No ano em que completa seu cinquentenário, a televisão se conecta à Internet e dá um grande passo para deixar de ser o que é. Estática, impositiva e impenetrável, ela começa a dar ouvidos e a transferir mais poder para as mãos do telespectador. A guerra pelo ibope, é óbvio, continua intensa. A disputa agora acontece também no terreno virtual. Nesse universo eletrônico, o que interessa é seduzir internautas, que poderão assistir a alguns de seus programas televisivos favoritos na tela do computador, numa relação muito mais lúdica.

Será possível acompanhar pela Internet parte da grade de programas do dia. A diferença é que a imagem e o som terão qualidade digital. Mas a nova tevê não é só isso. Se você perdeu o capítulo da novela ou quer assistir ao telejornal na hora em que bem entender, por exemplo, basta um clique no mouse. Além disso, parte do acervo das emissoras estará disponível para quem acessar o endereço das empresas na Web. A discussão agora gira em torno do conteúdo, já que ninguém sabe ao certo o que o espectador espera da televisão do próximo século.

Uma prova da movimentação em torno dos web-espectadores é o mergulho das Organizações Globo nesse admirável mundo novo. No próximo dia 26, entra no ar o Globo.com, megaportal abastecido com sites abrangendo informações de todas as empresas do grupo. Luís Carlos Boucinhas, diretor-executivo do portal, confirmou que está em busca de parcerias com um provedor de acesso à Internet gratuito. Seu maior trunfo é o vasto conteúdo e o acervo de imagens da emissora. Na contramão do que faz atualmente o SBT On Line (SOL) e do que a Rede Bandeirantes fará em breve em seu site, a Rede Globo não disponibilizará integralmente suas atrações aos usuários de computador.

Paulo Mozart Gama e Silva, diretor comercial e de marketing do Globo.com, diz que “o que se procura é que as mídias alcancem a maior sinergia possível sem que uma canibalize a outra.” Cada emissora tem sua estratégia para entrar na era da tevê pelo computador. Em comum, elas querem descobrir a melhor forma de conviver com a nova mídia de comunicação que surgiu da união entre tevê e Internet. Roberto Franco, diretor de engenharia e operações da Rede Record – emissora que ainda este ano lançará seu portal – é categórico. “A tevê como estávamos acostumados não existe mais. Não podemos produzir conteúdos numa única embalagem. Vai ter sucesso quem descobrir primeiro o que as pessoas, cada vez mais ricas em dinheiro e pobres em tempo, realmente querem.”

A tecnologia tem um papel importante, mas não decisivo. O que pesa nesse jogo é a capacidade das emissoras de encontrar a melhor forma para produzir e distribuir seus produtos pela Internet. A Globo está otimista e sonha alto. “Vamos ser um divisor de águas. Queremos a liderança, pois nosso diferencial é o acervo e a geração de conteúdo de qualidade e em quantidade”, diz Gama e Silva.

Há um cenário favorável para investimentos na Internet, apesar de já envolto em desconfianças. No Brasil, cerca de sete milhões de pessoas possuem computador, das quais 3,3 milhões têm acesso à Internet. A Globo ingressa com força nessa nova mídia, mas tardiamente se comparada ao rival SBT, que há três anos entrou na Web com o provedor de acesso à rede SBT On Line.

Folclore – Silvio Santos tem opiniões claras sobre a incursão de sua empresa na Web. Num café da manhã com publicitários, na última semana de fevereiro, resumiu: “Não acredito no folclore em torno da Internet. Vai ser uma espécie de corrida do ouro como ocorreu na Califórnia. Muita gente vai perder dinheiro, e pouca gente vai ganhar.” O homem do baú da felicidade acha que a expectativa em torno do assunto é exagerada. Ele investiu algo em torno de R$ 40 milhões no provedor de acesso e não teve o retorno esperado, mas hoje o SOL dá sustentação à maior cartada online de Silvio Santos. O game O show do milhão, que reestreou este mês, recebe perguntas dos telespectadores por e-mail. Só no ano passado foram quase três milhões de mensagens.

Dentro de um mês, a Rede Bandeirantes terá sua programação própria disponível na Internet, em tempo real. Como a Band, outras emissoras apostam no avanço da difusão em banda larga, sistema de conexão com a Internet em que é possível acessar imagens em movimento com boa definição e alta velocidade. Para se ter uma idéia, hoje são necessárias oito horas para buscar na Internet e assistir na tela do PC ao trailer do filme Star wars episódio 1: ameaça fantasma. No sistema de banda larga, a mesma operação consumiria quatro minutos. Curiosamente, a transmissão online de imagens e som em alta velocidade tornou-se um promissor negócio paralelo para as operadoras de tevê a cabo, que também terão parte de seu conteúdo disponível na Internet. A discussão, num futuro bem próximo, será outra. Teme-se que, um dia, o computador destrone a tevê na disputa pela audiência.