Depois de sair da disputa presidencial com 51,3 milhões de votos, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) voltou a Brasília na última semana dando mostras de que efetivamente está politicamente muito maior do que quando deu início à campanha eleitoral. Ao contrário dos tucanos derrotados nas urnas pelo PT em 2002, 2006 e 2010, Aécio retorna ao cenário político trazendo consigo um partido unificado, uma bancada parlamentar mais forte e experiente do que as anteriores e desde que desembarcou no Aeroporto Juscelino Kubitschek, na terça-feira 4, deixou claro como pretende liderar uma oposição que o PT jamais enfrentou desde que chegou ao poder em janeiro de 2003. “Quando o governo olhar para a oposição, sugiro que não contabilize mais o número de cadeiras, de assentos no Senado ou na Câmara. Olhe bem, pois o que vai encontrar são mais de 50 milhões de brasileiros vigilantes”, disse o senador. O recado é muito claro: Aécio pretende manter a oposição unida e aglutinar em torno de si o desejo de mudança manifestado pelas urnas. Para tanto, o tucano já vem formando o que no PSDB tem sido tratado como “Grupo de Trabalho Técnico (GTT)”, uma espécie de governo paralelo que irá acompanhar cada passo dado pela gestão de Dilma Rousseff. A proposta é a de não dar trégua ao governo. “Vamos fiscalizar todas as ações do governo, cobrar que as promessas de campanha sejam cumpridas e denunciar todas as formas de corrupção”, afirmou o senador.

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UNIDADE
Na volta ao Senado, Aécio é recebido como o representante
de mais de 50 milhões de brasileiros

Aécio foi recebido como o líder ungido pelas urnas. Discursou para militantes, discursou para correligionários e discursou para parlamentares que intentam trocar a base governista pela frente da oposição. Em todas as falas, o novo comandante da oposição frisou a importância de os representantes do PSDB, DEM, PPS, PSC e dissidentes do PMDB agirem como maioria, apesar da diferença numérica das cadeiras controladas pelos adversários do governo. Tradicionalmente derrotada pelo governo nos plenários do Congresso, a nova oposição promete fazer o enfrentamento fora da pauta de votações. “Nós somos iguais na sociedade, no Congresso ainda não”, resumiu o deputado e presidente do PPS, Roberto Freire (SP). A nova oposição proposta por Aécio passa pela formação de um núcleo de dados. Hoje, quando um parlamentar precisa citar fontes para apontar indício de má gestão nos governos, a autoridade recorre a informações da imprensa. O objetivo de Aécio é inverter a cadeia. O acompanhamento do exercício do poder será feito pelo GTT. As apurações, checagem de dados e análises críticas partirão da oposição para a sociedade civil e não o contrário. Em um primeiro momento, os índices econômicos e a atuação dos institutos governamentais responsáveis por divulgar dados oficiais do Estado serão o foco. Aécio fez duras críticas ao que chamou de “maquiagem” das contas públicas e à intervenção política na agenda de divulgação de resultados de políticas sociais. “O Brasil escondido pelo governo na campanha eleitoral está se revelando a cada dia. A presidente insistiu em negar o problema evidente da alta de preços, da carestia. Apenas três dias após as eleições o Banco Central elevou os juros. O governo escondeu o rombo das contas públicas brasileiras. Escondeu reiteradamente que havia a urgente necessidade de ajustes. Pois bem, a presidente já está fazendo o que disse que não faria: na próxima semana, teremos o aumento da gasolina e já nesta semana as tarifas de energia sofrerão reajustes que simplesmente anulam toda a redução obtida com a truculenta intervenção havida no setor elétrico nos últimos dois anos”, discursou. A aplicação de recursos, execução orçamentária e denúncias de aparelhamento partidário de estruturas do Estado receberão atenção especial do GTT.

Oposição sem adjetivos, foi assim definida a frente liderada pelo PSDB. Nos bastidores, o DEM ainda enfrenta problemas internos. Não decidiu se vai continuar a luta com os 22 deputados eleitos ou opta pela fusão com partidos nanicos que têm outros 24 parlamentares, embora já tenha definido de que lado estará. Enquanto o principal parceiro define seus rumos, o PSDB busca novos aliados. O PP do vice-governador eleito do Rio de Janeiro, senador Francisco Dornelles, está sendo assediado. Rebeldes do PMDB também. Aos que correm para aderir a essa nova oposição, Aécio também deu um recado. “Eu não sou golpista, sou filho da Democracia”, disse o senador, assegurando que está disposto a ganhar o jogo com as regras vigentes.

