Fundada em 1854 por um profissional especializado em acomodar nos imensos baús da época os trajes volumosos de famílias ricas, que embarcavam em navios a vapor, a griffe Louis Vuitton tornou-se um sinônimo de luxo em viagem. As imensas transformações nos meios de transporte e no estilo dos viajantes deram-lhe oportunidade de se desdobrar em novos produtos sem perder a aura de tradição. Desde a abertura, numa pequena fábrica em Paris, até hoje, a griffe desenvolveu um pequeno império, com 5.600 funcionários e 251 lojas em 40 países. Em sua oitava visita ao Brasil para inaugurar, em São Paulo, a terceira loja Louis Vuitton no País e para uma viagem de lazer ao Pantanal, o vice-presidente da empresa para a área de marketing, Jean-Marc Loubier, 42 anos, falou do comportamento no mundo dos produtos de luxo.

ISTOÉ – Teóricos do marketing afirmam que as marcas acenam com sonhos e fantasias. O que move o consumidor de produtos de luxo como os Vuitton?
Jean-Marc Loubier Há pessoas que compram pela tradição. Outras, pela funcionalidade. Escolhem um produto porque ele é o melhor de sua categoria. Há pessoas que são caçadoras de status, que desejam um objeto porque ele é usado por esta ou aquela pessoa considerada importante. Existe ainda uma quarta categoria, a dos lançadores de moda, que querem ter o último lançamento e ter a sensação de ser seus descobridores. Nosso objetivo é atender a todos esses tipos, jogando com a complexidade. Mas não concordo inteiramente com a afirmação de que as pessoas compram uma imagem. Uma compra corresponde a uma necessidade e a um desejo que um certo objeto preenche. Só então vai buscar uma imagem e é preciso que o objeto não o decepcione. A imagem da Vuitton é associada à qualidade desde a sua fundação. Mas isso só aconteceu porque seus produtos tinham qualidade e traziam inovação. A maison inventou a viagem moderna. É verdade que pessoas-chave compraram os produtos – reis, industriais, artistas. Mas, ao longo dos anos, Louis Vuitton soube criar produtos inovadores e característicos.

ISTOÉ – Que importância têm as celebridades para a imagem de uma griffe?
Loubier O cliente ou cliente potencial é uma pessoa-chave para nós. As lojas Vuitton são uma maneira de nosso pessoal conhecer a opinião do público. Mas, além disso, vivemos numa civilização de imagens. A imprensa e a tevê projetam a imagem de certas pessoas e nós nos beneficiamos do fato de que algumas delas sejam nossas clientes. Elas substituíram os reis e príncipes que compraram os primeiros produtos Vuitton, no século passado.

ISTOÉ – Vocês buscam a proximidade?
Loubier Procuramos sempre, mas na realidade do uso. Na publicidade nunca recorremos a um rosto famoso. A importância dos famosos para nós é que eles frequentem nossas lojas, usem nossos produtos e sejam vistos com eles.

ISTOÉ – Mas comenta-se que uma foto de Naomi Campbell com uma bolsa que estava há anos no catálogo catapultou as vendas.
Loubier A história é um pouco mais complexa. Essa bolsinha se chama bucket e era produzida há anos e ela comprou porque tinha um look anos 60 que lhe agradava. Mas havia no ar um revival de anos 60 e o fato de que Naomi comprou a bolsa acelerou o processo de revitalização daquele item. Mas isso iria acontecer fatalmente.

ISTOÉ – Se um artesão desconhecido criasse em 1999 umas malas sensacionais, o que seria preciso acontecer para que elas se tornassem um sucesso mundial?
Loubier Há dois tipos de sucesso: um de referência e outro quantitativo. Se você for um pequeno produtor e criar um grande produto, obterá um sucesso de referência. E com o tempo talvez alcance uma escala maior. Se for a Vuitton que inventar esse grande produto, ela obterá um sucesso mais estrepitoso, pois o produto será exposto em 40 países e 251 lojas.

ISTOÉ – Mas se esse produto vendido em um só ponto-de-venda for comprado por uma celebridade?
Loubier Ele vai se tornar o objeto de desejo do mundo dos happy few, cujo papel é de acelerador do consumo.

ISTOÉ – Muitos famosos ganham todos os itens de uma festa – a bebida, a música, a decoração – em troca da visibilidade. Essa vitrine funciona?
Loubier Todo mundo pode fazer uma festa um dia. O problema é fazer essa visibilidade durar. É uma visibilidade demasiado fugaz. Uma marca precisa apoiar-se em coisas mais consistentes, como a funcionalidade, a criatividade, a relação preço qualidade etc. Se nos limitamos a fazer produtos clássicos, sem inventar, morremos amanhã. Se só fazemos produtos imediatamente consumíveis, morremos neste instante. Caminhamos sobre esse fio entre o clássico e a moda.

ISTOÉ – Existem diferenças de atitude entre os consumidores do Japão, do Brasil ou da França, por exemplo?
Loubier No Japão se toma chá verde todo dia e no Brasil e na França não. Mas no consumo mais raro isso não aparece, porque o consumidor deseja exatamente sair de seu cotidiano. Mas estamos falando de uma pequena amostra. Temos cerca de dois milhões de clientes. Há seis bilhões de pessoas na Terra. E nós os convidamos a não ter um comportamento puramente étnico, mas cultural. O étnico é fechado em si mesmo, o cultural é aberto à curiosidade sobre os outros.