Saber o que se passa na cabeça das mulheres sempre foi a interrogação preferida dos homens. Neste campo, Nick Marshall, o quarentão charmoso e machista vivido por Mel Gibson em Do que as mulheres gostam (What women want, Estados Unidos, 2000), cartaz nacional na sexta-feira 9, pode ser considerado um privilegiado. Ele literalmente consegue ouvir o pensamento de qualquer garota, habilidade adquirida após receber um choque elétrico numa noite de bebedeira. A princípio, Marshall — um premiado diretor de arte de uma grande agência publicitária de Chicago — se irrita diante da cacofonia das preocupações com dietas e tratamentos de beleza que saem das mentes femininas. Depois, começa a filtrar as “ondas sonoras” e usá-las em proveito próprio. O problema é quando escuta aqueles pensamentos que geralmente a namorada, a faxineira ou as amigas de trabalho não são capazes de declarar.

Em sua primeira comédia inteiramente romântica em 23 anos de carreira, Mel Gibson aproveitou o clima de guerra de sexos da trama para ampliar o repertório de piadas chauvinistas da série Máquina mortífera. Seu Nick Marshall é aquele tipo de homem que chega no trabalho e dá bom-dia para a secretária com a pergunta: “Sabe qual a diferença entre uma mulher e o emprego?” A resposta vem acompanhada de um sorriso matreiro: “Depois de dez anos, o trabalho ainda te suga.” Publicitário à moda antiga, ele acredita que para vender um produto basta colocá-lo nas mãos de uma sueca sorridente, metida num biquíni em ambiente colorido. Tal crença começa a ser abalada quando o diretor da empresa, Dan Wanamaker (Alan Alda), contrata para a chefia a loira Darcy Maguire (Helen Hunt). Durona, a publicitária logo passa o primeiro dever de casa ao vaidoso subordinado, que deve imaginar anúncios de esmalte, sutiã, sais de banho e depilador.

Marshall descobre não saber muito bem do que as mulheres gostam e, no auge do desespero, leva o tal choque elétrico. Diferentemente dele, Hollywood não tem a menor dúvida quanto ao gosto feminino. As mulheres adoram Mel Gibson, 45 anos, um modelo de homem conservador, bem-humorado, pai de sete filhos e casado há mais de 20 anos com a mesma mulher. Dono de um cachê de US$ 25 milhões, neste filme o astro se dá ao luxo de se travestir em cena e protagonizar um número musical com chapéu e bengala, dançando como Fred Astaire ao som de I won’t dance, sucesso de Frank Sinatra. Não se sai mal. Para maior deleite das fãs, ainda aparece nu, mostrando uma barriguinha proeminente, e falando a piada apropriada: “Homens gostam de se olhar no espelho porque sempre acham que aquilo fica maior.” Com este tipo de investida, o filme dirigido por Nancy Meyers já fez US$ 180 milhões de bilheteria desde sua estréia nos Estados Unidos em dezembro passado.

Do que as mulheres gostam tinha tudo para reeditar as qualidades das fitas americanas do passado. Não é o que acontece. Suas 2h06 são cansativas, têm cenas dispensáveis, como a que Marshall leva a filha para comprar o vestido do baile de formatura ou a sequência na qual ele dá uma de boa alma e demove uma funcionária da sua tentativa de suicídio. Além do mais, o personagem não se desenvolve. Fica só no esquemático, reduzido a uma soma de piadas e gracinhas machistas. Elas caem bem em Mel Gibson, mas são logo esquecidas na primeira esquina.


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