Estar no mundo, consciente de seu papel e de sua presença no meio ambiente, é uma ideia que Mira Schendel absorveu de suas leituras do filósofo Martin Heidegger, e que a acompanhou durante toda a sua trajetória artística. Essa é também a ideia que acompanhou as curadoras Tanya Barson e Taisa Palhares em sua pesquisa para a realização da monumental retrospectiva da artista na Tate Modern, de Londres.

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FLUTUAÇÃO
A instalação "Variantes", de 1977, em papel-arroz e acrílico,
favorece diálogo entre transparência e opacidade

O passeio entre a abstração e a figuração é outro aspecto que pode ser contemplado ao longo de 16 salas da instituição britânica. A mostra começa com a produção figurativa dos anos 1950, quando Mira – nascida em Zurique e criada em Milão – chega a São Paulo, aos 34 anos, e começa sua produção artística, influenciada por Morandi, De Chirico e Torres-García. Logo cedo, ela começa a usar a repetição e a explorar a reprodução de uma forma singular em temas e variações.

No anos 1960, quando atinge a maturidade artística, incorpora o texto ao trabalho. Citações de Heidegger, de Mario Schemberg, da “Bíblia” e de composições de música eletrônica em sua pintura dão origem ao início do trabalho com a palavra. No final, ela passa a destacar as letras das palavras. Assim nascem as instalações feitas de constelações de textos suspensos, que produzem sobre o espectador um efeito meditativo e existencialista. Do interesse semiótico pelas representações da linguagem, Mira engrena na investigação dos efeitos da luz em monotipias sobre papel-arroz. Até que as letras e as citações desapareçam e fique só a transparência.

Organizada em conjunto com a Pinacoteca do Estado de São Paulo e a Fundação Serralves, na cidade do Porto, a exposição é o primeiro fruto de uma parceria institucional estabelecida entre a Tate e a Pinacoteca em 2012. A mostra se insere em um projeto da instituição britânica de repensar a história da arte a partir da trajetória de artistas que estabeleceram suas carreiras fora da Europa e dos EUA.

“Penso que artistas brasileiros têm contribuições únicas a oferecer a um público mais amplo. Mas, para mim, é desnecessário enumerar o que é brasileiro ou não em seu trabalho”, diz a curadora Tanya Barson, da Tate. “Artistas brasileiros como Mira Schendel ou Helio Oiticica são profundamente preocupados com a experiência humana e isso faz com que suas obras tenham um significado universal.”