Menos de quatro anos depois de o ex-presidente Lula rejeitar a extradição do ativista de esquerda Cesare Battisti para a Itália, autoridades italianas indicam que podem devolver ao Brasil o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado no processo do mensalão a 12 anos de prisão. No último dia 7, o procurador Alberto Candi, do Ministério Público da Itália, se manifestou à Corte de Apelação de Bolonha pela extradição de Pizzolato ao Brasil. O que poderia ser encarado como favor da Justiça italiana, na verdade, constrange as autoridades brasileiras e a cúpula do PT, que não gostaria de ter de lidar com o caso Pizzolato e seus desdobramentos em território brasileiro em pleno ano eleitoral.

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EXTRADIÇÃO
Documento enviado pelo governo brasileiro pedindo retorno de
Pizzolato (abaixo) é incompleto e possui erros de tradução

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Uma primeira audiência com o juiz, a quem caberá a decisão final, ainda não tem data estabelecida, mas, segundo uma fonte interna da procuradoria de Bolonha, ocorrerá no final de maio. No dia 21 do mesmo mês, haverá uma audiência do recurso à Corte de Cassação (Supremo Tribunal Federal da Itália), impetrado pelos defensores de Pizzolato, para que ele aguarde a sentença da extradição em prisão domiciliar. Seus advogados tentam, desde o momento da prisão, convencer os juízes de que não existe risco de fuga, uma vez que os documentos de Pizzolato se encontram aprendidos pela polícia italiana.

O processo está sendo conduzido a toque de caixa, mas os advogados de defesa de Pizzolato só tiveram acesso ao processo de extradição há três semanas. O pedido quase burocrático de extradição foi encaminhado em março pelo Ministério da Justiça brasileiro. Trata-se de uma formalidade. Na verdade, o governo do PT torce para que o pedido seja recusado. Tudo o que os petistas querem, em ano eleitoral, é ver Pizzolato – possível fonte de problemas para o partido – bem longe do Brasil. Juridicamente, nem o próprio Supremo Tribunal Federal acreditava que isso ocorresse. Esses dois fatores talvez expliquem os furos existentes no processo encaminhado à Itália ao qual ISTOÉ teve acesso. No total foram enviadas 153 páginas traduzidas em italiano, o que deixou a defesa de Pizzolato perplexa. Segundo uma fonte próxima ao réu, “era esperado algo muito mais substancioso”, pois sabe-se que, ao todo, os autos da ação penal 470 possuem mais de 50 mil páginas. “Fazem parte da documentação enviada o mandado de prisão, o pedido de extradição, uma parte da sentença e alguns dos embargos de declaração, mas as informações são insuficientes. Fica impossível estabelecer uma conexão ou entender o que querem dizer”, disse uma pessoa ligada a Pizzolato.

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BATEU, LEVOU
O ativista Cesare Battisti (abaixo) ficou no Brasil a contragosto dos italianos,
que, agora, querem despachar Pizzolato, preso em Modena (acima)

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Um exemplo das lacunas dos documentos apresentados pelo Brasil está no seguinte trecho: “As atividades de apuração realizadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito dos Correios e no âmbito da presente investigação número 102 demonstraram a retirada de recursos significativos do Banco do Brasil a favor da empresa DNA Propaganda, a qual fonte de financiamento foi o fundo de investimento Visanet”. No rodapé encontra-se o número 102 com o seguinte texto: “Durante as investigações criminais foram pedidos documentos e informações à presidência do Banco do Brasil a propósito dos fatos em apuração resultando as constatações da relação de investigação interna que constituem o volume 25 dos atos da investigação.” O problema é que o volume citado não foi disponibilizado à Justiça italiana, assim como outros volumes referidos no texto traduzido, mas não anexados ao processo de extradição.

Outra parte importante do pedido de extradição refere-se aos embargos de declaração, que são os recursos apresentados pelos advogados de Pizzolato durante o processo do mensalão. Na primeira linha da página 2, nota-se o pedido de “início imediato da execução da pena, independentemente da publicação da sentença”. Logo abaixo nota-se uma tamanha confusão editorial e de tradução, muito similar a um quebra-cabeças. Foram divididos frases e títulos e o rodapé do texto foi parar no meio da folha. Uma fonte da procuradoria de Bolonha ouvida por ISTOÉ confirmou que a quantidade de informações traduzidas referentes às acusações de Pizzolato é insuficiente e que irão pedir mais informações a respeito. Pessoas que tiveram acesso aos documentos ainda se surpreenderam com a tradução quase amadora feita por uma empresa brasileira, a um custo de R$ 8 mil.

Com a procuradoria favorável à extradição, fica cada vez mais complicada a situação de Pizzolato. Uma das linhas de defesa será exatamente a questão das péssimas condições das penitenciárias brasileiras. Pizzolato foi condenado em 2012 por corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. Mas fugiu para a Itália antes da execução da pena, com passaporte falso de um irmão morto há 35 anos. Em fevereiro deste ano, foi descoberto na casa de um sobrinho na cidade de Maranello, norte da Itália, e levado para a prisão de Modena. “Abatido e cansado”, segundo pessoas próximas a ele, Pizzolato torce para não ser extraditado. Nas últimas semanas, o ex-diretor do Banco do Brasil tem passado os dias rezando sozinho ou em companhia do capelão da penitenciária, além de frequentar um dos cursos destinados aos carcerários.

Fotos: DIDA SAMPAIO/AG. ESTADO/AE; Rafael Hupsel; JAMIL CHADE/ESTADÃO CONTEÚDO 


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