A guerra das cervejas virou briga judicial. Na quarta-feira 16, o presidente da Kaiser, Humberto Pandolpho, anunciou aos deputados da Comissão de Economia, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados que estava interpelando judicialmente a AmBev. Ele exige provas da acusação de que a Coca-Cola é a verdadeira dona da Kaiser. Na comissão, Pandolpho deu o troco na mesma moeda. Denunciou que a AmBev, gigante formada pela fusão entre a Brahma e a Antarctica, não é uma empresa totalmente de capital nacional, como faz crer a propaganda veiculada na mídia. "Nada menos que 26% das ações da AmBev pertencem à Tinsel Investiment Inc., de propriedade de dois investidores suíços e com sede em Nassau, Bahamas, um paraíso fiscal", atacou. O depoimento do presidente da Kaiser foi em uma sessão reservada da comissão, preparatória de uma audiência pública prevista para a próxima semana. Humberto Pandolpho defendeu-se das acusações feitas pelo presidente da AmBev, Marcel Hermann Telles, de que a Coca-Cola controlaria a Kaiser, apresentando aos deputados a composição acionária da empresa. Pelos dados divulgados, a Coca-Cola teria uma participação de apenas 10% das ações de sua cervejaria, sendo o restante pulverizado entre mais dez acionistas.

A réplica da AmBev veio no final da tarde do mesmo dia. A direção da empresa, além de manter as acusações à Coca-Cola, também entrou na Justiça, interpelando a multinacional americana por "prática de concorrência desleal, ao tentar influenciar a opinião pública brasileira contra a fusão Antarctica-Brahma". A AmBev, na interpelação judicial, reafirma a acusação de que quem controlaria a Kaiser é a Coca-Cola internacional. A empresa, que ainda depende de autorização do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para ter confirmada a fusão que a criou, divulgou nota explicando a presença da Tinsel (nunca admitida antes) entre seus acionistas. Segundo a AmBev, a participação da empresa situada em paraíso fiscal é de 24,9%, mas este porcentual vai cair muito depois que os acionistas minoritários da Brahma forem incorporados. Pelos dados da AmBev, esses acionistas, hoje de fora, passariam a dispor de 68,2% do capital da empresa, fazendo com que todos os acionistas atuais tenham reduzidas suas parcelas.

Negociação
No meio do tiroteio, os deputados da comissão decidiram que vão procurar atuar para obter uma solução negociada para a briga das cervejarias. O líder do PT, Aloizio Mercadante, ex-presidente da comissão, acha que é fundamental o fortalecimento do Cade na questão. Ele acredita que a audiência pública com a Kaiser e a Secretaria de Direito Econômico (SDE) poderá trazer novos fatos ao debate. "A comissão tem o dever de estabelecer a negociação, pois não é possível transformar o plenário em briga de delegacia", afirma. Mercadante acha que a saída será um acordo entre o parecer da SDE, que obriga a AmBev a vender uma de suas marcas (Brahma, Antarctica ou Skol), e a posição da empresa, que não aceita nenhuma restrição. "Tem que haver ganho para o consumidor, em termos de preço, ao final do processo", diz. O atual presidente da comissão, José Machado (PT-SP), considera que os fatos denunciados por Pandolpho são graves e que não restou outro caminho do que decidir pela audiência pública. Lá, caberá à Kaiser comprovar com documentos os fatos relatados. Nelson Marquezelli (PTB-SP) também con-corda que a melhor saída é o debate aberto. "Primeiro a AmBev acusou a Kaiser, agora veio esta e rebateu as acusações com denúncias. No meio está o consumidor. Como é que ele fica?"