O ex-jogador diz que, com sua história sem desvios de dinheiro ou corrupção, teria muito a acrescentar à entidade máxima do futebol brasileiro

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VIDA NOVA
Ele está morando em Londres com a namorada e faz estágio na
WPP, uma das maiores agências de comunicação do mundo

Em Londres, o relógio marcava 1 hora da madrugada. Ronaldo Nazário acaba de chegar ao apartamento que divide, na capital inglesa, com a futura esposa, Paula Morais, 28 anos, que caminha para ser sua quarta mulher. Ele inicia o papo por telefone com ISTOÉ com uma dúvida: esquentaria água na panela para tomar banho ou iria até um hotel nas proximidades desfrutar de um banho quente? “A água aqui em casa tá fria. A vida toda tomei banho de água fria, mas essa aqui tá congelada, pô! Dá não!” Aos 36 anos, pai de quatro filhos, o carioca Ronaldo é um tipo cuca fresca que administra o prestígio, as glórias e o dinheiro conquistados com a sua brilhante carreira no esporte. Campeão mundial duas vezes (1994 e 2002), hoje é onipresente como conselheiro do Comitê Organizador Local da Copa, empresário de sucesso e garoto-propaganda de quase uma dezena de grandes marcas. Estabelecido em Londres, onde fica até o fim do ano para melhor se preparar para os negócios, o ex-craque que surgiu fininho no futebol e hoje registra 105 quilos deu declarações de peso sobre os assuntos que o cercam.

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“Nunca vi o Romário fazer nada pelo futebol no
Congresso Nacional. O que ele diz não me interessa"

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“Se eu fosse o presidente da Portuguesa, não reclamaria
na Justiça por ser rebaixado. Ia meter o pau no meu
jurídico! Não tem mais espaço para amadorismo"

Fotos: montagem sobre foto de Patrick Seeger/dpa/zumapress; Beto Barata/ agência estado/ae; EDISON TEMOTEO/FUTURA PRESS

ISTOÉ

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O que a mudança para Londres trouxe à sua carreira? 

Ronaldo Nazário

Tenho melhorado meu inglês, que sempre foi medíocre. Eu tinha vocabulário, mas não fluência. Sem contar o estágio que tenho feito na WPP, uma das maiores agências de comunicação do mundo, e os encontros que tenho com o Martin Sorrel (presidente da empresa). Ouço as conversas e as negociações dele e aprendo. Vou ao Fórum Econômico de Davos, na Suíça, com ele, e estarei junto dos líderes mundiais. Isso vale não só para os meus negócios, mas para a minha vida. Em relação ao inglês, não quero pagar mico. Sempre vi um monte de jogador que acha que fala uma língua e não fala. É feio. Já vi, na Espanha, o Rivaldo dizer “mi duele mi ruêlho” para explicar que sentia dor no joelho (risos). 

ISTOÉ

Como é sua rotina? 

Ronaldo Nazário

Moramos, eu e Paula, em um apartamento. Aproveitamos os restaurantes. Cerveja, não curto muito. Prefiro a cerveja gelada do Brasil. Quando o tempo está bom, vamos para todos os lugares de bicicleta. Um dia desses, fomos parados em uma blitz de bicicleta, acredita? Fiquei surpreso, até gravei, mas ainda não postei. A lanterna da frente da bicicleta da Paula estava ruim. Tomamos uma multa de 40 libras. O cara disse que se a gente consertasse e voltasse ao mesmo local ele tiraria a multa. Voltamos e a multa foi retirada. 

ISTOÉ

O policial o reconheceu? 

Ronaldo Nazário

Não. Sou assediado aqui, porque o povo é louco por futebol também, mas, de bicicleta, é mais fácil porque não dá para parar e atender quem me chama. 


ISTOÉ

Como lida com uma carteira de negócios diversificada? 

Ronaldo Nazário

Administro tudo. A cada seis meses, tenho reunião de planejamento com os meus assessores. Estou mais presente na administração da minha imagem, que é o negócio mais rentável para mim. Tenho contrato de publicidade com oito empresas (Claro, Bradesco, Pokerstars, Ambev, Nike, Fiat, Hipermarcas e Duracell). A 9ine quem toca é o (Marcos) Buaiz, com quem fico no telefone o dia todo. 

ISTOÉ

Muita gente o critica por ser porta-voz da Copa e ter o nome, de certa forma, ligado à CBF.  

