No mesmo momento em que acontecia o sequestro do ônibus no Jardim Botânico, com seu trágico desfecho, o governador do Rio, Anthony Garotinho, bem perto do local da tragédia, no hotel Intercontinental, durante o 7º Fórum Mundial de Editores, falava sobre a violência. O discurso do governador foi tema de uma reportagem publicada no dia seguinte pelo jornal O Globo, assinada pela jornalista Selma Schmidt e intitulada “Garotinho: imprensa tem atração por violência”. Para o governador – relata o artigo –, Washington é uma das cidades mais violentas do mundo, e lá a violência não tem destaque nos jornais, enquanto aqui ganha manchetes de primeira página. O governador citou também uma pesquisa na qual os mesmos cidadãos que apontam o aumento da violência na cidade do Rio dizem que, nos bairros onde moram, o problema diminuiu. Para o governador, “os jornais são os principais suspeitos dessas visões diferentes de opinião”.

A imprensa realmente não é das instituições mais simpáticas. Os jornalistas são vistos como arrogantes e parte deles realmente o é. A ética é uma palavra que não consta de manuais de algumas redações, onde é facilmente encontrável o verbete sensacionalismo. O significado da palavra humildade também não consta dos dicionários usados por parte dos jornalistas. Por outro lado, essa falta de simpatia da imprensa é também fruto do incômodo que ela proporciona quando cumpre a sua função de olhar o poder com isenção e apontar os seus eventuais, ou não tão eventuais, desmandos. Também é incômoda a sua presença em alguns eventos como o do sequestro do ônibus. Caso estivesse ausente, alguns desfechos desastrosos ganhariam versões menos comprometedoras e comprobatórias de uma incompetência e uma prepotência endêmicas. Mas dizer generalidades a respeito do papel da imprensa é tão cabotino e irresponsável quanto defender a tese de que todo governador ou todo político é corrupto e incompetente. Alguns realmente o são.

Concordamos que a imprensa às vezes exagera. A diferença entre o que seriam exageros da cobertura jornalística neste caso e a própria violência ficou mais clara dois dias depois de Selma ter escrito a sua reportagem. Dirigindo seu carro no Rio de Janeiro, a jornalista foi atingida na entrada do túnel Rebouças por duas balas perdidas. Ela teve fratura exposta no dedo anular da mão direita e estilhaços no ombro esquerdo.