As investigações sobre a Operação Condor poderão explicar muitas mortes e desaparecimentos de opositores das ditaduras militares do Cone Sul e até de lideranças políticas expressivas, que permanecem misteriosas, como a do ex-presidente Juscelino Kubitschek, morto num suspeito acidente de carro, na Via Dutra, em 1976. Descoberto em 1992 pelo advogado e educador Martín Almada, o chamado Arquivo do Terror, quatro toneladas de documentos guardados pela polícia política do Paraguai durante a ditadura de Alfredo Stroessner, guarda, no 8º andar do Palácio da Justiça, no centro de Assunção, indícios da intenção de perseguir e eliminar os opositores das ditaduras e provas da própria existência da colaboração entre os governos do Brasil, Paraguai, Argentina, Chile e Uruguai. Um desses documentos é uma carta enviada, no dia 28 de agosto de 1975, pelo então chefe do serviço secreto chileno, coronel Manuel Contreras, para o general de divisão João Baptista Figueiredo, então chefe do Serviço Nacional de Informações.

Trata-se de uma resposta do coronel chileno a uma carta de Figueiredo, enviada uma semana antes, na qual o brasileiro havia manifestado sua preocupação com a possibilidade de vitória dos democratas nas eleições americanas e com o consequente apoio que políticos oposicionistas como JK e o ex-ministro do Exterior do socialista Salvador Allende, Orlando Letelier, receberiam do governo americano, caso Jimmy Carter vencesse, como aconteceu, as eleições de 1976. Na carta, Contreras adverte que esse apoio “poderia influenciar seriamente a estabilidade do Cone Sul” e dá total apoio a um plano sugerido pelo brasileiro para que os dois serviços secretos coordenassem suas “ações contra certas autoridades eclesiásticas e conhecidos políticos social-democratas e democratas-cristãos da América Latina e da Europa”. No ano seguinte, os dois políticos acabariam morrendo. No caso de Letelier ficou provado que o atentado que o matou, em 21 de setembro de 1976, em Washington, foi organizado pelo serviço secreto encabeçado por Contreras, a temida Dina. Já a morte de JK, um mês antes da de Letelier, segundo versão oficial, se deveu a um acidente de carro. O ex-presidente tentava articular a redemocratização do Brasil.

Outras mortes de políticos ainda são tidas como suspeitas: a do ex-presidente João Goulart, em 1976, e a do ex-governador Carlos Lacerda, em 1977. Do Arquivo do Terror, constam outros documentos instigantes, como um ofício do responsável pela repressão no Paraguai, Pastor Coronel, hoje cumprindo pena por torturas, ao então delegado geral do Dops de São Paulo, Romeu Tuma, apresentando um agente paraguaio com missão confidencial na capital paulista. O comissário Roque Luis Mendez Lara levava, inclusive, um presente para Tuma. “Uma pequena prova da solidariedade e respeito que une nossos serviços dedicados a guardar a ordem e a segurança”, diz o documento. Constam também centenas de fichas de brasileiros suspeitos de subversão. No informe confidencial 484, de 5 de agosto de 1969, Pastor Coronel estende ao território paraguaio a caçada ao capitão Carlos Lamarca e a outros militantes brasileiros.

Jango, 24 anos de mistério
ela primeira vez, a morte do ex-presidente João Goulart será apurada pelo governo. As suspeitas de que ele teria sido assassinado foram reforçadas mais ainda com as investigações sobre a Operação Condor. O líder do PDT na Câmara dos Deputados, Miro Teixeira, pediu ao ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Alberto Cardoso, que o assunto fosse averiguado. O general, segundo o Jornal do Brasil, afirmou ao deputado pedetista que o governo vai se empenhar para descobrir se Jango foi vítima da Operação Condor. O ex-presidente morreu no dia 6 de dezembro de 1976. Até hoje, a versão oficial era de que ele havia morrido de ataque cardíaco, mas o atestado de óbito, assinado por Teresa de Sandoval, delegada do Registro Provincial de las Personas, na cidade de Mercedes, província de Corrientes, na Argentina, publicado pelo JB, é genérico. Nele consta que a causa da morte foi uma “enfermedad” (doença). A família de Jango afirma que não se oporia à exumação de seu corpo, enterrado em São Borja (RS), para que seja feita uma autópsia. A principal suspeita é de que o ex-presidente teria sido envenenado. Em entrevista ao JB, a viúva Maria Thereza Goulart contou que Jango recebia ameaças. “Várias vezes Jango falou comigo sobre organizações políticas que agiam contra os exilados. Quando mataram o ex-presidente boliviano Torres, ele ficou seriamente preocupado. Havia uma organização descoberta em Mar del Plata que tinha planos para matar Jango e sequestrar nossos filhos”, afirmou Maria Thereza na entrevista.