“Sou filho da democracia. Estarei vigilante para que qualquer
tentativa de cerceamento das liberdades seja contida”

Além da trincheira no Congresso, Aécio reservará parte de sua agenda para correr os rincões do Norte e do Nordeste. De acordo com o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio, as cidades em que o governo teve maior votação serão as primeiras a serem escolhidas pelo tucano. O périplo terá início ainda em 2015. “Nossa estratégia para retomar a oposição será usar a combatividade com racionalidade. É preciso mostrar ao povo que o Estado brasileiro está a serviço de um partido, as políticas públicas se transformaram em armas eleitorais. Nós temos agora o que faltava ao nosso partido, um líder”, afirma Virgílio.

Aécio demonstrou contentamento com a fase de celebridade, no entanto, ponderou que a excessiva personalização não é boa para o partido. “Meu avô dizia, voto você não tem, você teve.” Assim como no modelo britânico de oposição, o que faz o sucesso dos adversários não é a força política individual. O GTT será composto por um grupo de notáveis. Aécio tem o desafio de reunir o partido em torno de um longo projeto de quatro anos. Nomes como os do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e dos senadores eleitos José Serra e Tasso Jereissati são imprescindíveis para o sucesso da estratégia. Por isso, ele tem sido comedido ao falar sobre o status de líder, adquirido pelas urnas. “A oposição não precisa de um líder, ela tem na alma dos brasileiros sua essência. Tão importante como o governo é a oposição. Minha candidatura, com o tempo, se transformou em um movimento.” Ampliar o alcance do discurso do PSDB para o agrupamento que prega o voto anti-PT é o objetivo de Aécio e aliados. E eles pensam grande e sonham em ganhar uma boa parcela do PMDB como aliada. Por ironia, o PSDB pretende ser para o atual governo o doloroso calo que o PT sempre soube ser durante as administrações tucanas.

“Estamos atentos e vigiando”

Recebido com festa no Congresso, Aécio Neves deixou evidente que nos próximos quatro anos o PT enfrentará uma oposição bem diferente da que vem tendo desde 2003. Na quarta-feira 5, o senador tucano revelou os princípios dessa nova oposição

Em entrevista à ISTOÉ na quarta-feira 5, Aécio Neves detalhou como pretende mudar a cara da oposição no Congresso. A intenção é não dar trégua ao PT.

ISTOÉ – Como funcionará a “nova oposição”?
Aécio –
Vamos cobrar eficiência da gestão pública, transparência dos gastos e que as denúncias de corrupção sejam apuradas e investigadas em profundidade. Vamos qualificar nossa oposição, estamos criando um grupo de trabalho técnico para acompanhar as ações do governo e municiar a oposição. Estamos atentos, acordados e vigiando.

ISTOÉ – A oposição se recusará a dialogar com o governo?
Aécio –
O governo tem que apresentar suas propostas em torno dos interesses dos brasileiros. Em torno dessas propostas, todos devem estar prontos para debatê-las. Por exemplo, qual é a reforma política que esse governo pretende aprovar ou discutir? De que forma nós vamos superar a gravidade da nossa crise econômica, a credibilidade do País? De novo com maquiagem fiscal? De que forma nós vamos permitir que nossos indicadores sociais melhorem?

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ISTOÉ – Qual é a opinião do senhor sobre as manifestações pedindo o impeachment da presidente e a volta de um governo militar?
Aécio –
Isso é uma apropriação indevida de um sentimento de liberdade da sociedade brasileira. Eu não sou golpista, sou filho da democracia. Vou estar aqui no Congresso vigilante para que qualquer tentativa de cerceamento das liberdades, sejam coletivas ou individuais, ou da liberdade de imprensa seja contida.

ISTOÉ – O pedido de auditoria na contagem de votos ­demonstra desconfiança do partido no resultado das eleições?
Aécio –
Foi uma decisão do departamento jurídico da coligação. É um direito de qualquer parte envolvida no processo eleitoral conhecer os processos da apuração. Nós não estamos querendo mudar o resultado da eleição, ter acesso ao processo de totalização tem que ser recebido como algo adequado. Eu não tenho dúvidas em relação à lisura dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral. É legítimo, se fosse o inverso, seria aceito também.