Quando ousou lançar-se como uma terceira via à polarização PT-PSDB, que prevalece na corrida presidencial há quase duas décadas, o candidato Eduardo Campos trouxe consigo um conjunto de credenciais que fazia jus ao tamanho da empreitada. Herdeiro do mitológico avô Miguel Arraes, Campos trilhou uma trajetória fulgurante desde a política estudantil na Universidade Federal de Pernambuco até o governo de seu Estado, de onde saiu após dois mandatos com o maior índice de aprovação do País. E não era para menos. Campos como mandatário estadual adotou uma forma diferente de fazer política e de exercer o poder, em sintonia com o que há de mais inovador. Baseou sua administração na meritocracia e na intolerância ao mau uso da coisa pública. Adotou práticas típicas do setor privado como o estabelecimento de metas e prêmios por desempenho, alcançando resultados fabulosos. Multiplicou os investimentos privados no Estado. Derrubou os números de homicídios, até então recorde. Impregnou a região com uma atmosfera de modernidade administrativa e justiça social que o converteu naturalmente numa liderança nacional. Em um feito surpreendente, capaz de medir o tamanho da popularidade que construiu, há cerca de dois anos ele se colocou contra o conterrâneo e maior ícone político de sua terra, Lula, na disputa pela Prefeitura do Recife. Indicou um candidato próprio que levou o cargo no primeiro turno frente ao apadrinhado do ex-presidente. Ao vencer Lula numa queda de braço local, Campos mostrou força e rompeu ali os laços da aliança que até então os unia – e que o havia transformado em ministro de Lula – para dar início ao grande projeto de concorrer à Presidência. Trouxe para as suas fileiras, em mais uma jogada sagaz e inesperada no ambiente dos caciques, a senadora e ambientalista Marina Silva, que se colocou como vice em sua chapa com um dote de mais de 20 milhões de votos arrebanhados na última eleição (quando havia concorrido ela mesma à Presidência). Campos tinha a habilidade rara de trafegar entre a esquerda xiita e a direita mais conservadora de maneira envolvente, sem macular seus princípios ou se desviar um milímetro do rumo traçado, e foi por isso mesmo capaz de costurar alianças impensáveis e de superar impasses tidos como insolúveis. Era admirado por todos os adversários. O próprio ex-presidente Lula, apesar dos pesares, não havia abandonado o sonho que acalentou por anos de dividir com ele uma futura chapa presidencial mais adiante. Aécio Neves, em plena sintonia com suas propostas, o via como um parceiro de projeto para o Brasil. E mesmo Dilma enxergava nele um companheiro de luta.

Com tamanha unanimidade, Eduardo Campos empreendeu uma marca singular na vida política brasileira. Como um dos mais promissores gestores de sua geração, egresso de uma dinastia familiar e de uma estirpe de homens públicos que lutou até o fim por ideias republicanas e princípios democráticos, sai de cena prematuramente aos 49 anos de maneira trágica e lamentável – por ironia do destino, no mesmo dia em que faleceu seu avô Arraes. Foi profético na última entrevista que concedeu na noite anterior ao acidente: “Não vamos desistir do Brasil”. Com sua morte, deixa uma lacuna imensa, mas também um grande legado. Fazia parte de seus planos, por exemplo, ampliar nacionalmente experiências revolucionárias, como a da erradicação do analfabetismo a partir de um modelo, já testado com sucesso, de aulas em horário integral. Campos pensava adiante, como um novo político para um novo tempo. Que o sopro de suas ideias contamine e sirva de modelo à leva de mandatários que irá tocar o País daqui para à frente.