O presidente Fernando Henrique Cardoso teve de passar os últimos dias às voltas com fantasmas. O depoimento do ex-agente Célio Arêas da Rocha à Justiça fez com que os grampos no BNDES voltassem a assombrar o Planalto. Além de acusar o funcionário da Agência Brasileira de Informações (Abin) Temílson Resende, o Telmo, de tê-lo convidado a participar das gravações clandestinas, feitas três semanas antes da venda das teles, Rocha revelou o conteúdo explosivo de outras fitas. As informações seriam usadas pela arapongagem como garantia de que as investigações não dariam em nada, num jogo em que a chantagem é a carta principal. Um mês antes do depoimento, em meados de agosto, Célio informou ao chefe da Casa Militar da Presidência, general Alberto Cardoso, alguns trunfos dos chantagistas. “Ele (Célio) ouviu de Telmo e outras pessoas que uma fita continha a conversa de um relacionamento amoroso entre FHC e a atriz Maitê Proença”, conta o advogado do ex-agente, Nélio Andrade, que estava na reunião de Brasília.

Empenhado em minimizar os estragos que a revelação poderia causar, o general se explicou. “Ele (Célio) disse que pode ter coisas da vida pessoal do presidente nessa fita, porque estão cobrando caro por ela”, comentou, referindo-se ao preço de R$ 1 milhão pelo qual a gravação estaria sendo comercia-lizada. “Isso eu não sei e nem é relevante. O presidente é insuspeito.” A atriz Maitê Proença, 40 anos – às voltas com as gravações da próxima novela global –, demonstra tranquilidade. “Não consigo nem imaginar uma suposição dessas. Não vão achar nada que me comprometa, ainda mais com essas insinuações. O sujeito que está dizendo isso quer botar azeitona na própria empada”, desmentiu. A atriz afirma que o único contato de que se recorda de ter tido com FHC foi na campanha eleitoral de 1994. “Não consigo lembrar se falei com o presidente pelo telefone. Não me lembro, mas não iria ligar para bater papo.”

Segundo o advogado de Célio, seu cliente também comentou com o general sobre outra fita em que se mencionava dinheiro. “Ele disse que duas pessoas falavam em ‘grana’. Ao receber a informação, o general Cardoso falou apenas: ‘Isso ele nega’”, conta Nélio Andrade, que teve como testemunha da reunião o colega de escritório, Themístocles Faria Lima. O encontro com o general e o depoimento de Célio à Justiça ressuscitaram o caso que estava há meses em compasso de espera. Célio acusa, entre outros, o chefe da Abin no Rio, João Guilherme Almeida, de ser parceiro de Telmo nas empreitadas. O advogado de Almeida, José Carlos Tórtima, rebate: “É a versão de um desesperado para transformar uma fábula em tábua de salvação.” No documento, Célio menciona a empreiteira Odebrecht como um dos clientes dos arapongas. O coordenador de comunicação da empresa, John-son Santos, nega envolvimento no caso: “A Odebrecht não tem nada a ver com grampo algum.”

Após o depoimento de Célio, Telmo teve prisão preventiva decretada e sumiu do mapa. Na quinta-feira 23, o advogado Carlos Kenigsberg pediu à juíza que ele responda em liberdade e tenha a prisão revogada. “Estão se baseando no depoimento fantasio-so e mentiroso de um cara que foi condenado a nove anos por extorsão”, disse. Na quarta-feira 22, a PF apreendeu na casa de Telmo e de Nelsino Silva – que seria seu sócio – fitas com gravações de conversas telefônicas. O araponga tem-se comunicado com o amigo Adilson Alcântara de Matos, também indiciado no grampo do BNDES e citado por Célio no dossiê. “Ele liga para meu celular de um telefone público. Mandou eu me cuidar. Somos amigos há dez anos”, contou Adílson, 36 anos, detetive e ex-funcionário do Centro de Informações da Marinha (Cenimar). Adilson não usa o discurso do inocente que espera a punição dos culpados: “Vou achar ótimo se tudo der em nada. Se soubesse de algo, não diria. Nesse trabalho, um protege o outro. Por incrível que pareça, também há ética no nosso meio.”