O arquiteto Oscar Niemeyer havia tido o visto de entrada nos Estados Unidos recusado mais de uma vez. Mas conta-se que, quando Le Corbusier disse que queria o discípulo na equipe de construção da sede para a Organização das Nações Unidas, a resistência ao integrante do Partido Comunista afrouxou. Niemeyer desembarcou em Nova York em 1946 para trabalhar com o mestre e mais importante influência de sua trajetória no edifício que representava a volta da paz ao mundo após o fim da Segunda Guerra Mundial.

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Acontece, porém, que àquela altura Niemeyer não era mais um aprendiz e sua ideia para o projeto era bem diferente da do francês. Os dois discordaram e o projeto da sede da ONU, que tinha ainda sete outros profissionais, é hoje o que se pode calcular de uma média entre as propostas. Cópias heliográficas guardadas dessa operação e rabiscadas com lápis de cor pelo próprio arquiteto brasileiro mostram pela primeira vez ao público um pouco do que Niemeyer pensou, mas não necessariamente viu de pé.

As cópias permaneceram guardadas na fundação que leva seu nome até o momento. Agora vêm a público na exposição “Niemeyer – Clássicos e Inéditos”, que ocupa em junho e julho três andares do Itaú Cultural, em São Paulo. Ideias não executadas pelo mestre, morto em 2012, compõem a parte mais interessante da ação, com apresentação assinada pelo arquiteto Pedro Mendes da Rocha. São 70 projetos, 51 deles inéditos, apresentados em nada menos que 309 plantas, desenhos e croquis originais. Recém-digitalizadas, a maior parte das imagens nunca tinha sido exibida e depois da mostra passará a ser aberta para consulta pública. O projeto, parceria entre a Fundação Oscar Niemeyer e o Itaú Cultural, recuperou 4.800 desenhos e croquis.

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A casa que Niemeyer queria construir para ele mesmo em Cabo Frio (RJ) é uma das peças raras da mostra. Trata de parte do trabalho menos conhecida do arquiteto, a arquitetura residencial. Maquetes de obras não construídas evidenciam quão adiantados alguns projetos estavam quando foram cancelados, não aprovados ou preteridos em nome de outros em concorrências, algo muito comum sobretudo para edifícios públicos. “Importante destacar a antecipação com a qual Oscar Niemeyer previu ainda no início dos anos 1940 o esgotamento do uso estrito do racionalismo”, escreve Lauro Cavalcanti, curador, no texto de apresentação do programa.

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Em 1964, quatro anos depois da construção de Brasília, Niemeyer foi chamado para projetar a cidade de Negev, em Israel. Ao contrário do que se vê na capital brasileira, Negev teria edificações verticais, privilegiando a circulação de pedestres – uma nítida e forte influência de Le Corbusier, mostrando o vínculo entre eles, apesar das discordâncias no projeto da sede da ONU.

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Mas mesmo naqueles projetos que não deixaram a prancheta é possível enxergar no longo percurso do arquiteto a força e a importância crescente das questões formais. Filho de uma geração em que a função deveria preceder a forma, Niemeyer decidiu edificar em nome do gesto da sua mão: curvo, sinuoso e não necessariamente viável. Mas que pela força de síntese se tornou a marca mais lembrada da arquitetura brasileira.

Fotos: Juliana Zucolotto, Michel Moch – Fundação Oscar Niemeyer


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