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confiança Lula lança plataforma da Petrobras: "Enquanto a cigarra cantava, a gente trabalhava"

 
Dois anúncios publicados nos jornais na semana passada chamaram a atenção sobre o que distingue o Brasil de outros países, nesses dias de crise. Um deles reproduz anúncio publicado no The New York Times, no qual a Artplan destaca que o Brasil é uma excelente oportunidade de investimento. "Nossa democracia está consolidada, nossa indústria está forte, nossa inflação está sob controle há vários anos e nosso vasto território assegura que não faltam lugares para receber investimentos. Invista no Brasil", conclama a Artplan. O outro é da Votorantim Cimentos, um dos braços do maior grupo industrial do País. A família Ermírio de Moraes informa que, "enquanto muitos discutem os tempos de incerteza, a Votorantim Cimentos investe no Brasil". No momento, a empresa está investindo R$ 3 bilhões na expans ão de fábricas. Até 2011, a capacidade de produção será ampliada em 280 milhões de sacos por ano. "Essas iniciativas reafirmam nosso compromisso com o crescimento do País", ressalta o anúncio.

Nesses dias de pânico nas Bolsas, os anúncios da Artplan e da Votorantim poderiam até soar como propaganda enganosa – mas não são. E a maior prova de que os anúncios são fiéis à realidade está nos argumentos que despontam diante da seguinte pergunta: afinal, caso fosse uma mercadoria à venda, será que o "produto Brasil" reuniria mesmo as características que são exaltadas nas duas peças publicitárias? A resposta é afirmativa. O Brasil nos últimos anos ganhou músculos que lhe permitem enfrentar as intempéries. "Enquanto a cigarra estava cantando, a gente trabalhava",
afi rmou o presidente Lula, na terça-feira 7, no lançamento da plataforma P-51 da Petrobras, em Angra dos Reis, onde produziu a mais eloqüente imagem dessa confi ança no País. "Não estou di zendo que a gente não pode ter difi culdades, mas até agora o Brasil está de pé. Isso porque fi zemos as coisas que tínhamos de fazer", explicou para uma platéia de três mil trabalhadores do estaleiro Brasfels. E o que foi feito para estabilizar a economia e preparar o País para enfrentar crises não é pouca coisa.

"Em 2009, os países desenvolvidos irão crescer perto de 0%, ou seja, 100% do crescimento virá dos emergentes"

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Dominique Strauss-Kahnn, diretor-geral do FMI

 Os bancos nacionais são sólidos e rentáveis – Graças ao Proer criado pelo governo FHC nos anos 90, o sistema bancário foi saneado. Hoje, os bancos brasileiros têm uma rentabilidade de quase 3,5% sobre seus ativos – o triplo dos bancos americanos. E seguem os rígidos limites de alavancagem do Acordo da Basiléia.

 As reservas passam de Us$ 200 bilhões – A dívida externa das empresas e do governo brasileiro está garantida pelo colchão de dólares acumulado pelo Banco Central. Esse montante também garante o combate à especulação com o dólar em momentos de crise.
Mais de 80% das empresas de capital aberto são lucrativas – A rentabilidade das maiores sociedades anônimas do País fi cou acima de 10% em 2007, algo que não acontecia desde 1980. No primeiro semestre deste ano, as 340 maiores empresas da Bolsa de Valores já acumulavam R$ 69 bilhões de lucro líquido.
Os investimentos batem recordes e sobem 16,2% no ano – Animadas pela demanda interna e o surgimento de uma nova classe média, as empresas trabalham a pleno vapor. Investem em planos de expansão, pois a utilização da capacidade instalada, de 86%, aproxima-se do teto.
A inflação caiu e está abaixo da meta de 6,5% – Em alta no início do ano, por causa da crise dos alimentos, a infl ação voltou a fi car sob controle. Deve fechar 2008 em torno de 6% e, pelas previsões, voltará ao centro da meta de 4,5% em 2009. Garante, assim, o poder aquisitivo dos assalariados.
A taxa de desemprego é a menor dos últimos dez anos – Com o crescimento do PIB, de 6,1% no trimestre, e a infl ação em queda, as empresas crescem e o resultado é a geração de dois milhões de empregos desde 2004. O desemprego caiu de 13% em 2003 para 7,6% em agosto.
"O Brasil está muito mais forte e robusto para lidar com as crises", afi rma a diretora da agência de rating Fitch, Shelly Shetty. "É claro que o Brasil tem na sua economia real todas as condições para passar por essa crise", diz o presidente da CNI, Armando Monteiro Filho. Na sextafeira 10, a Whirlpool, maior fabricante de eletrodomésticos da América Latina, deu o exemplo de como vencer o pânico. "Continuamos comprando, produzindo, vendendo e exportando para os cinco continentes", anunciou nos jornais. "Acreditamos e incentivamos esse caminho."

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foto:marcelo casal jr/abr

PASSO FIRME Desta vez, o ministro Guido Mantega chega a Washington sem o pires na mão

 Todos esses indicadores econômicos suavizam a atual viagem pelo turbulento mar da crise fi nanceira. No passado, crises muito menores do que a de hoje provocaram abalos bem maiores (leia quadro à pág. 42). Em algumas ocasiões, o País chegou à situação humilhante de pedir moratória. Mas se o dólar pulou de R$ 1,59 para quase R$ 2,50 nas últimas semanas, é bom lembrar que já foi cotado a R$ 3,85 em outubro de 2002, quando ainda se pensava que o PT iria fazer loucuras ao assumir o poder. Na mesma época, o risco Brasil atingiu o recorde de 2.440 pontos. Hoje, apesar de toda a incerteza, está pouco acima dos 400 pontos.

