Eram 23h34 da segunda-feira 13, na rua Genóva, em Madri, quando José María Aznar, no balcão da sede do Partido Popular (PP), selou a vitória eleitoral com um beijo em sua mulher, Ana Botella. Presidente do governo (primeiro-ministro) da Espanha desde 1996, Aznar, 47 anos, não comemorava uma simples vitória. Pela primeira vez na história da jovem democracia espanhola, a centro-direita conquistou a maioria nas cortes (Parlamento) do país. O PP de Aznar obteve 44,5% dos votos, seis pontos percentuais a mais do que nas eleições anteriores, contra 34,1% do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), o principal de oposição. Com folga, Aznar continuará à frente do governo sem ter necessidade de fazer alianças com os partidos regionais. Mesmo assim, o PP iniciou conversações para garantir a manutenção do apoio da Convergência e União (CiU), de Jordi Pujol, da Catalunha.

A vitória consagrou Aznar, um líder pouco dado a sorrisos, que não tem nem um pingo do carisma e do charme de seu antecessor, o socialista Felipe González, e ainda está na contracorrente da União Européia (UE). Afinal, a Espanha é um dos três países da UE em que os conservadores estão no poder; os outros 12 têm governos social-democratas ou socialistas. A mais evidente explicação para o sucesso de Aznar é uma economia que vai de vento em popa e a queda do desemprego, que era um dos mais altos da Europa. “A Espanha é um outro país”, diz Aznar. No ano passado, o crescimento econômico espanhol foi de 3,7% do PIB, o maior na União Européia, o que permitiu a criação de 1,8 milhão de empregos, mais que o índice de toda Europa junta. Com isso, o governo do PP reduziu a taxa de desemprego de 23% para 15%. De qualquer maneira, é um índice ainda alto para o padrão europeu, cuja média é de 10%.

Um dos maiores investimentos econômicos dos últimos anos é no setor de telecomunicações – dentro e fora da Espanha. Para se ter uma idéia, em apenas cinco anos o número de telefones móveis cresceu de um milhão para 11 milhões. Só no Brasil, a Telefónica investiu US$ 3 bilhões. O transporte ultra-rápido foi outro alvo do governo espanhol. Para adaptar-se ao crescente número de unidades do trem rápido AVE, as ferrovias estão sendo completamente remodeladas. A previsão é de que até 2004 um viajante atravesse o país (506 mil quilômetros quadrados) de trem em apenas quatro horas. Os investimentos vieram em grande parte da União Européia. O otimismo de Aznar é tamanho que o faz sonhar com uma cadeira nos G-7 (o grupo dos países mais ricos). Um dos azarões dessa euforia econômica pode ser a inflação, que pulou de 2,4% no ano passado para 2,9% em janeiro deste ano.

Além da economia em progressão, outro motivo para a vitória de Aznar é o descompasso entre os partidos de esquerda, que amargaram o maior fracasso nas urnas desde 1989. O candidato socialista Joaquin Almunia, basco, militante há 30 anos, casado com a feminista Milagros Candela, arrasado, renunciou à presidência do PSOE depois da derrota de seu partido. Almunia deixou claro que será necessária uma reestruturação não só do PSOE como em toda esquerda espanhola. A estratégia de Aluminia de dar um giro à esquerda e aliar-se aos comunistas da Esquerda Unida (IE) parece não ter sido bem recebida pelo eleitorado espanhol. A IE, aliás, foi a grande derrotada desta eleição: dos 21 deputados da legislatura anterior, eles agora ficaram com apenas oito. O eleitorado comunista também parece não ter gostado da aliança, já que a IE passou anos criticando o PSOE, cujos 14 anos no poder (1982-1996) foram marcados por escândalos de corrupção, aumento brutal do desemprego e acusações de terrorismo de Estado.

Da direita para o centro – Uma tática política de Aznar que lhe valeu votos foi afastar-se dos radicais de direita e autodenominar-se de centro-direita. “A Espanha está cada vez mais no centro e nós a representamos, tanto assim que estamos no poder”, disse o primeiro-ministro. Durante a campanha, Aznar fez questão de distanciar-se da imagem de um partido que já foi considerado o herdeiro político do franquismo, o regime ditatorial do general Francisco Franco (1939-1975). Mas a mais irônica e divertida explicação para a vitória de Aznar é o dia ensolarado da votação. A previsão do tempo avisava que, se houvesse sol, haveria um desinteresse por parte do eleitorado. Não deu outra. A abstenção foi de 31,5%, um aumento de 11% em relação à última votação. Uma prova de que os partidos de esquerda não conseguiram convencer seu eleitorado de trocar a folga pelas urnas.

Apesar dos ventos favoráveis a Aznar, o primeiro-ministro deverá enfrentar algumas tempestades. Além de reformas longamente adiadas como a redução de impostos e a reforma fiscal, o governo terá de apurar acusações de favorecimento ilícito em empresas privatizadas. Além disso, os conservadores têm pela frente o desafio da onda xenófoba que cresce no país. São incidentes como o que ocorreu em El Ejido, no Sul, onde alguns moradores atacaram imigrantes marroquinos. Aznar já admitiu que irá precisar da mão-de-obra imigrante e promete rever a lei de imigração. A estabilidade política também está constantemente ameaçada pelos ataques terroristas do ETA (Pátria Basca e Liberdade).