Tacita Dean: a medida das coisas/Instituto Moreira Salles, RJ/ até 26/1

O silêncio baliza toda a obra fílmica e fotográfica de Tacita Dean. Não que a artista britânica de 48 anos realize apenas filmes mudos. Mesmo nas obras sonorizadas, o que predomina na superfície de suas telas projetadas é sempre a natureza secreta e silenciosa das coisas. O foco de Tacita são as coisas abandonadas pelo uso, esquecidas, silenciadas pelo tempo; ou as coisas do cotidiano que simplesmente não são notadas. No Instituto Moreira Salles, do Rio, 11 filmes e sete obras em papel dão conta dessas vidas paralelas, notadas por Tacita.

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ESQUECIMENTO
Perseguindo o destino de veleiro inglês desaparecido,
Tacita Dean realizou "Bubble House"

O desaparecimento do velejador amador Donald Crowhurst no mar, em 1968, deu origem a três filmes que são o ponto nevrálgico da mostra. Os filmes não são reconstituições da trágica história do fracasso de Crow­hurst em circunavegar o globo terrestre, mas resultado de uma longa investigação sobre a viagem. “Desaparecimento no mar” (1996) é uma reflexão sobre o tempo. Foi filmado em formato de grande-angular anamórfico, no farol de St. Abb’s Head, em Berwickshire, na Escócia. “O farol é o último sinal humano entre a terra e o oceano”, anota Tacita nos textos do catálogo da exposição. “À noite, você espera na escuridão pelas rotações do farol e tenta decifrar o tempo nos intervalos dos flashes. Sem essa cifra, não há tempo”, aponta ela, meditando sobre a flutuação de Crowhurst sozinho, distante do contato humano.

“Teignmouth Electron” (2000) descobre o veleiro trimarã de Crowhurst abandonado e apodrecido em uma praia nas ilhas Cayman. O filme mostra a ruína do barco e do sonho e o texto da artista no catálogo reconstitui sua história, desde que foi descoberto à deriva, levado para o Caribe, leiloado na Jamaica e abandonado, graças à fama de mal-assombrado. Finalmente, “Bubble House” (Casa Bolha, 1999) registra um achado na última etapa da investigação sobre a viagem insólita do navegador britânico. Na “costa do furacão”, onde o barco teria sido localizado, a artista encontrou também a ruína de uma casa em formato elíptico. “Deserta e inacabada, ela surgia como uma visão futurística”, anota a artista em seu diário de bordo. “Sabíamos que tínhamos topado com algo de outro mundo; o par perfeito para o Teignmouth Electron”.

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NA ESTRADA
Artista-viajante, Tacita Dean trabalha com postais da antiga Teresópolis

Todos os trabalhos são filmados em 16 mm, já que Tacita é fiel a outro objeto esquecido: a película cinematográfica. Completam o ciclo da exposição os não menos impactantes “Day for Night” (2009), em que Dean filma os objetos de pintura de Giorgio Morandi, e a instalação de múltiplas telas “Merce Cunningham performs STILLNESS… (six performances, six films” – 2008). São obras que selam
o pacto de silêncio de Tacita Dean.