Vale do Rio Doce está na mira da Secretaria de Direito Econômico (SDE) desde a última semana. Os técnicos do governo ficaram irritados com o desprezo da mineradora com solicitações feitas pelo órgão e enviaram ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) dois processos contra a Vale. Um deles é por abuso econômico e outro por práticas ilegais de concorrência. Como a empresa se recusou a prestar informações sobre seus custos, a Vale poderá vir a ser multada em R$ 100 mil diários. O Cade ainda recebeu um ato do SDE para investigar a concentração de siderúrgicas nas mãos da companhia, que tem o empresário Benjamin Steinbruch como um dos principais acionistas. A Vale tem 15 dias para apresentar sua defesa. "Estamos esperando os esclarecimentos. Ainda não tivemos acesso aos dados solicitados sobre os custos", comentou a diretora do Departamento de Proteção e Defesa Econômica, Eliane Thompson-Flores. A multa pode vir a ser aplicada antes mesmo do julgamento do Cade.

Uma das consequências dessa saraivada de investigações sobre a Vale deverá ser o cumprimento de uma das exigências do edital de privatização, até agora ignorada: cortar a empresa ao meio. Isto significa uma separação contábil entre siderurgia de um lado e ferrovia e portos de outro. Além disso, a Vale tem participação direta ou indireta em 5 das 14 siderúrgicas brasileiras, o que faz com que responda por 69% da produção de aço do País. Está presente na Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e na Usiminas, por exemplo. Uma das propostas do SDE é fazer com que a empresa se desfaça de um destes ativos. Ao escolher um deles, Steinbruch estará desatando um nó no setor siderúrgico. Ao mesmo tempo que é sócia da CSN, a Vale é acionista da Usiminas, que, por sua vez, é dona da Cosipa. A ordem vinda de Brasília é clara: a Vale tem de vender estas participações cruzadas. A direção da empresa não quis comentar o processo aberto pela SDE.

Privatizada em maio de 1997, a supermineradora passou a incomodar muita gente. Sobretudo a concorrência e muitos compradores que se sentiram afetados pelos aumentos abusivos de preço e práticas ilegais de concorrência. Segundo denúncia feita pelo Sindicato das Empresas Ferroviárias (Sindifer), a Vale teria aumentado o preço para o transporte de ferro-gusa, em meados de 1998, em 32,2%. Para a Usiminas, a elevação foi de 27%, no mesmo período. O motivo do aumento praticado na ferrovia Vitória-Minas até hoje é desconhecido. A Vale alega que não se sente obrigada a divulgá-lo por ser dona da ferrovia. Os usuários de sistema interligado temem que a empresa esteja transferindo para os clientes da ferrovia o prejuízo que tem na mineradora. Nesse trabalho todo sobre a Vale, o governo foi pedir até socorro ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que cedeu especialistas em logística e experts do Departamento de Justiça americano. O processo está aberto – resta saber se a Vale vai parar mesmo no banco dos réus.