"O Brasil não está imune", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista na segunda-feira 6. "É uma crise global, que atinge mais os países mais fragilizados e menos os mais sólidos, como o Brasil", explicou. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ressaltou que o País se sairá bem. "Essa é a grande vantagem de o Brasil ter adotado uma política conservadora, prudente: neste momento, temos recursos sufi – cientes para enfrentar uma crise que afeta a todos." Com essa musculatura, o governo pode trabalhar um ajuste gradual aos novos tempos, sem transformar o bom momento em desaceleração profunda da economia. O primeiro passo foi dado na própria segunda-feira. Convocados pelo presidente Lula, Mantega e Meirelles apresentaram ações emergenciais, entre elas a MP 442, que autorizou o BC a comprar carteiras de crédito de bancos menores com dificuldade de levantar dinheiro no mercado.

roberto castro/aG. istoÉ

Recompensa Política conservadora de Henrique Meirelles deu musculatura ao País

 

Lula pediu que as autoridades evitem o baixo-astral. Após recomendar prudência, aprovou as medidas. Como os grandes bancos, mesmo com a liberação do compulsório, não se dispuseram a ajudar as pequenas instituições, o BC decidiu intervir através do redesconto de liquidez. Meirelles negou, porém, que houvesse bancos em dificuldade: "Hoje não vemos necessidade de exercer essa prerrogativa." Na opinião de Marcio Pepe, analista financeiro da BDO Trevisan, os bancos nacionais são, de fato, mais seguros, pois o BC controla os riscos de crédito. "Nos EUA, não há interferência preventiva do governo. Nosso sistema bancário é bem mais vigiado", diz Pepe.
Presidente do PP (Partido Progressista), o senador Francisco Dornelles participou da reunião no Planalto e saiu convencido de que o presidente Lula está enfrentando a tempestade como manda o figurino. "O que existe é uma crise de confiança e assim está sendo combatida. O presidente está certo. Não há motivos para alarmismo", afirmou o senador à ISTOÉ. Para Dornelles, que foi ministro da Fazenda no governo Sarney, as medidas do BC vão na direção correta, mas talvez Meirelles devesse desburocratizar as linhas de redesconto e zerar o depósito compulsório dos pequenos e médios bancos. "Quanto mais garantias o Banco Central der, mais rápido a crise de confiança terá fim. O governo deve se antecipar aos fatos", defende.
Lula passou a receber informes diários da dupla que comanda a economia. Na quarta-feira 8, reuniuse pela manhã com Meirelles e autorizou o BC a vender dólar físico para acalmar o mercado. Àquela altura, a cotação do dólar havia atinfoto: gido o recorde de R$ 2,48, infl uenciada pelos rumores a respeito da saúde fi nanceira de grandes empresas. A exemplo da Sadia, que teve prejuízo de R$ 760 milhões no mercado futuro, outros grupos estariam com problemas porque apostaram na eterna valorização do real. Além de fazer uso das reservas internacionais, Meirelles estendeu a redução do compulsório aos grandes bancos. Com isso, o socorro do governo ao sistema fi nanceiro subiu para R$ 87,2 bilhões. "A crise é severa. Mas estamos trabalhando para mitigar os impactos na economia brasileira", explicou à ISTOÉ um diretor do BC. Pelas estimativas, o BC está disposto a gastar até US$ 20 bilhões – um volume que, no passado, aniquilaria as reservas e hoje não representa nem 10% do total acumulado.

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Para o vice-presidente José Alencar, o importante é assegurar os fl uxos de crédito: "Isso passa, o Brasil está em condições de fazer a travessia para um porto seguro." Pode-se argumentar que tanto Lula quanto o seu vice têm a obrigação de transmitir segurança. Na verdade, porém, o Brasil é apontado como exceção à regra também no Exterior. O tradicional Financial Times, de Londres, informou que muitos economistas ainda acreditam que o Brasil vai sair relativamente ileso da crise fi nanceira global. Também o FMI, embora tenha traçado um cenário sombrio para a economia mundial em 2009, ressaltou que o Brasil crescerá acima da média mundial de 3%. Mais impressionante ainda é a avaliação do economistachefe do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe, Augusto de La Torre. Em sua visão, o Brasil, com Chile, Colômbia, Panamá e Peru, tende a ser um porto menos arriscado para os investidores. Crescerão entre 3,2% e 3,5% no ano que vem, enquanto as nações mais desenvolvidas fi carão em torno de 0,5%. "A América Latina hoje é menos vulnerável. Isso não acontece por sorte, mas pelas boas políticas implantadas", assegura De La Torre. Assim, quando a realidade voltar a vencer o pânico e a especulação, o Brasil, certamente, terá se fi rmado como a melhor alternativa de investimento. A Artplan entende tudo de propaganda e o grupo Votorantim, apesar de ter perdido R$ 2,2 bilhões em operações de câmbio, sabe como ninguém qual é a hora de investir. Se dizem que o Brasil é um bom produto, é melhor acreditar.
Colaborou Hugo Marques