Timothy J. McVeigh morreu de olhos bem abertos, mas inconsciente. Sem consciência do seu último suspiro ou da futilidade e do barbarismo de seus atos. É possível imaginar que tenha sido um final semelhante ao do soldado iraquiano que ele matou, durante a Guerra do Golfo (1991), com um tiro de fuzil, a uma distância de quase uma milha. Aquele infeliz nem soube o que o atingiu. De qualquer modo, McVeigh teve morte mais suave do que o de suas outras 168 vítimas. Estas foram dilaceradas, esmagadas e queimadas, quando o caminhão amarelo contendo três toneladas e meia de explosivos caseiros detonou, demolindo o edifício público Alfred P. Murrah, em Oklahoma City, em 19 de abril de 1995. Aquele seria o pior atentado terrorista cometido em território americano. E, por isso, Tim McVeigh, 33 anos, foi executado, às 7h14 de segunda-feira 11, numa sala da penitenciária federal de Terre Haute, no Estado de Indiana. O trauma provocado pelo atentado foi revivido em muitas partes do país, com manifestações contra e a favor da pena capital.

O presidente George W. Bush declarou que a execução poderia fechar uma das páginas mais infames da história do país e terminar com a angústia de sobreviventes e parentes das vítimas. Mas, como lembrou Paul Howell, 64 anos, pai de Karen Shepherd, que morreu aos 27 anos, mutilada na explosão: “Não se encerra uma tragédia como esta.” Nem sequer conseguiram fechar os olhos do condenado. E este seria o último dos muitos dúbios prodígios da vida de McVeigh. O homem que matou 168 inocentes – entre eles 19 crianças de jardim de infância – deveria ter morrido dormindo. A injeção intravenosa em sua perna descarregou três substâncias químicas utilizadas neste tipo de execução. A primeira carga levava um sedativo que supostamente provocaria o sono. A seguir viriam os paralisantes das funções pulmonares e cardíacas. Assim, na morte, os olhos arregalados, “encarando” as dez testemunhas, escolhidas entre sobreviventes e parentes, não estavam no programa. Ao mesmo tempo que isso ocorria, era conferida outra distinção a McVeigh: a de ser o primeiro prisioneiro federal executado desde 1963. Uma ironia do destino, talvez, já que isso ocorre durante a Presidência de George W. Bush, que quando era governador do Texas levou a pena de morte a paroxismos, assinando 152 execuções em menos de oito anos, tanto que ficou conhecido como “governador da morte”. Dos 50 Estados americanos, apenas 13 não prevêem a pena de morte. E o apoio popular à pena de morte vem caindo: há cinco anos, 77% dos americanos eram favoráveis a ela; hoje, segundo uma pesquisa da ABC News, esse número caiu para 63%.

Críticas na Europa – O sentimento de rejeição à pena capital foi claramente expresso pela União Européia, que unanimemente condenou a execução e a manutenção da pena de morte nos Estados Unidos. Para constrangimento do presidente americano, que embarcou em sua primeira peregrinação à Europa um dia depois de McVeigh ter sido cremado e suas cinzas espalhadas em local não revelado. A efígie de Bush também seria incinerada por manifestantes nas cidades européias por onde ele passou. Igualmente chamuscada ficaria a auto-imagem americana de campeões dos direitos individuais. Ponto póstumo para McVeigh, que justificou sua violência como ato de guerra contra o “governo totalitário” de seu país.

O pavio da bomba que destruiu o prédio Alfred P. Murrah começou a queimar depois do episódio do desastrado cerco e queima da sede da seita Ramo Davidiano, em Waco, Texas, em 1994. Depois de meses de impasse, agentes federais investiram contra o quartel-general do líder messiânico David Koresh. A versão oficial diz que os fanáticos davidianos – entre eles várias crianças – foram assassinados ou cometeram suicídio depois de atear fogo ao prédio. De acordo com as teorias conspiratórias de opositores do governo, foi o FBI que provocou o incêndio, matando a todos. Tim McVeigh fez uma visita ao local, que virou centro de peregrinação. Ali começou a planejar o ataque. A leitura de livros de extremistas de direita, como a obra racista Os diários Turner, ajudou a estruturar o atentado. Até a fórmula da bomba, cujos ingredientes caseiros têm como base um adubo químico, foi extraída desta literatura. Com a ajuda do ex-colega de Exército Terry Nichols (condenado depois à prisão perpétua), McVeigh burilou a logística da ação, programada para coincidir com o aniversário da queda de Koresh: o dia 19 de abril.

Trapalhadas do FBI – A incompetência do FBI acompanhou os passos de McVeigh mesmo depois do atentado. O terrorista foi detido por um patrulheiro rodoviário de Oklahoma, que o parou por causa de irregularidade no licenciamento do carro usado para a fuga. O guarda notou que o motorista estava armado e o levou preso. Através de um retrato falado montado com base em testemunhos, o mesmo policial reconheceu McVeigh. Depois da condenação, a poucos dias da data para a execução, algumas destas mesmas testemunhas ouvidas apareceriam para dar sobrevida ao criminoso. O FBI foi obrigado a revelar que não havia colocado à disposição da equipe de advogados de defesa cerca de quatro mil páginas de documentos da investigação. Foi o suficiente para que o Departamento de Justiça adiasse a descarga de injeções letais. A revelação de todos os detalhes da investigação, da promotoria para a defesa, é um procedimento padrão na Justiça do país. A gafe colocou mais lenha na fogueira da paranóia dos conspiracionistas e confirmou a inaptidão do FBI. Um juiz da 10ª Corte de Apelações acabaria com a agonia, determinando que os documentos não eram relevantes. Afinal, o próprio sentenciado já havia confessado seu crime em entrevistas a jornalistas. McVeigh pediu a seus advogados que não apelassem da decisão na Suprema Corte. A hora do carrasco foi marcada.

A atitude de resignação diante da morte fazia parte da estratégia do terrorista. McVeigh se considerava um “soldado” em guerra contra o governo. Em entrevistas a um jornal de Buffalo, ele se referiu às mortes das 19 crianças que estavam na creche do Alfred P. Murrah como “danos colaterais”. No placar imaginário que mantinha em sua mente, mesmo depois de executado ele seria vitorioso: “São 168 contra 1. O governo perdeu o jogo”, disse. McVeigh desejava ser elevado ao patamar de mártir. Morreu crucificado numa mesa deixando o poema Invictus, de William Ernest, como últimas palavras. Um dos trechos diz: “Sou o mestre de minha sina/O capitão de minha alma.” Passará à História apenas como um assassino. O oposto do que ocorreu com um personagem célebre crucificado aos 33 anos, cujas palavras finais foram: “Pai, perdoai-os, eles não sabem o que fazem.”  

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