Nem só de tanques e canhões é feito um Exército. O brasileiro, por exemplo, também tem mapas centenários, quadros valiosos, sítios históricos e outras incontáveis relíquias que há décadas andam escondidas nas trincheiras da burocracia militar. Um patrimônio invejável e, até agora, inacessível ao público. Até agora. Na quarta-feira 15, o publicitário gaúcho Flávio Corrêa assumiu o comando da recém-criada Fundação Cultural Exército Brasileiro, que pretende reunir esse acervo para preservá-lo e divulgá-lo. E já tem uma tarefa de emergência: recuperar o monumento aos pracinhas brasileiros mortos durante a Segunda Guerra Mundial. Construída no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, a edificação, de tão mal conservada, permitiu que a água do mar invadisse as paredes e interrompesse o descanso eterno dos combatentes ali enterrados. “Há ossos boiando ali”, indigna-se Flávio Corrêa, que já tem R$ 800 mil em caixa para tocar seus primeiros projetos.

O dinheiro, porém, não saiu do combalido orçamento militar. O patrocínio de diversas empresas privadas, bancos e federações de indústrias garantiu à fundação seu soldo inicial. “Para nós, é fundamental que a sociedade civil se interesse e participe da entidade”, convida o presidente da fundação. “Deve haver muita coisa admirável e inédita nesse desconhecido patrimônio do Exército. Eu estou muito curioso”, diz o empresário José Mindlin, um consumidor contumaz de livros que aceitou o convite do Exército para ser membro do Conselho Curador da Fundação. Está ansioso para saber o que vão encontrar nos arquivos e recantos dos quartéis-generais e acredita que isso ajudará a aproximar o Exército da sociedade. “Acho que é mais um serviço que o Exército poderá prestar à população.”

Potencial – O acervo impressiona. São dezenas de fortes e fortalezas e centenas de mapas que ajudam a contar capítulos da história do País. Alguns desses mapas chegam a valer US$ 500 mil, como o que será exposto nos próximos dias pelo Museu de Arte de São Paulo (Masp), com o traçado original da cidade do Rio de Janeiro, indicando seu plano urbanístico original. Uma peça tão rara quanto desconhecida. Flávio Corrêa quer juntar todos os mapas e montar uma mapoteca que conte a história do Brasil desses primeiros 500 anos. A Editora do Exército e a Biblioteca do Exército também vão ganhar munição para retomarem suas atividades. Para o ministro da Cultura, Francisco Weffort, a criação da Fundação Cultural vai dar agilidade administrativa ao Exército. “É uma instituição muito grande e precisava disso para ampliar sua ação cultural e turística, que já existe, mas de uma forma pouco organizada”, argumenta Weffort, animado também com o potencial de visitação que alguns sítios históricos parecem ter, como fortes e fortalezas do litoral do País. Um deles é o Forte de Itaipu, no município paulista de Praia Grande, encravado num belo pedaço da Mata Atlântica ainda preservada. O Exército, ao que parece, decidiu bater continência para a cultura.