Preencher cheque a lápis? Nem pensar! Responder a lápis à avaliação bimestral de geografia? Também não. Nada contra as canetas, essas jóias de plástico ou metal que podem atingir preços tão elevados quanto os mais raros vinhos europeus. Mas o lápis, esse elementar instrumento de madeira criado há quase quinhentos anos, continua imbatível no quesito praticidade. Não borra, não vaza na roupa e ainda permite que o fiel usuário apague o que acabou de escrever e torne a fazê-lo quantas vezes achar necessário. No entanto, se comparado ao infinito arsenal de canetas cada vez mais arrojadas, o lápis deixa a desejar no que se refere a conforto e elegância. Pelo menos até agora. O modelo Grip 2001, fabricado pela Faber Castell alemã, acaba de chegar ao Brasil com um respeitável currículo de troféus em concursos de design europeus. Tudo por causa de pequenas bolinhas de borracha enfileiradas ao longo do corpo triangular e prateado. Elas funcionam como um dispositivo antiderrapante, no caso de encontrarem dedos úmidos e escorregadios. O resultado é fashion, apesar da eficácia ser questionável.

Em geral, persiste a impressão de que lápis é tudo igual. Em 1565, um livro de Konrad Gessner trouxe a primeira descrição da ferramenta: “um bastão de madeira no final do qual é inserido um pedaço de grafite”. De lá para cá, o grafite passou a atravessar todo o bastão, deixou de deslizar dentro da madeira como acontecia até os anos 1970 e o formato cilíndrico cedeu espaço ao hexagonal e, agora, ao triangular. Mas, provavelmente, um lápis seria descrito hoje com palavras muito semelhantes às utilizadas por Gessner, mesmo que os aficionados por lápis ressaltem mil diferenças entre os modelos. “Cada lápis é diferente do outro. Há madeiras mais macias do que as outras e grafites com diversas espessuras”, rebate o designer gráfico Hélio de Almeida. Diretor de arte de ISTOÉ entre 1976 e 84, Almeida não abre mão dos quase duzentos lápis de cor que enfeitam sua atual mesa de trabalho e recusa a tela do computador como suporte de criação. Ele é capaz de avaliar a qualidade de um lápis ao primeiro manuseio e prefere os aquarelados. “Os suíços ainda são os grandes mestres. O lápis brasileiro não tem a suavidade do importado, mas está chegando lá”, acredita.

Culpa da madeira? Todos os lápis devem ser fabricados com alguma espécie de conífera, árvore como o pinheiro. Os europeus utilizam o cedro americano. Os brasileiros, um pinheiro caribenho. De resto, a suavidade depende do grafite, da quantidade de cola misturada ao mineral e da tonalidade dos pigmentos. Aliás, a palavra grafite deriva do termo grego “grafia”, que significa escrita. A primeira mina de grafite foi descoberta em Cumberland, na Inglaterra, no século XVI e acreditava-se que era constituída por chumbo, tamanha a semelhança das cores. Somente no século XVIII o químico alemão Karl Scheele provou ser o grafite um derivado do

carbono, sem qualquer relação com o chumbo. Pronto. O caminho estava aberto para que, quase quinhentos anos depois de inventado, o lápis se tornasse um dos objetos mais populares do universo. Hoje, estatísticas apontam uma produção mundial de cerca de 10 bilhões de unidades por ano, fabricadas a partir de mais de um milhão de metros cúbicos de madeira, plantada e replantada pelas próprias empresas. Tudo para fazer a festa dos artistas veteranos. E das crianças, essas felizes criaturas que não precisam preencher cheques nem fazer provas de geografia.