Quarenta anos depois de as feministas terem queimado sutiãs em praça pública para pedir igualdade, as mulheres voltam a usar os seios para mostrar seu poder. Só que agora a manifestação não é em sinal de protesto. O que elas querem é se sentir bonitas, desejadas e sensuais. Neste carnaval, o modelo esquálido e anoréxico foi definitivamente aposentado. As mulheres investem na exuberância. Vão encher as ruas e avenidas com decotes e topless, confirmando uma tendência que cresceu nas passarelas com o fenômeno Gisele Bündchen. A moda agora é dos seios fartos – siliconados ou não. Nas arquibancadas ou diante da tevê, será inevitável apostar se aquela comissão de frente que arranca aplausos é verdadeira ou falsa. Não vai ser fácil descobrir. “Nunca as cirurgias estiveram tão perfeitas, naturais e harmoniosas”, garante o cirurgião plástico gaúcho Klaus Brodbeck, 33 anos. “Hoje as próteses têm a mesma temperatura e molejo do corpo. Só se elas tiverem um tamanho exagerado podem sair do lugar”, garante o médico.
 

Para quem lança todas as fichas nesse jogo inusitado de adivinhação, a afirmação de Brodbeck chega a ser um estraga-prazeres. Principalmente depois do boato que envolveu Joana Prado, a Feiticeira. O Jornal da Tarde, de São Paulo publicou que as próteses da loira saíram do lugar de tanto ela sambar no ensaio do Salgueiro, no Rio. A do lado esquerdo, inclusive, teria ido parar embaixo do braço. “Como inventam bobagem”, defende-se a dançarina. “Nunca tive problema com as minhas próteses. A cirurgia foi maravilhosa, fez um bem danado para o meu ego. Meu corpo ficou muito mais proporcional. Adorei!”, justifica-se. Falsos como os da Feiticeira ou não, os seios têm uma batalha árdua neste Carnaval para tomar o lugar do bumbum como preferência nacional, Os mais jovens torcem de peito aberto pela exibição dos seios. Do outro lado, a velha guarda defende o traseiro feminino até mesmo como uma tradição. Afinal, a imagem do Brasil sempre foi o generoso rebolado da mulata. “Eu sou bunda e não abro”, esbraveja o escritor Ruy Castro. Outro veterano, o humorista Ziraldo, vai mais adiante: “Isso não passa de modismo!”, afirma o esperançoso editor da revista Bundas.
 

Ao que parece, Ziraldo e Ruy Castro vão ter de aceitar essa moda. Os seios estão ganhando seu espaço e dividindo a preferência do público masculino. Uma pesquisa online realizada por ISTOÉ aponta quase um empate técnico entre bumbum e seios. Dos 500 internautas que responderam à questão: os seios (siliconados ou não) são a nova preferência nacional?, 58,3% disseram que não, mas 41,7% afirmam que sim. Mas, afinal, de onde vem essa moda? Seria mais um padrão americano que cai em nosso colo? Ou simplesmente o silicone permitiu que as mulheres pudessem realizar a fantasia do seio farto e duro e liberou o imaginário masculino?

Poder – O psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg acredita que nos Estados Unidos sempre houve uma preferência pelos seios grandes por causa do apelo erótico e do modelo matriarcal. No Brasil, essa mudança de comportamento tem mais a ver com a tomada de poder das mulheres. “Exploraram-se as nádegas à exaustão”, diz o psicólogo referindo-se aos grupos de “tchans”. “Mas a Tiazinha foi o auge e o início da decadência desse padrão de beleza. O homem brasileiro sempre teve uma necessidade de auto-afirmação, uma fixação pelo bumbum, como se quisesse possuir a mulher sem olhá-la nos olhos. Agora isso começa a mudar.” Durante a transmissão dos desfiles, Jacob enxerga uma diferença. “Enquanto as câmeras insistem em focalizar as nádegas, as passistas querem mais é mostrar os seios. É o jogo de poder entre o macho e a fêmea que está mudando no Brasil. A mulher passa a ter peito para brigar pelo seu espaço, literalmente. Os seios são objeto de desejo, instrumento de gozo e a imagem da figura materna.”
 

