Assim como o ex-senador Demóstenes Torres (ex-DEM), cassado por envolvimento com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, o vice-presidente da Câmara dos Deputados André Vargas (PT-PR) sempre gostou de posar de paladino da moralidade. Em plena sessão solene de abertura do ano legislativo no Congresso, ousou desafiar o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, erguendo os punhos cerrados, em repetição a gesto feito pelos mensaleiros quando foram presos. A foto do deboche ganhou as redes sociais e os principais jornais, levando o deputado a passar dias recebendo cumprimentos dos petistas críticos do desfecho do julgamento do mensalão. No ano passado, Vargas já havia feito a alegria dos petistas ao se lançar contra outro crítico dos réus do mensalão. O alvo foi Olívio Dutra, que recomendara a renúncia de Genoino. “Quando ele (Olívio) passou pelos problemas da CPI do Jogo do Bicho, teve a compreensão de todo mundo”, atacou André Vargas. Agora, assim como Demóstenes, Vargas corre o risco de perder o mandato por envolvimento com a contravenção.

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Na última semana, revelou-se que ele mantém relação de proximidade e amizade com o doleiro Alberto Youssef, que está preso por ser o pivô de um esquema de lavagem de dinheiro que pode ter movimentado cerca de R$ 10 bilhões. Vargas e o doleiro são amigos de longa data – há pelo menos 20 anos. Nas escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal durante as investigações da Operação Lava Jato, os dois trocaram dezenas de telefonemas e trataram de assuntos que vão desde política até negócios do doleiro com o Ministério da Saúde. Em uma das conversas, eles se referem ao contrato de R$ 150 milhões da Labogen, um laboratório com folha salarial de R$ 28 mil, com o Ministério da Saúde. A PF acredita que Vargas mantenha com o doleiro preso uma espécie de “sociedade” — a mesma suspeita que  chegou a pesar na relação entre Carlinhos Cachoeira e Demóstenes.

Na semana passada, mais uma clara demonstração de proximidade entre os dois foi publicada pelo jornal “Folha de S. Paulo”, mostrando que o deputado pediu a Youssef que viabilizasse um avião para que ele e a família fossem de Londrina a João Pessoa passar férias, em janeiro. Youssef fretou um Learjet 45 por mais de R$ 100 mil e Vargas não só desfrutou da viagem como levou com ele sete pessoas de graça. Sobre o passeio, o parlamentar se contradisse algumas vezes ao tentar se explicar, mas terminou assumindo se tratar de um favor feito pelo doleiro, que não teria aceitado nem sequer o pagamento da gasolina usada. Disse tratar-se de “imprudência” voar à custa do doleiro, em discurso na Câmara na semana passada, e jurou não manter negócios com Youssef. Poucos acreditaram.

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INTIMIDADE
O petista André Vargas mantém uma relação de 20 anos
com o doleiro Alberto Youssef. Além de usufruir do jatinho
do amigo, Vargas é suspeito de ser sócio dele

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A proximidade – ou sociedade – de um político que parecia não ter o que temer com uma pessoa investigada por envolvimento com corrupção não é o único paralelo que se pode traçar entre os casos de André Vargas e Demóstenes Torres. Há outra semelhança. Assim como Cachoeira, o doleiro de Vargas também já havia sido preso por envolvimento no esquema do Banestado. Apesar disso, o deputado diz que não conhecia as atividades do amigo, assim como fez Demóstenes em 2012, ao negar que mantinha qualquer relação com o seu amigo contraventor acusado de comandar negócios ilegais.

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PUNHOS CERRADOS
Em sessão solene de abertura do ano legislativo, André Vargas desafiou o
Supremo ao repetir gesto característico dos mensaleiros ao lado de Joaquim Barbosa

O ex-senador Demóstenes Torres enfrentou a investigação no Conselho de Ética do Senado, aberto em resposta a um pedido do PSOL. O parlamentar foi cassado pelo plenário três meses depois e ficou inelegível. Na quinta-feira 3, novamente coube ao mesmo PSOL a iniciativa de pedir apurações contra Vargas. O partido apresentou um ofício ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), para que a Corregedoria apure a conduta do petista. O caso coloca em cena mais uma vez as relações duvidosas entre pessoas públicas e contraventores, um enredo cujo desenlace depende da boa vontade dos próprios políticos em investigar seus pares.

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Fotos: Ailton de Freitas/Ag. O globo; Adriano Machado; André Dusek


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