Num hospital particular de Maceió, longe do sertão que marcou sua juventude, morreu no domingo 15, de insuficiência respiratória, José Alves de Matos, 97 anos, o último cangaceiro do bando de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Nascido em uma família pobre de Paripiranga (BA), teve uma infância diferente da dos seus seis filhos. Pai de uma assistente social, uma dentista, um administrador de empresas e funcionários públicos, ele se aposentou como servidor do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas, depois de trabalhar também como guarda civil. Matos cresceu numa zona influenciada pelo cangaço e tinha pelo menos sete parentes cangaceiros. Seus filhos conheceram uma realidade bem diferente, todos foram estimulados a estudar, mas dizem que o patriarca nunca se envergonhou do passado. “Ele teve muito orgulho dos momentos que viveu ao lado de Lampião”, afirma a filha caçula, Dulce Matos Williams, economista que trabalha nas Bolsas de Chicago e Nova York.

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Matos se juntou ao bando do Rei do Cangaço em 25 de dezembro de 1935 – por isso, recebeu o apelido de Vinte e Cinco. Costumava contar que seu ingresso no banditismo se deu porque policiais espancaram familiares pela proximidade deles com o cangaço. Para o historiador Frederico Pernambucano de Mello, no entanto, não se deve levar esses relatos tão a sério: “Como no sertão a vingança é um dever, muitos a usaram como um escudo ético para justificar suas atitudes e seus excessos”.

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Como cangaceiro, serviu sob o comando de Lampião e de alguns subgrupos como o de Cristino Gomes da Silva Cleto, o Corisco. Nunca foi chefe, mas aparece em fotos ao lado do líder. “Lampião criou uma espécie de Cangaço S.A., deu um sentido de empresa a uma tradição desorganizada. Seus dez bandos atuavam como franquias. Eles possuíam certa autonomia, mas gravitavam em torno do grupo central”, afirma Mello. De acordo com ele, o banditismo seduzia o homem simples do semiárido. “Os cangaceiros eram endeusados pela população, possuíam conexões com políticos e coronéis e eram chamados para arbitrar conflitos.” Vinte e Cinco escapou por pouco da emboscada que matou Lampião em 28 de julho de 1938 em Sergipe – ele havia sido despachado para buscar armas em Pernambuco. Depois, ficou foragido até novembro, quando se entregou à polícia, foi preso e recomeçou a nova vida quatro anos depois.