Sem dúvida, é no Carnaval que se liberam todos os desejos ocultos. Mas, de qualquer maneira, os seios estão invadindo o cotidiano do brasileiro. Eles estão nas propagandas, capas de revistas, outdoors e nas praias, com o topless liberado. Provavelmente, a moda das passarelas ajudou a impulsionar essa febre. Todas as mulheres querem ser como Gisele Bündchen. Pernas longas, quadris estreitos e seios grandes. “Se hoje uma modelo tem pouco seio, perde dezenas de desfiles e fotos de lingerie e maiô”, afirma Sérgio Mattos, diretor da agência de modelos Elite, no Rio. Ele conta que, só na Elite, 12 modelos aderiram ao silicone. Há quem diga, no mundo da moda, que a própria Gisele teria se rendido à exatidão das próteses. “Ela vai esconder esse segredo até morrer. Mas é perfeito demais para ser natural”, diz um colega de trabalho da gaúcha. Quem sai ganhando nessa guerra de falso ou verdadeiro é mesmo o público masculino. “O macho brasileiro gosta de tudo. Do charme do bumbum, que tem a ver com a mulatice brasileira, e das mamas das loiras do Sul. O ideal talvez fosse o bumbum da Carla Perez com o peito da Gisele Bündchen!”, imagina Mattos.

Maridos – A prova dessa nova preferência nacional está também nas salas de espera das clínicas de estética. De 1994 para cá, o número de implante de silicone passou de 10% para 40% do total de cirurgias realizadas anualmente. Em contrapartida, o percentual de operações para redução das mamas, que há seis anos correspondia a 90% do movimento das clínicas, caiu para 60% em 1999. “A mídia é uma das responsáveis por esse aumento. Dá espaço para as celebridades falarem sobre suas próteses, estimulando o imaginário feminino e masculino”, diz Luís Haroldo Pereira, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. “Com certeza, o boom deste verão é o silicone. Algumas pacientes chegam ao consultório com seios lindos, mas querem iguais aos de determinada artista. É incrível!” O cirurgião plástico carioca Edmar da Fontoura conta ainda que muitos maridos dão força e acompanham a cirurgia das mulheres. “Eles resolveram assumir que gostam de mamas, e grandes! Os seios estão sendo redescobertos”, avalia Edmar. “Os homens, quando vêem um farto par de seios, pensam logo no que vão fazer com aquilo.”
 

Quando a modelo e atriz Luma de Oliveira avisou que iria se submeter a um implante de silicone, no Carnaval de 1998, o marido Eike Batista, 43 anos, ficou preocupado. Temia que o artifício do silicone reduzisse a atração que ele sentia pela esposa. Hoje, Eike recomenda para os maridos. “Me surpreendi. É tão bem feito que fiquei satisfeito. O silicone levanta a auto-estima das mulheres”, diz.
Os seios naturais de Luma ficaram para a história. Com muito samba no pé e um topless arrebatador, ela arrasou no Sambódromo em 1987. Até parecia que os brasileiros nunca tinham visto busto igual. “Depois de amamentar dois filhos, meus seios murcharam e eu tive de recorrer à plástica”, conta Luma sem o menor constrangimento. Mesmo porque continua bela como os seus peitos tamanho 40. Ela bem que quis carregar na quantidade. Mas Eike vetou e o médico também. “Ah não! Aí já é demais. Ficou tão bem feito”, reclamou o marido. “Na época em que fiz a cirurgia, pedi a meu médico que colocasse mais silicone. Ele desaconselhou e disse que a beleza do corpo está em sua harmonia”, lembra Luma. Neste Carnaval vai desfilar de bustiê.
 

O médico de Luma conseguiu evitar o exagero que tomou conta de algumas mulheres. “O ideal é não se ver o contorno da prótese. Dois terços do seio devem ficar abaixo do mamilo, fazendo uma curva, um tobogã natural. Caso contrário, fica artificial como os seios da Feiticeira, por exemplo”, afirma o cirurgião Klaus Brodbeck. Sua mulher, Sônia, 30 anos, também fez a cirurgia na mama. Queria ter seios maiores e recebeu todo o apoio do marido. “É muito importante ter informação sobre o assunto. As próteses não impedem a mulher de amamentar e não influem na sensibilidade. Hoje é impossível saber se os seios são verdadeiros ou falsos.”

Naturais – Os verdadeiros, nessa onda de seios fartos, são um privilégio. A atriz e modelo Cida Marques, a XT da Escolinha do Barulho, da Rede Record, sempre teve seios grandes. Chegou a ficar complexada na adolescência e quase entrou no bisturi para diminuir o tamanho do sutiã. “O complexo acabou quando posei para a revista Playboy. Os homens acharam diferente aquele meu biotipo americano. Mas colocaria silicone sem problemas se tivesse seios pequenos. Nos ensaios fotográficos da revista Playboy, o tamanho dos seios sempre importou pouco. Hoje, as moças peladas precisam de certa proporção. “Os leitores querem harmonia entre seios e bumbum”, confirma Cynthia de Almeida, diretora de redação. “Sempre fizemos o concurso do bumbum mais bonito. Agora pensamos em fazer também o concurso dos mais belos seios.”