Um dos poucos projetos comerciais que levam a assinatura do arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), o Monumental, em Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro, começou a ser negociado. Mas a obra está envolta em polêmicas. As torres gêmeas de 28 andares que serão erguidas às margens da Baía de Guanabara foram aprovadas sem respeitar os padrões urbanísticos da área, por terem a assinatura do mestre. Isso não livrou o projeto de inquérito do Ministério Público Estadual, que apontou falhas no Estudo de Impacto de Vizinhança. Afinal, o complexo contempla cerca de 800 unidades, entre salas comerciais, lojas e quartos de hotel, sem que fosse feita análise de consequências para o trânsito ou a deslumbrante paisagem. Arquitetos e urbanistas também criticam a verticalização de uma região, chamada justamente de Caminho Niemeyer, onde obras de menor tamanho do próprio arquiteto predominam. Mas há também quem acredite que as torres curvas ligadas no meio por uma plataforma valorizem o entorno.

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DEBATE
Para alguns arquitetos, o Monumental (acima) agride a paisagem e
destoa até de outras obras do mestre na cidade. Para outros, os prédios
em formato curvo e com vão livre manterão a harmonia do cenário

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Professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense (UFF), Regina Bienenstein diz que o projeto fere o Plano Diretor da cidade. Segundo ela, o empreendimento foi concebido para um local de trânsito já saturado, por ser muito próximo ao terminal de barcas que ligam Niterói ao Rio. Em tese, projeto de tal porte não poderia ser comportado no local. No entanto, na gestão do ex-prefeito Jorge Roberto Silveira (PDT), entre 2008 e 2012, foi aprovada lei que abre exceções de gabarito a qualquer prédio desenhado por Niemeyer em trecho da orla.

A diretora cultural do Instituto de Arquitetos do Brasil, Cêça Guimaraens, acredita que as torres vão destoar da suavidade das obras do Caminho Niemeyer, como o Museu de Arte Contemporânea (MAC) e a estação de Charitas. Segundo ela, recorrer a prédios altos como alternativa de valorização do entorno é um recurso urbanístico ultrapassado. “Hoje em dia, sabemos que prédios mais baixos são os que facilitam a convivência social”, afirma Cêça. O arquiteto Jair Valera, que trabalhou com Niemeyer até sua morte, rebate as críticas. De acordo com ele, a intenção da verticalização foi tornar as torres mais finas e leves. Os prédios em formato curvo teriam como objetivo uma composição harmoniosa com a paisagem da baía. Niemeyer teria se preocupado em deixar vão livre entre as torres para não tapar totalmente a visão do mar. “Esse era o projeto de prédio comercial que ele mais gostava”, diz Valera.

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Outra polêmica em relação ao Monumental é sua proximidade com o traçado da futura linha três do metrô. A prefeitura de Niterói informou por meio de nota que não há risco de sobreposição dos projetos. “Em nenhuma das três alternativas em estudo para o metrô há previsão de desapropriação da quadra na qual se insere o empreendimento Oscar Niemeyer Monumental”. A prefeitura, administrada por Rodrigo Neves (PT), informou que a licença para as torres saiu na gestão anterior e que o atual governo cumpriu determinação do MP de realizar a audiência pública. Marcelo Latini, diretor da incorporadora Latini Bertoletti, uma das responsáveis pelo empreendimento, diz que Niterói tem localização privilegiada em relação à indústria petrolífera e que a cidade só tem a ganhar com a construção das torres.

Numa das estruturas funcionará um hotel com 293 quartos, que será administrado pela bandeira Ibis, do grupo francês Accor. “Com o desenvolvimento da produção de petróleo, há muito movimento de gerentes, diretores e operários da indústria petrolífera”, afirma Latini. Sócia no projeto, a PDG nega que ele tenha sido lançado anteriormente sem a devida legalização. Segundo o diretor da incorporadora, Cláudio Hermolin, “todos os esclarecimentos foram prestados à sociedade”. Os sócios esperam faturar R$ 367 milhões com o projeto, onde uma sala custa em média R$ 330 mil. O processo movido pelo MP ainda corre na 5ª Vara Cível de Niterói. No entanto, a liminar concedida pela juíza Maria Aparecida Bastos foi cassada no fim do ano passado pelo Tribunal de Justiça do Rio.