queria tocar pelo menos o sapato do trio sem nenhuma pinta de galã. Inevitável também foi o passa-mão entre jovens nem um pouco comportados. “A música é dinâmica. Acariciar os meninos faz parte”, disse Andréia Pena, 16 anos. Comovido, o vocalista Leandrinho agradecia a Deus pelo sucesso. “O caminho agora é trabalhar a imagem e ter humildade”, planeja o rapaz, ex-empacotador de supermercado.

Aracaju também se curvou ao ritmo. Numa das maiores prévias carnavalescas da região, o Pré-caju, no segundo fim semana do mês, a batida reinante foram os sons estourados do funk. Estava lá a nata do axé. Chiclete com Banana, Asa de Águia, Araketu, Netinho e Ivete Sangalo embarcaram sem pudores no som dos garotos sangue-bom (amigos, do bem).

Manoel Ferreira
Em Aracaju, o bloco Tricolor ensaia coreografia

Eróticas – Passageiras ou não, as letras fáceis – eróticas como suas coreografias –, pobres de rima, de conteúdo e de português, caíram no gosto dos brasileiros. Gustavo Kuerten e Alexandre Simoni festejaram a classificação nas quartas-de-final da Copa Davis encostando os respectivos bumbuns – como manda a coreografia – diante das câmeras. As torcidas dos times cariocas animam os estádios com o refrão do Bonde do Tigrão: Quer jogar, quer jogar, o Mengão ou Vascão ou Fogão vai te ensinar. A exemplo do Axé, o samba adere ao ritmo. A escola de samba Acadêmicos do Salgueiro abriu sua quadra na Tijuca, zona norte da cidade, para dois concorridos bailes funk semanais. “O funk é moda. Mas os ensaios da escola de samba continuam lotados”, diz o presidente do Salgueiro, Luiz Augusto Duran. Mesmo assim, na sexta-feira de Carnaval, a escola abre as portas para um grande baile funk.