Ronaldo Nazário

Não sou aliado, não tenho vínculo com a CBF e não respondo a ela em nada. Tenho relações com o Comitê Organizador Local, uma empresa privada subordinada à Fifa. Aceitei o cargo porque o encarei como um trabalho voluntário para o meu país. Quero que a Copa seja um evento fantástico, motivo de orgulho. Meu desafio é que o Brasil melhore o seu conceito em relação aos outros países. 

ISTOÉ

Isso tem ocorrido? 

Ronaldo Nazário

No início, foi tudo muito difícil, com as informações emboladas, as pessoas misturavam as responsabilidades. Confundem as coisas: a CBF não tem nada a ver com a Copa. As pessoas no Brasil têm de se conscientizar de que a Copa é dos brasileiros e será no nosso país. É uma grande oportunidade de investimentos em estádios, estradas, rede hoteleira, aeroportos, que sabe Deus quando haveria não fosse o Mundial. 


ISTOÉ

Mas a Joana Havelange, filha de Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF que o convidou para o posto, é a diretora-executiva do COL. 

Ronaldo Nazário

Isso é uma questão burocrática de praxe. A confederação local é dona da participação do Comitê Organizador Local. O (José Maria) Marin é presidente da CBF e do COL. Mas eu não tenho nenhuma ligação com a CBF. O que me propus é fazer uma Copa inesquecível, tão organizada, ou melhor, do que as que eu joguei. A Copa é um baita negócio para o Brasil, no sentido de mostrar a imagem do nosso povo, da nossa cultura e capacidade. 

ISTOÉ

Teria coragem de presidir a CBF? 

Ronaldo Nazário

Hoje, quero terminar esse projeto de Copa do Mundo. Mas o futebol brasileiro precisa de muitas mudanças. E eu não tenho nenhum medo de assumir a CBF se um dia fizer disso o meu objetivo. A CBF é a entidade que organiza o futebol e o futebol é a maior paixão do brasileiro. Eu só teria a acrescentar. Minha história de vida é muito bonita, sem deslizes, desvio de dinheiro ou corrupção. Meu dinheiro é declarado, paguei todos os meus impostos. Fazer um trabalho transparente ajudaria a mudar a imagem do futebol brasileiro. Não tenho intenção, agora, mas não teria medo (de assumir a CBF). Seria até um desafio muito bom para mim. 

ISTOÉ

O que sugere para reduzir a violência nos estádios? 

Ronaldo Nazário

Temos de pegar exemplos no Exterior. Venda de carnê para todos os jogos da temporada, registro de torcedores. Temos uma boa legislação, mas falta vontade de aplicar as leis. Não concordo com a polícia dentro do estádio, ela tem de ficar fora. Mas os clubes têm de estar preparados para colocar segurança privada dentro do estádio, têm de ter um aparato de segurança nos jogos. Mas, principalmente, se aplicássemos as leis, as pessoas iriam pensar duas vezes em fazer merda no estádio. 

ISTOÉ

Um levantamento recente diz que 75% das obras de mobilidade para a Copa não serão entregues até o início do torneio. O que pensa disso? 

Ronaldo Nazário

É uma pena. Mas, tratando-se de Brasil, já é um grande legado ter começado um monte de obra, mesmo que algumas terminem só no fim do ano. Cuiabá não recebia um grande investimento público há 40 anos. Hoje, a cidade está inteira em obras, há mais de 60 grandes intervenções ali. A vida das pessoas vai mudar. Não dá para achar que não há um legado da Copa. O brasileiro tem mania de botar para baixo as nossas coisas. No mundo inteiro há atrasos.  

ISTOÉ

Lembra de um? 

Ronaldo Nazário

Em 2006, a Alemanha atrasou a obra de um estádio para a Copa das Confederações e teve de retirá-lo da lista. O brasileiro é muito crítico com o País, às vezes, injustamente. Outro dia, houve uma polêmica no Rio, com pessoas reclamando das filas no Corcovado e no bondinho. As pessoas vão a Disney e ficam horas nas filas dos brinquedos e ninguém reclama. Na Torre Eiffel, em Paris, também. Aí, o bondinho quebra e nego acha absurdo. O brasileiro exagera nos nossos problemas e exalta os outros. 

ISTOÉ

É a favor de que os jogadores, incentivados pelo Bom Senso F. C., entrem em greve caso as reivindicações deles não sejam atendidas? 

Ronaldo Nazário

Não podemos esquecer os menos favorecidos. O Bom Senso luta por menos jogos (sete, no máximo, por mês), mas 80% dos jogadores ficam, depois do estadual, oito meses sem jogar. Os atletas estão conseguindo manter um diálogo, porque, apesar de serem os protagonistas, eram a parte menos ouvida. Tem de juntar a CBF, as tevês e os jogadores e chegar a um acordo. No mundo todo é assim. Tem de haver conversa, mas, se não tiver acordo, apoio a greve.  

ISTOÉ

O Romário, como deputado federal, representa o jogador? 

Ronaldo Nazário

Não. Nunca vi o Romário fazer nada pelo futebol no Congresso. Ele tem, sim, uma causa justa, digna, bonita, em prol dos direitos dos portadores da síndrome de Down. É formidável esse trabalho, admiro muito. Mas não que ele seja o representante do futebol na Câmara.  

ISTOÉ

As declarações do Romário mais ajudam ou atrapalham? 

Ronaldo Nazário

Depende do assunto. O que o Romário diz não me interessa. Mas, na causa que ele escolheu como bandeira no Congresso, está mandando bem. 

ISTOÉ

O que pensa de a Justiça Desportiva ainda decidir o futuro de times no Brasil? 

Ronaldo Nazário

A regra é clara e tem muita gente incompetente no futebol. Esse povo amador tem de ser limado. Eu, se fosse o presidente da Portuguesa (Manuel da Lupa), não reclamaria na Justiça por ser rebaixado. Ia meter o pau no meu departamento jurídico! Tem de haver profissionais competentes para administrar o futebol. Não tem mais espaço para amadorismo. Não se pode brincar com a paixão do torcedor. É ele quem mais sofre. Ele não merece cair para a segunda divisão por um erro jurídico. Não é culpa do tapetão. O regulamento está lá, mas querem desvirtuar as responsabilidades. A responsabilidade é do clube.  

ISTOÉ

A maioria dos jogadores não consegue fazer uma boa transição de carreira como você. O que pensa disso?  

Ronaldo Nazário

Fui convidado agora pelo ministro Aldo Rebelo e passei a fazer parte do Conselho Nacional do Esporte, que cria regulamentações para as confederações e federações. Tenho um projeto: quero obrigar os clubes a oferecer uma opção de estudo, de capacitação técnica, curso de línguas, de marketing esportivo, de treinador, para os jogadores no tempo livre. Se o cara preferir ficar na internet, tudo bem. O clube tem de dar uma opção para o futuro. Tem muito jogador que ganhou bastante, torrou tudo e, quando para, fica correndo atrás de dinheiro. 

ISTOÉ

É a favor de que jogadores homossexuais brasileiros assumam a sua opção sexual como fez recentemente um ex-jogador da seleção alemã? 

Ronaldo Nazário

Sim. Qualquer tipo de preconceito tem de ser excluído da sociedade. Um jogador assumir sua opção sexual é a coisa mais natural. O primeiro que assumir isso e dar a cara para bater aqui vai virar herói nacional, nome de lei! O mundo está mudando para melhor em relação a preconceito.  

ISTOÉ

Com quem simpatiza para presidente do Brasil: Dilma Rousseff, Aécio Neves ou Eduardo Campos?  

Ronaldo Nazário

Sou amigo do Aécio. Fiz campanha pra ele na primeira vez que ele foi governador de Minas. É natural que esteja com ele na eleição, também por ser capaz e honesto. 

ISTOÉ

Por que acha que o Brasil irá vencer a Copa?  

Ronaldo Nazário

A Copa das Confederações foi um exemplo de bom futebol da Seleção com participação da torcida. Essa combinação foi fundamental. Com essas duas coisas juntas, não tem como perder. Jogador sente uma injeção de ânimo com o barulho do incentivo da torcida. Mas como não é uma matemática… A Argentina é o time que mais temo. É um clássico sem ter como prever. O nível das duas seleções é o mesmo. 

ISTOÉ

Você vai para o quarto casamento. Não tem medo de se casar, né? 

Ronaldo Nazário

Tudo pelo amor. Acho que eu e a Paula nos casamos no fim do ano. Minha mãe pediu que a cerimônia seja no Rio. A Paula só soma, está comigo em todos os momentos. Gosto demais da alegria dela. Somos muito parecidos: o mesmo astral, estamos sempre de bem com a vida, dispostos a realizar coisas. 

ISTOÉ

Menos no peso.  

Ronaldo Nazário

Sim! Ela tem bem menos que os meus 105 quilos. Eu já estive com 122. Minha vida está corrida, tenho feito pouco esporte. 


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